João Irineu Medeiros fala em palestra sobre descarbonização: "Temos de criar uma solução nossa"
Vice-presidente de Assuntos Regulatórios da Stellantis para a América do Sul participou da palestra intitulada "Sustentabilidade, descarbonização e o marco regulatório na indústria automotiva"
Extrair o potencial do etanol e da eletrificação para, juntos, acelerarem o processo, já vigente, de transição da utilização de combustíveis de origem fóssil para os renováveis. Sonho de empresários da indústria automotiva e de especialistas da área de transição energética. Uma “hibridização” de ideias para, de fato, alcançar na prática a descarbonização completa, com veículos híbridos movidos à energia limpa. Debate que marcou uma das palestras desta segunda (4) do Fórum Nordeste 2023, promovido pelo Grupo EQM, comandado pelo empresário Eduardo de Queiroz Monteiro, no Mirante do Paço, no Bairro do Recife.
João Irineu Medeiros, vice-presidente de Assuntos Regulatórios da Stellantis para a América do Sul, foi o responsável por comandar a palestra intitulada "Sustentabilidade, descarbonização e o marco regulatório na indústria automotiva”. A mesa teve como mediadores Mário Campos Filho, presidente da Bioenergia Brasil e da Associação das Indústrias Sucroenergéticas de Minas Gerais (SIAMIG), e André Rocha, presidente do Sindicato da Indústria de Fabricação de Etanol do Estado de Goiás (Sifaeg).
"Nosso desafio para se adequar ao processo da descarbonização é enorme. Não podemos copiar o que é feito na Ásia ou nos Estados Unidos. Temos de criar uma solução nossa. Temos um programa que visa reduzir a emissão de CO² em 50% até 2030 e ter carbono neutro em 2038", afirmou João Irineu. "Jogamos 50 giga toneladas de gás carbônico todo ano na atmosfera. Os cientistas fizeram um projeção de que, continuando assim até 2100, teremos um aumento de quatro a cinco graus na temperatura. Algumas regiões poderão ficar inabitáveis. São números preocupantes. Precisamos zerar essa emissão. Não há outra alternativa", reforçou o palestrante.
Goiana representa Estado na Stellantis
A Stellantis é a número 1 no mercado automotivo no Brasil e na América do Sul. A multinacional foi formada a partir da união da montadora ítalo-americana Fiat Chrysler Automobiles com a montadora francesa PSA Group, após a conclusão de um acordo de fusão 50–50. O grupo é composto por Abarth, Alfa Romeo, Chrysler, Citroën, Dodge, DS, Fiat, Jeep, Lancia, Maserati, Opel, Peugeot, Ram e Vauxhall. No Brasil, tem polos automotivos nas cidades de Goiana (Pernambuco), Betim (Minas Gerais) e Porto Real (Rio de Janeiro). No Estado, o centro funciona há oito anos, gerando 14 mil empregos.
Globalmente, a empresa tem como foco reduzir a emissão de CO² (gás carbônico) de 50% até 2030 e 100% até 2038. O caminho passa pela combinação de etanol, extraído da cana-de-açúcar, e eletrificação, com a tecnologia chamada “Bio-Hybrid”, de motopropulsão híbrida, que combina energia térmica flex e elétrica. A Stellantis quer ter plataformas híbridas inteiramente desenvolvidas e industrializadas no território nacional a partir de 2024.
“Não podemos copiar os modelos da Ásia ou Europa porque eles, não tendo o etanol, precisam descarbonizar usando o carro 100% elétrico. Mas nós temos essa alternativa e vamos colocar a hibridização. Ter um carro híbrido ajudaria a mitigar a emissão desses gases. Queremos fazer essa transição para quando o elétrico, lá na frente, estiver mais acessível. Não podemos somente esperar no futuro a hora que a bateria ficará mais barata. Já podemos pegar o etanol e iniciar o processo de descarbonização. Não queremos um ou outro, mas sim os dois juntos, vendo o tempo para utilizar cada um”, apontou João Irineu.
