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Planos de saúde fecham 1º semestre com lucro de R$ 1,45 bi, apesar de perdas na operação

Descontando os ganhos financeiros, resultado negativo ficou em R$ 4,3 bilhões, o que reflete as dificuldades do setor no pós-pandemia

Plano de saúde - Arquivo/Agência Brasil

Os planos de saúde médicos e hospitalares fecharam o primeiro semestre deste ano com um lucro de R$ 1,45 bilhão, segundo dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Um avanço em relação ao mesmo período do ano passado, quando o segmento fechou com prejuízo de R$ 691,6 milhões.

Apesar da clara melhora, o resultado operacional do setor - que contabiliza os ganhos com mensalidades e os custos de assistência à saúde dos beneficiários, administração e corretagem - ainda está negativo em R$ 4,3 bilhões.

Esse prejuízo foi compensado pelo resultado financeiro recorde de R$ 5,9 bilhões, fruto principalmente da remuneração de aplicações financeiras, que acumularam ao fim do período quase R$ 105,7 bilhões. A regulamentação do setor exige que planos mantenham elevadas reservas financeiras.

"Não é salutar que vivam de resultado financeiro"
Na avaliação de Jorge Aquino, diretor de Normas e Habilitação das Operadoras da ANS , apesar de o resultado operacional da atividade estar longe do ideal, os números mostram uma recuperação:

"Não é salutar que as empresas vivam de resultado financeiro. É preciso que a atividade gere riqueza. O operacional ainda está contaminado pela Covid de 2020, mas mostra uma recuperação. O resultado do terceiro trimestre é que vai comprovar se isso vai acontecer."

Na visão de Marcos Novais, superintendente executivo da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), no entanto, o resultado está longe de demonstrar um cenário positivo. Ele prevê que o setor feche o ano com um prejuízo operacional entre R$ 8 bilhões e R$ 9 bilhões, abaixo dos R$ 10,7 bilhões negativos registrados em 2022:

"Não dá para falar que melhorou com um resultado negativo operacional. Não vai ser como no ano passado, mas a operação tem que se bancar para remunerar o capital. Apesar de todos os esforços, este deverá ser o terceiro ano de resultado oper"acional negativo. A nossa projeção é ficar no zero a zero no operacional apenas em 2024.

Entre as mudanças que vêm sendo implementadas pelas operadoras na tentativa de mudar esse cenário, Novais cita alterações em redes credenciadas, maior rigor na fiscalização para pagamento de procedimentos médicos a prestadores e de reembolso aos consumidores, revisão nas tabelas de preços dos planos e reajustes dos contratos.

"Isso resulta em mais demora para pagar os prestadores e reembolsar consumidores, em queixas sobre mudanças nas redes. Mas quando fazemos uma alteração na rede é porque a tabela de preços do hospital, do prestador, não cabe mais no valor daquele produto. A frequência de uso continua aumentando, em terapias também."

Novais ainda acrescenta:

"E não pense que é interesse do plano dar reajustes altos, quando isso acontece, não sai quem está internado, mas aquele que está pagando e não está usando."

Amil e Unimed-Rio têm o maior prejuízo do setor
Na avaliação do economista Lucas Andrietta, pesquisador do Grupo de Estudos sobre Planos de Saúde e Interações Público-Privadas da USP, na comparação com o primeiro semestre do ano passado, há uma tendência de melhora nos resultados futuros:

"Parece haver poucas razões para se preocupar e, sobretudo, para que o setor se mobilize pelo afrouxamento da regulação com argumentos catastrofista."

Assim como no primeiro semestre de 2022, Amil e Unimed-Rio tiveram os piores resultados entre as operadoras de planos de saúde. A Amil registrou prejuízo de R$ 866 milhões e a Unimed-Rio, de R$ 839 milhões.

Na avaliação do economista Carlos Ocké-Reis, técnico do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os números das duas operadoras pesam sobre o resultado geral de forma significativa.

"São números que escapam da média do mercado. Olhando os dados de forma geral, me parece que houve um problema localizado, isolado, que foi a pandemia, e não parece haver estabelecimento de um novo padrão de uso."

O economista chama atenção para a queda na receita com mensalidades apontada pela ANS, apesar do crescimento do número de beneficiários.

"Considerando as dificuldades econômicas das famílias, podemos supor que as operadoras, para atrair novos consumidores nesse período após a pandemia , venderam planos empresariais e por adesão com preços mínimos de entrada irrealistas. Esse fato é "sazonal" e em breve será superado: seja, de um lado, pelo sistemáticos reajustes observados nesse mercado, seja, de outro lado, porque a utilização dos procedimentos (que subiu no pós-pandemia) tende a se regularizar - avalia Ocké-Reis."

Novais refuta essa hipótese. Segundo o executivo, de fato houve oferta de planos mais baratos no mercado, mas com características diferentes aos tradicionalmente ofertados, como área de cobertura mais restrita e redes de atendimento mais enxutas.

Ele afirma porém que as operadoras foram surpreendidas com a sinistralidade (maior uso de procedimentos) desses novos planos. O índice fechou o semestre em 87,9. Ou seja, de cada R$ 100 recebidos com mensalidade, R$ 87,90 foram gastos com assistência.

Para o superintendente da Abramge, o grande peso desse encolhimento da receita por beneficiário está no rebaixamento de planos para outros mais simples, o chamado downgrade:

"Isso sempre aconteceu, mas não com a intensidade que vimos nos últimos tempos. O natural em todo mercado é que, quando cai a receita, os custos acompanhem, mas não é o que estamos vendo nesse mercado."