Novo Mangueirão: Seleção brasileira inicia ciclo da Copa de 2026 em estádio reformado no Pará
Seleção reencontra um renovado Mangueirão 12 anos depois da última partida. Estádio de Belém ficou dois anos em obras e foi ampliado para receber mais de 50 mil torcedores
Depois de 12 anos, a seleção brasileira está de volta a Belém. A história de um novo ciclo, comandado por um novo treinador — Fernando Diniz, do Fluminense, foi escolhido pela CBF como interino até a definição de um nome definitivo —, se mistura com um capítulo importante de um estádio praticamente novo.
Às 21h45 desta sexta-feira, Brasil e Bolívia se enfrentam no Mangueirão, apelido do Estádio Olímpico do Pará - Jornalista Edgar Proença, onde Paysandu e Remo mandam seus principais jogos.
Em fevereiro de 2021, ele entrou em processo de obras de revitalização, para se adequar a padrões internacionais. As obras foram concluídas neste ano, e a reinauguração aconteceu em abril, com um Re x Pa, o grande clássico do futebol paraense. Eventos teste haviam sido realizados em dois jogos entre Remo e Paysandu na semifinal da Copa Verde deste ano, até a reabertura oficial acontecer em uma partida do Campeonato Estadual, no dia 9 de abril.
Sua capacidade anterior era de 45 mil lugares, mas só tinha condições de receber até 35 mil. O Novo Mangueirão foi ampliado para receber mais de 50 mil torcedores, tornando-se o maior estádio da região Norte, superando a Arena Amazônia, em Manaus, que pode receber 44 mil pessoas.
O local abriu as portas originalmente há mais de 40 anos, em março de 1978. Porém, problemas estruturais foram identificados em um complexo que não passava por intervenções há mais de duas décadas. Apresentando possibilidade de incidentes, colocava torcedores em risco. Com esse motivo detectado, o governo estadual entrou em ação.
Inicialmente, a obra foi orçada em cerca de R$ 146 milhões, mas um levantamento do jornal O Liberal apontou que os valores podem ter passado dos R$ 508 milhões — 245% a mais. A nível de comparação, a Arena Amazônia, construída para a Copa do Mundo de 2014, custou R$ 669,5 milhões.
Por falar nesse Mundial, ao contrário das obras realizadas em vários estádios que sediaram partidas, que consistiram em sua demolição completa — como Maracanã, Mineirão e Beira-Rio —, a arquitetura do Mangueirão foi preservada, e grande parte dos trabalhos foi feita nas áreas internas.
Entre as mudanças: renovação geral da pintura, dos sistemas de som e iluminação; substituição de assentos (formando a bandeira do Pará); aumento do número de rampas (de duas para 14); ampliação do estacionamento; instalação de estruturas metálicas na cobertura; 535 câmeras de monitoramento (83 com tecnologia de reconhecimento facial); substituição do gramado e do piso da pista de atletismo — que ainda será concluída, também seguindo padrões internacionais.
“O governo do Estado entregou o Mangueirão totalmente revitalizado, uma obra que elevou o nível de segurança e conforto do estádio, permitindo que ele esteja preparado para receber este importante evento esportivo, que é um jogo da nossa seleção brasileira”, disse Cássio Andrade, secretário de Estado de Esporte e Lazer.
No último dia 31 de julho, após realizar inspeções técnicas no local, a CBF escolheu o Novo Mangueirão para ser o local do pontapé inicial da seleção no ciclo de copa. Em 2023, Fluminense e Corinthians jogaram em Belém pela Copa do Brasil, contra Paysandu e Remo, respectivamente. As equipes paraenses foram eliminadas, mas as duas torcidas lotaram as arquibancadas nos jogos.
— As expectativas são as melhores possíveis. Quando eu era pequeno, o estádio era muito inseguro. Espero que seja um jogo onde tenha muita segurança. Vai ser um público diferente de um Re x Pa, mais família. Vai ser legal assistir um jogo da seleção pela primeira vez ao vivo — diz Leonardo Souza.
