Deborah Secco: "Quanto mais a gente falar de sexo, mais mulheres vão gozar e não fingir"
Prestes a estrear na novela 'Elas por elas' e rodando a série 'Rensga hits', atriz revela que não é 'uma mulher tão transante'
Não é à toa que a frase de Shakespeare "a imaginação governa o mundo" tem lugar de destaque na parede da sala de Deborah Secco. Ela diz muito sobre a dona da casa. A cabeça da atriz de 43 anos - que estreia na novela "Elas por elas", da TV Globo, no dia 25, e roda a segunda temporada da série "Rensga hits", do Globoplay -, vai longe.
Desde sempre. Mais precisamente, desde os 6 anos de idade. Foi quando ela inventou para os pais que havia perdido a memória. Passou dois meses sustentando a mentira. Depois, fingiu ter quebrado o braço. Emplacou até um gesso. Tudo para convencer a família de que tinha talento para interpretar. Ofício que hoje, lhe frustra frequentemente. É que o resultado concreto de uma cena jamais alcança o que Deborah havia elaborado dentro da cachola.
Mas a imaginação também é fruto de grandes prazeres para ela, que costuma mergulhar nas fantasias na hora do sexo. Esse é um assunto, aliás, do qual a atriz adora falar, como se vê na entrevista abaixo. Mas na conversa, em que também fala sobre maternidade, terapia e casamento aberto, ela surpreende ao revelar que, na prática, não é "uma mulher tão transante" assim...
Está gravando novela e série ao mesmo tempo. Como é conviver com duas personagens, administrar duas personalidades ao mesmo tempo?
Uma loucura. É a primeira vez que vivo essa experiência. Não consigo abandonar a personagem no set. São duas mulheres muito diferentes de mim. Acessar tons de voz, energias diferentes... Estou tentando manter a calma, vivendo uma cena de cada vez. Outro dia, li sobre pessoas com muitas personalidades. Estou experimentando isso sem ter esse diagnóstico (risos). Três mulheres convivendo em uma. Ou mais, porque tem a Deborah administradora de publicidade, a mãe, a esposa...
Falando da Deborah mulher... Suas participações no podcast "Quem pode, pod", em que convidou Giovanna Ewbank para um ménage, e no programa "Sobre nós dois", em que deu detalhes íntimos da anatomia de Hugo, seu marido, deram o que falar. Por que acha importante falar sobre esse assunto?
Isso é um loucura! Foram conversas de mais de duas horas em que falei de tantas coisas... As pessoas dizem: "Ah, ela só fala de sexo". Não. Falo de muitos assuntos, mas isso é que viraliza. O corte que está em todos os sites e no Instagram é o que eu falo do pau do Hugo no programa da Sabrina, e eu chamando Giovanna para a minha casa no podcast dela...
Hugo não ficou constrangido em ser tão exposto?
Ele topou. A gente questionou se queria que tirasse ou não. Essa foi uma questão porque, pra mim, o que mais importa é vê-lo bem. Ele assistiu antes e topou. Tudo certo. Se tá de boa pra mim e pra ele, não importa mais ninguém. Quem não gostou, não assiste.
Acha que as pessoas se incomodaram porque ainda é um tabu mulher falar de sexo?
É tabu, só que para mim, não é. Pra mim, é igual falar do almoço. Trato boceta e cotovelo com a mesma naturalidade. São duas partes do meu corpo. Todos nós somos feitos de uma relação sexual. Quanto mais a gente falar de sexo, mais desmistifica, mais mulheres vão gozar e não fingir. Porque a gente cresceu fingindo, e eles acreditando.
Entendi o sexo na adolescência cheio de questões. Demorei para gozar sem me masturbar, com homens. Achava que era erro meu. Guardei isso por anos, fui falar na análise. Pra mim, tudo na vida é diálogo e não só sobre sexo. É que o sexo viraliza. Estou aberta ao diálogo sobre tudo.
Mas esses convites que você fez, são reais? Namoraria mulheres?
São reais, eu gostaria (risos). Acho as duas mulheres incríveis e interessantes. Me interesso por pessoas. Já namorei mulheres e namoraria outras. Mas agora tem que negociar com Hugo...
Qual é o acordo de vocês?
