Toffoli não vê espaço para rever decisão de provas da Odebrecht após dados do Ministério da Justiça
A manipulação das provas sem respeitar a cadeia de custódia é um dos principais argumentos utilizados pelo ministro na decisão em que anulou os elementos a partir da leniência da Odebrecht
Os dados entregues pelo Ministério da Justiça ao Supremo Tribunal Federal sobre o pedido de cooperação internacional feito pela Lava Jato não devem alterar a decisão do ministro Dias Tofffoli pela nulidade de provas obtidas a partir da leniência com a Odebrecht. De acordo com interlocutores do ministro ouvidos pelo Globo, o entendimento dele é que as novas informações apenas confirmam a tese que os dados não poderiam ser usados quando o acordo de colaboração foi fechado, em dezembro de 2016.
Documento entregue nesta semana pelo Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), ligado ao Ministério da Justiça, mostra que um pedido de cooperação com a Suíça foi feito em junho daquele ano. A resposta com os dados de sistemas usados pela Odebrecht para pagamento de propina, contudo, só chegou ao Brasil em outubro de 2017, quase um ano depois que o acordo já havia sido firmado, incluindo esses mesmos dados.
Toffoli tem dito nos bastidores que o documento na verdade comprova que equipe da Lava Jato utilizou dados obtidos de outros países antes de o DRCI finalizar o processo de atuação conjunta internacional. A cooperação é importante para se manter a chamada "cadeia custódia" das provas. O termo, de acordo com o Código de Processo Penal, se refere à manutenção da história cronológica dos elementos utilizados como prova de crime.
A manipulação das provas sem respeitar a cadeia de custódia é um dos principais argumentos utilizados pelo ministro na decisão em que anulou os elementos obtidos a partir da leniência da Odebrecht.
Além disso, segundo esses interlocutores de Toffoli, a decisão do ministro apenas estende a todos os processos um entendimento que a Segunda Turma já havia adotado ao analisar casos individuais. O gabinete do ministro contabiliza ao menos 51 decisões pela nulidade de provas baseadas nos sistemas da construtora. Em algumas delas não há sequer mais possibilidade de recursos. Portanto, a avaliação é que não caberia uma revisão a essa altura.
Nesta semana, a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) recorreu a decisão do ministro, com o argumento de que Toffoli partiu de uma premissa equivocada para concluir que as provas do acordo de leniência da Odebrecht não podem ser usadas em qualquer instância da Justiça. Em uma primeira resposta ao ministro, o Ministério da Justiça havia informado não ter localizado qualquer solicitação de cooperação com a Suíça.
Para a entidade, o Ministério Público Federal deu correto tratamento às provas do acordo de leniência da Odebrecht, e que os sistemas apontados como controle do pagamento de propina para políticos, Drousys e MyWebDay, seguiram rigorosamente os tratados internacionais multilaterais e bilaterais e a legislação brasileira.
A ANPR afirma que a Odebrecht, antes mesmo da formalização da cooperação, já havia entregue dados de forma "voluntária". As informações foram apresentadas por meio de depoimentos tomados no curso das delações premiadas, procedimentos distintos ao do acordo de leniência que teve as provas invalidadas por Toffoli. Ou seja, a ANPR sustenta que o acesso às informações ocorreu de duas formas distintas: via entrega voluntária dos ex-executivos da empreiteira e por meio do acordo de cooperação internacional.
A intenção da ANPR é que o recurso pare rever a decisão que anulou as provas seja analisado pela Segunda Turma da Corte, composta, além de Toffoli, pelos ministros Gilmar Mendes, Nunes Marques, André Mendonça e Edson Fachin, relator da Lava Jato.
Na avaliação de auxiliares de Toffoli, porém, é possível que o recurso nem sequer seja reconhecido, uma vez que a associação não faz parte do processo.
Na quarta-feira, o ministro da Justiça, Flavio Dino, já havia apontado a data de pedido da Lava Jato para ajuda internacional para questionar a legalidade das provas obtidas a partir da leniência.
— Temos a seguinte situação: provas foram obtidas sem a cooperação jurídica internacional regular. Foram usadas antes e posteriormente, um ano depois do uso das provas, é que houve a cooperação. É o fato que nós temos. Uma cooperação posterior é legal ou ilegal? O ministro Toffoli com certeza deve emitir uma decisão complementar sobre isso e nos cabe apenas aguardar — afirmou Dino ao participar de uma audiência no Senado.