Tipos de tecnologias híbridas nos carros
Na rota tecnológica de descarbonização, a Stellantis desenvolveu quatro plataformas para aplicação no Brasil. São elas a Bio-Hybrid (com bateria adicional de íon-lítio para realizar a partida do motor a etanol ou flex), Bio-Hybrid e-DCT (com dois motores elétricos, sendo um deles acoplado à caixa de câmbio e gestão eletrônica que controla a operação entre os modos térmico, elétrico e híbrido), Byo-Hybrid Plug-in (com bateria que pode ser alimentada pelo sistema de regeneração nas desacelerações, pelo motor térmico ou por recarga externa) e BEV 100 elétrica (totalmente impulsionada por um motor elétrico de alta tensão alimentado por uma bateria recarregável de 400 Volts).
Eleito um dos 100 mais influentes da energia da década no Brasil, André Rocha ressaltou como a importância do etanol foi crescendo ao longo do tempo, deixando de ser apenas uma opção para se toirnar prioridade na busca pela sustentabilidade.
“Já economizamos a importação de 3 bilhões e 540 milhões de barris de petróleo só com uso do etanol. Do jeito que está, conseguiremos economizar mais 164 milhões por ano. Em um primeiro momento, a ideia sobre o etanol era ter uma alternativa mais viável, evitando o desequilíbrio da balança comercial. Hoje, já olhamos a questão da pegada de carbono (medida que calcula a emissão do elemento químico na atmosfera por uma pessoa, atividade, evento, empresa, organização ou governo). Costumo dizer que a usina é a lei de Lavoisier na prática: ‘nada se perde, tudo se transforma’. Antes, não utilizávamos o bagaço e a vinhaça e hoje pegamos para gerar energia”, declarou.
RenovaBio atinge marca histórica
Segundo a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), considerado o maior programa de descarbonização da matriz de transportes do mundo, superou a marca das dezenas de milhões de Créditos de Descarbonização (CBIOs). Desde o início da operacionalização do programa, em janeiro de 2020, foram evitadas emissões de 100 milhões de toneladas de CO2 equivalente para a atmosfera. A Renovabio foi instituída pela Lei nº 13.576, de 2017, integrando a política energética nacional.
“Antes do RenovaBio, já existia a descarbonização, mas ela não era quantificada. Hoje conseguimos fazer isso. Temos praticamente todos os produtores de biocombustíveis certificados, sabendo os pontos a serem melhorados. Precisamos falar para a sociedade o peso que existe em parar em um posto de combustível e escolher o etanol em detrimento da gasolina. É necessário ter um modelo que equacione o que o País precisa, equilibrando as questões econômicas, sociais e ambientais. Não é só descarbonizar por descarbonizar. É preciso manter um parque que produza esses automóveis híbridos no Brasil, fornecendo também os biocombustíveis. Esse trabalho pode tornar o País a ter um protagonismo no tema”, declarou Mário Campos Filho.
Combustível do Futuro e alíquotas
De olho em estimular a transição energética, uma proposta de política pública para redução das emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) deve chegar em breve ao Congresso Nacional. O chamado “Projeto de Lei (PL) Combustível do Futuro”. Há, ainda, o tema envolvendo a possibilidade de uma alíquota única de impostos sobre o etanol, dentro do processo de discussão da reforma tributária, já aprovada na Câmara e que está no Senado atualmente.
“Temos 17 diferentes alíquotas de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) no Brasil. O que leva alguns estados a terem um preço de etanol mais acessível do que outros. Isso provoca a concentração do consumo em determinados lugares, o que não condiz com a nossa divisão populacional. A reforma encaminha a possibilidade de ter uma única alíquota, diferenciada em relação à gasolina. Ela seria balizada pelos estados que já possuem a utilização do biocombustível. Isso fará com que a gente consiga nacionalizar o consumo do etanol ”, pontuou o presidente da SIAMIG.