Nem falo casamento aberto porque essa ideia também é fechada. É um casamento vivo, conversado. Estou casada há 9 anos, e a mulher que era, não sou mais. Nem ele. Os combinados são refeitos todos os dias, conforme a gente vai se deparando com situações. Meu casamento é honesto, sincero. Se ele é meu parceiro, o pai da minha filha, meu melhor amigo e escolhi dividir a vida com ele, vai saber tudo sobre mim. E a gente vai entender caso a caso. Acho que os casamentos são quase sempre "abertos" para o lado dos homens, sem que as mulheres saibam... Não gostaria de viver isso, então, é abrir para os dois lados para todo mundo ser feliz.
Você tem zero ciúme?
Falei em uma entrevista que não tinha ciúme do Hugo. Que se ele quisesse ficar com outra mulher, podia. Mas que se um dia se apaixonasse, queria que ele me contasse para eu ter tempo de reconquistá-lo. Ainda não tinha falado do casamento aberto. Aí, pareceu que eu ia ficar quietinha em casa, santa, puritana. Não, ele pode ir para a rua e eu também.
Às vezes, a gente não se expressa do jeito que deveria, é uma pressão grande. Vou ser cancelada por um equívoco. As pessoas tem que ser mais leves com as outras. É muito louco botarem na fogueira, crucificarem as pessoas. Não sou tão racional. Tem momentos em que a gente está mais cansada, com menos filtro. E também muda de ideia, né? Já falei coisas de que me arrependi no dia seguinte.
Você só fala ou transa muito também? Qual é o lugar do sexo na sua vida?
O mesmo que tomar banho. Às vezes, não é tão presente por causa de encaixe de tempo, mas tento fazer porque me faz bem. Não que eu seja super transante, "ó como ela é sexy, gostosa". Não sou uma mulher tão transante assim. É porque isso é saudável pra mim. Entendi também que muitas mulheres não gostam de transar, vão perdendo a libido porque não gozam. É uma demanda, gasta uma energia, a gente quer dormir. Se for fazer tudo isso para não ter prazer, aí é melhor nem fazer. Eu gozo, aí é bom. Aí eu faço.
Você tem necessidade de seduzir o tempo todo?
Tenho desejo de vida, no sexo, no trabalho, na minha filha. Não sou sedutora. Nunca me vi nesse lugar da mulher bonita, sexy, isso foi chegando com o tempo. Na adolescência, perdia meus namorados para a minha irmã. Nunca era a primeira opção dos meninos. Era a estranha. Nunca fui gata. Uma determinada hora, fiz algum personagem e alguém entrou nessa piração. Entendi que talvez me vejam assim porque sou livre. E a mulher livre é mais interessante. Todo mundo flerta com essa liberdade, mas talvez não saiba como colocá-la nesse dia a dia socialmente repressor.
Apareceu para mim um convite para entrar no "Only Secco"... O que é isso? Tem algo a ver com o OnlyFans? Pensa em entrar na plataforma?
É meu grupo no Instagram (risos). Meus seguidores deram esse nome. Pedi para darem opções, fiz uma enquete e eles escolheram esse. Não vou entrar no OnlyFans. Mas não foi por falta de convite (risos)...
Mudando completamente de assunto... Você dirigiu um programa infantil no canal Gloob e, quando conversamos na pandemia, contou que estava escrevendo argumentos. Há planos de outros projetos próprios?
Dirigir é um caminho que devo seguir. Talvez consiga dirigir um curta escrito por mim no ano que vem. Tenho certeza que posso dirigir qualquer coisa, tenho um entendimento do início do fim do projeto. Mas já me comprometi com dois projetos de cinema. Um é "Meteoro", filme que conta a história de uma caminhoneira meio assexuada, que se apaixona por uma mulher. Acabei de rodar a série “Codex 632” (coprodução de Globoplay e RTP), em que faço uma mulher massacrada, que parou de trabalhar, de ser amada e busca renascer. Foi ótimo. Isso que tem me interessado como atriz: abrir gavetas, me experimentar em outros lugares.
Em “Boa sorte”, filme da Carolina Jabor, te enxerguei num registro diferente do qual costuma atuar...
Era uma proposta de atuação diferente da TV, o naturalismo, que eu amo fazer, mas que não emplaca em novela. Por que as pessoas não assistem novela, elas escutam. Estão no celular, no Instagram, fazem comida, conversam. Ninguém para ver. Então, pede outra forma de interpretação. E eu adoro fazer. Mas o naturalismo também é um lugar precioso para mim, que talvez eu revisite em “Meteoro".
Aproveitou essa segunda temporada para calibrar algo com que não tenha ficado satisfeita na intepretação da sua personagem em "Rensga Hits"?