O bancário de 42 anos é um remista que cresceu em uma família quase toda bicolor. Ele frequentou o Mangueirão durante a vida e guarda boas histórias em jogos no estádio, principalmente em clássicos. No entanto, ainda não foi à sua nova versão, o que fará nesta sexta, ao lado da esposa Giselly, 45, e o filho Lucas, 14.
Ambos também são torcedores do Remo, e eles irão juntos pela primeira vez a um estádio para assistir um jogo oficial — já estiveram presentes em pré-temporadas do clube do coração. Para o pai, será a oportunidade de dar fim a um arrependimento que dura 12 anos.
Um super clássico inesquecível
Em Belém, já estão presentes Diniz e seus primeiros convocados: nomes como Neymar, Casemiro, Marquinhos e Alisson. Esta não será a primeira vez que o Mangueirão recebe a seleção, que já atuou no local quatro vezes. Em 1990 e 1997, amistosos contra Chile (empate por 0 a 0) e Marrocos (vitória por 2 a 0), respectivamente. Já em 2005, o único jogo oficial, vitória por 3 a 0 contra Venezuela, pelas Eliminatórias da Copa.
A última vez foi em 2011, quando Brasil e Argentina fizeram o Superclássico das Américas na frente do povo paraense. Neymar defendia o Santos, e fez o segundo gol da vitória brasileira por 2 a 0, fechando o placar aberto por Lucas Moura. Com o empate em 0 a 0 na ida, na Argentina, a seleção levou o título. Outro grande nome em campo era Ronaldinho Gaúcho, então no Flamengo.
Atualmente com 23 anos, o nadador paralímpico Gabriel Figueiredo tinha apenas 11 quando esteve pela primeira vez no Mangueirão, acompanhando Ronaldinho na entrada do campo, o capitão da equipe naquele 28 de setembro. Com a deficiência de um desvio nas pernas, ele não conseguiu virar jogador de futebol, mas praticava esportes desde os 9 anos.
— Foi uma emoção muito grande. Nem imaginava que poderia entrar com ele. Falou algo que não deu para eu escutar muito bem. Teve o momento do hino à capela, que virou tradição nos jogos do Brasil, e tudo foi muito gratificante — lembra Gabriel. — Na época, eu era palmeirense, por conta da minha vó, mas virei flamenguista. É meu ídolo até hoje.
Selecionado por um projeto para integrar o grupo de crianças que entraria com as seleções, ele não tinha noção se estaria ao lado de um brasileiro ou argentino, e se lembra que só viu os jogadores na hora da entrada. Aquele foi seu primeiro jogo de futebol na vida e, a partir dali, começou a frequentar eventos esportivos no Mangueirão. Desta vez, não será diferente: irá ao jogo da seleção. Aliás, ele já voltou à nova versão e aprovou o que viu:
— O ambiente está diferente, mas com a mesma emoção de quando entrei pela primeira vez. As rampas ajudam as pessoas cadeirantes e eu, que sou deficiente físico. A acessibilidade está maior para nós — analisa Gabriel. — Permaneceu a marca e a origem. Por mais que mude uma pintura ou uma cadeira de lugar, a gente vai chegar no Mangueirão e vai ter as lembranças do que já viveu lá dentro — ressalta.
O reformado estádio também se propõe a ser sustentável, com o uso de sistemas de captação de água da chuva e painéis solares para geração de energia elétrica. As novas rampas foram pensadas para facilitar o acesso de pessoas com deficiência (PcD).
Nesse aspecto, o Novo Mangueirão agora carrega o pioneirismo entre estádios do Brasil ao incluir espaços destinados a pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Duas salas no estádio contam com isolamento acústico, acomodação sensorial e outras conveniências para torcedores necessitados.
Os ingressos para o jogo contra a Bolívia custaram entre R$ 200 e R$ 1.600, que refletem uma partida de nível internacional. Porém, os valores praticados no cotidiano de Remo e Paysandu vêm sendo menores. Este é o local que volta a receber a seleção brasileira, em um jogo de novidades para muitos envolvidos.
— Vai ser legal, lá na frente, quando o Brasil estiver classificado à Copa, a gente saber que nós, de Belém, estivemos no pontapé inicial. — finaliza Leonardo, orgulhosamente. — O primeiro jogo das Eliminatórias foi em Belém e eu estava presente com a minha família.