Sim. Série é meio às cegas, a gente faz sem ver o resultado. Só fui assistir um ano depois. É uma personagem que propus. Estava cansada de fazer mulher sexy. Quis fazer diferente do que me dão sempre. Então, ela é uma empresária não vaidosa, desapegada da estética. Agora, tenho a Marlene que mais gosto dentro de tudo que fiz, ela está mais na minha mão.
Mas nunca gosto do que vejo. É sempre um exercício de frustração. Quando penso num trabalho, minha imaginação vai num lugar que a capacidade humana não atinge. É tipo ler livro e ver o filme. Jamais corresponde às expectativas.
Faz análise? Qual nó central da vida que a terapia te ajudou a desatar?
Fiz por 16 anos. Minha terapeuta morreu e não consigo emplacar outra. Ela sabia tudo sobre mim. Talvez, meu nó central venha lá de trás. Eu tinha uma irmã mais velha doente, que morreu depois que eu nasci. Ela tinha 5 anos, eu, 1 ano e meio. Era muito parecida com ela, fui a substituta para essa dor, um alento para esse buraco. Isso rege minhas questões: a necessidade de cumprir as funções de felicidade para todos, ser o que esperam de mim. Não podendo errar, me cobrando e me julgando horrores.
A alegria que enxergo em você é disfarce para esse buraco aí?
Também é fruto disso. Fui criada pela minha mãe com a certeza da morte. Fui uma criança com muitas questões de saúde. Desmaiava, fiquei doente a infância inteira. Minha mãe me criou com a certeza do fim, do “a gente precisa ser feliz agora”. Muitas coisas na minha maternidade são pautadas por isso. Quando dizem, “criança não pode pintar o cabelo...". Meu amor, não sei se ela vai estar viva amanhã. Se isso vai fazê-la feliz hoje e não fará mal a ninguém, pode. O certo e errado, pra mim, tem outro peso. Sempre vivi achando que o fim pudesse ser amanhã, é tudo urgente.
O que tem vivido de melhor e de pior na experiência da maternidade?
A maternidade é meu céu e meu inferno. Maria Flor é o maior amor que já senti, maior do que o que tenho por mim mesma. É um desprendimento por alguém. Mas a dor dessa desistência ela é latente.
Como assim? Desistência de você mesma?
Quando nasce um filho a gente desiste da gente. Desisti absolutamente de mim por dois, três anos. Depois, flerto uma volta com a Deborah que um dia existiu, mas nem sei se conheço ela tão bem, se tem espaço para ela nessa dinâmica de vida. Sou intensa, largaria mundo e recriaria mundos para ser feliz. Mas hoje não. Não posso abandonar esse mundo, que tem valor inestimável para mim. Então, é uma dor de abandono, de um fim. Aquela pessoa que eu era antes da Maria chegou ao fim.
Há coisas mais prosaicas que odeia fazer como mãe?
Amo botar para dormir, dar banho, conversar. Odeio brincar. Com todas as minhas forças. Adoro ir ao cinema, jantar junto. Meu inferno é ir para festinha com um monte de crianças e mães. Maria Flor me coloca em contato com meus maiores defeitos e com as minhas melhores qualidades, joga na minha cara tudo que preciso olhar em mim.
O que mais detesta enxergar?
Minha personalidade forte, meu jeito que tudo tem que ser do meu jeito. Ela é igual. Se algo não sai como não planejou, fica irritada. É meu espelho. Mas é grandioso, porque me revisito e tento melhorar diariamente.
A maternidade te deixou menos hipócrita, no sentido de bancar seu discurso?
Sim, a gente tem que fazer o que a gente prega. Mas isso é uma virtude minha: sempre banquei meu discurso, por mais difícil que fosse para uma sociedade que pensa diferente. Sou livre no meu olhar pela vida e prezo a liberdade de cada um. Vi um vídeo da Elis Regina que faz todo sentido. Ela dizia: “Isso que falo é fruto da minha observação. Talvez eu observe o mundo de forma errada. Aí, desculpa”.
De onde você olha, faz sentido...
Exato. Hugo, por exemplo, é super discreto. Acho o máximo ele ser assim. Gosta de sair com os amigos, e eu de trabalhar. Ama ter menos acelerada e eu, pisar no acelerador. Tenho certeza que ele acha o máximo minha loucura, minha capacidade de exposição. Somos opostos que vivem juntos e não se julgam.
O que mais me deixa triste hoje é ver o mundo apegado em apontar o dedo. Já não entendemos que somos plurais? Não cabe dizerem que o que penso é vulgar, que a forma como ajo é inadequada. Não existe inadequado. Não dá mais para menosprezar ou diminuir a existência de alguém. Existo dessa forma. Qual é a outra solução? Me matar? Se me acha inadequada, para de me seguir, muda de canal.
Mas isso é hoje, porque por muito tempo você tentou se enquadrar para caber...
Passei anos tentando me enquadrar numa sociedade que eu não cabia. Só consegui depois de anos ser quem eu sou porque comprei um homem que me compra e me admira do jeito que eu sou, porque construí uma dinâmica de família e uma estabilidade financeira que, se tudo der errado, está tudo bem.
Você foi criticada por causa do figurino ao participar de um programa esportivo durante a Copa. O que diria para quem julga uma mulher pela roupa que ela veste?
Um programa que tem curadoria. Não cheguei lá louca e botei a roupa que quis. Tinha diretor, um monte de gente aprovou…
Mesmo que fosse uma escolha só sua...
Se alguém não aprovasse, eu não estaria com aquela roupa. Mas quem são as pessoas para julgar? A mulher não é a roupa que veste ou uma declaração que dá. Todas as mulheres, mesmo as que pensam diferente de mim e me julgam, somos vencedoras só por existir nessa sociedade opressora e patriarcal. Vejo um grupo querendo andar pra trás, por isso, acelero.
Hoje, posso usar biquíni grávida porque Leila Diniz usou. Cada vitória de mulher é conquista para as outras, então pode me bater. “Ah, mas você não é feminista”. Não estudei mesmo, só existo dessa forma. “Ah, você é vulgar não representa as mulheres”. Não represento, mas sou mulher, não podem tirar isso de mim.
Tendo começado a carreira artística muito nova, como você acha que ter crescido sob os holofotes influenciou sua vida e o seu comportamento?
Nem sei ser diferente. O que percebo é que, se sou criticada, o baque das pessoas à minha volta é muito maior do que em mim. Já sou criticada há tanto tempo... E vou continuar apanhando porque é inadequado mulher falar sobre sexo, descobrir como é legal o sexo com prazer porque isso pode fazer com que a gente pare de servir ao prazer dos homens.
Você já disse que deixou de ir à praia por anos com medo de ser fotografada “por um ângulo que não estivesse perfeita”. Como é sua relação com o corpo hoje? Parece bem ligada na aparência...
Sou super ligada e tento me desligar porque essa é uma questão. Hoje, posto foto de paparazzi para trabalhar isso em mim. Quando tinha 18 anos, tinha que estar dentro dos padrões. Não era uma opção: as fotos eram retocadas, era a gente linda nas revistas e ser vista "normal" na praia me fazia pensar: Será que vou ter emprego amanhã? Isso cria uma neurose. Tomei remédio para emagrecer por anos, fiz lipo, botei peito, nunca escondi. Parei de tomar remédio para emagrecer há três anos, e foi libertador. Parei de malhar tem 10 anos...
E continua tomando essa Coca-cola aí (Deborah toma refrigerante zero o dia inteiro, faz parte de sua rotina) sem engordar?
No início, pensei que ia ficar gordinha, mas não ia mais massacrar minha saúde para caber. Encontrei um marido que me ama, que compra tantas coisas minhas, não ia comprar uma barriguinha? Mas não rolou. Nem faço dieta. Mas desisto de falar isso porque tudo mundo vai dizer que é mentira. Ainda mais porque já falei que era mentirosa quando era nova. E isso volta. Eu gostava de testar meu poder de interpretação. Inventava coisas para a minha mãe e meus amigos verem que eu era boa.
E emplacava?
Sempre! Fingi que perdi a memória com uns 6. Quebrei o braço duas vezes sem nunca ter quebrado. Depois, dizia: "É mentira! Tá vendo como sou boa? Deixa eu trabalhar". Maria é igualzinha. Faz cena. Pergunto: "Mas o quanto disso é verdade? Mamãe não pode dar remédio se for mentira".
Envelhecer é uma questão para você?
É difícil por um lado, mas tão bom por outro, né? A libertação desse caber é revolucionária. Nunca fui certinha, mas agora não faço a menor questão de caber. Quero caber para quem me importa, quem sabe quem eu sou no íntimo, porque para quem consome uma fatia minha de 15 segundos dentro de um podcast, que é meio brincadeira meio verdade... Super verdade: pegaria Giovanna (risos).
Mas o julgamento das pessoas cada vez me importa menos. Julgam uma Deborah que não conhecem. Tenho total consciência do quanto sou diferente dessa persona. Não sou essa mulher transante, sexy.