Emprego

Ser pessoa jurídica ou ter carteira assinada? Veja o que vale mais a pena

Especialista calcula quão maior deve ser o 'salário' como PJ para que o emprego formal deixe de ser vantajoso do ponto de vista financeiro

Carteira de trabalho - Marcello Casal Jr/Agência Brasil

De um lado, a proteção da carteira assinada com as garantias sociais e previdenciárias, como contribuição para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), férias, 13º salário e recolhimento de Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS). Do outro, a perspectiva de remuneração mais alta, flexibilidade, mas sem direitos trabalhistas.

Em muitas áreas de atuação, é comum profissionais receberem propostas de contratação como pessoa jurídica (PJ), geralmente com valores mais atrativos do que os de cargos equivalentes com carteira assinada. Mas quando vale a pena?

Para responder esse questionamento, o Globo pediu simulações a Ivan Kertzman, professor de Direito Previdenciário na Faculdade Baiana de Direito.

Ele levou em consideração três faixas salariais brutas — de R$ 2 mil, R$ 5 mil e R$ 10 mil — e as alíquotas de contribuição previdenciária e outros encargos trabalhistas, além de descontos proporcionais de férias e 1/3 de férias. O cálculo revela em quanto a remuneração como PJ deve superar o valor de uma vaga celetista.

— Pelos cálculos, podemos perceber que a diferença fica próxima de 35%, parâmetro que deve ser avaliado na proposta — observa.

Especialistas avaliam que quem opta pela vaga de PJ precisa se planejar — no caso de um problema de saúde que o afaste das funções, por exemplo, e ainda para a aposentadoria.

A contribuição previdenciária pode ser feita pela pessoa jurídica, inclusive como microempreendedor individual (MEI), de forma simplificada. Para quem tem uma empresa, o pagamento do INSS pode se dar também por meio do pró-labore. A base de cálculo será a remuneração recebida durante o mês limitada ao teto máximo do INSS, que é R$ 7.507,49.

— Muitos empresários não retiram pró-labore da sua empresa e recebem apenas a distribuição de lucros. Por não estarem contribuindo para a Previdência Social poderão não ter acesso aos benefícios do INSS — ressalta Jeanne Vargas, advogada especialista em Direito Previdenciário.

Alíquota mais baixa na hora de recolher
Para prestadores de serviço de diversas atividades que faturam até R$ 81 mil ao ano, uma possibilidade é se tornar MEI, que paga a menor alíquota de contribuição previdenciária de 5% do salário mínimo (R$ 66).

— O faturamento é proporcional ao tempo de abertura do MEI. Por exemplo, se a abertura ocorrer em setembro, o cálculo incidirá sobre os três últimos meses do ano — explica o analista do Sebrae Rio, Eduardo Castelo.

O MEI paga por mês o Documento de Arrecadação do Simples (DAS), de até R$ 72, incluindo impostos, além do INSS. Assim, tem direito aos benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo (R$ 1.320), como auxílio-doença, auxílio-maternidade, aposentadoria e pensão por morte para os dependentes. Para ter direito ao benefício com valor acima do mínimo, é possível contribuir por meio de uma guia da Previdência Social.

Mário Avelino, presidente do Doméstica Legal, destaca até a importância dos trabalhadores domésticos contribuírem para o INSS:

— A diarista pode adoecer, e se não trabalha não ganha. Se contribuiu e ficou doente, vai ter auxílio-doença. Terá direito à pensão por morte para os filhos, acidente de trabalho... Muitas vezes, as pessoas só pensam na aposentadoria, mas há outras garantias importantes.

Segundo o IBGE, há quase seis milhões de trabalhadores domésticos no Brasil. Com carteira assinada, em 2022, eram 1,5 milhão de pessoas registradas. As trabalhadoras informais somavam 4,3 milhões sem carteira assinada.

O que mais considerar
Além de considerar o investimento para a Previdência Social ao encarar uma oportunidade como PJ, há outros pontos de atenção necessários. Maykon Henrique de Oliveira, planejador financeiro CFP, lista:

— O profissional precisa estar ciente das garantias que o regime de contratação CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) cobre e que ele abre mão ao virar PJ. Alguns que fazem uma grande diferença na vida do trabalhador: o aviso prévio indenizado, quando a demissão é imediata, férias remuneradas, pagamento de férias vencidas, indenização de 40% sobre o Fundo de Garantia em caso de demissão sem justa causa e seguro-desemprego.

Com isso em mente, é possível partir para as negociações nos contratos de prestação de serviços. Uma possibilidade é acordar férias e 13º salário, por exemplo. E fazer seu próprio investimento para gozar de descanso durante o ano, sem prejuízo financeiro. Se for usar o dinheiro somente nas férias, uma opção é investir em títulos isentos de Imposto de Renda como LCI e LCA, diz Maykon.

Além disso, como PJ, é preciso estar preparado para ter que arcar com emergências, sem a possibilidade de abonar faltas com atestados que garantem os ganhos de um profissional CLT.

— Como PJ, além de não conseguir dar atestado para si, você precisa, em alguns casos, arcar com os custos para que um substituto assuma a sua função em emergências — diz Maykon.

Como garantir a aposentadoria
MEI: Para ser MEI, é necessário exercer uma das atividades listadas no portal do empreendedor (www.gov.br/mei). Após o cadastramento, a guia DAS é emitida clicando em “Já Sou MEI” no portal, depois em “Pagamento da Contribuição Mensal (DAS)” e, em seguida, em “Boleto de Pagamento”, preenchendo-o com o CNPJ.

Para pessoas físicas: Se como autônomo você vai prestar serviço para pessoas físicas, a obrigação de fazer recolhimentos para o INSS é totalmente sua. Ou seja, você deve gerar a Guia da Previdência Social (GPS) e recolhê-la com o valor dos serviços prestados no mês. Essa contribuição pode ser mensal ou trimestral.

Como emitir a guia? A guia de recolhimento é emitida pelo site https://l1nk.dev/Oh5rM. Logo de início, é necessário selecionar o módulo no qual que você se insere, de acordo com a data de sua filiação ao INSS, se antes ou depois de 29/11/1999. Após a seleção do módulo, basta informar a categoria (contribuinte individual) e o número de NIT/PIS/Pasep.

Investimento conservador: Pensando em aposentadoria, para investidores com perfis conservadores e moderados, Maykon Henrique de Oliveira, planejador financeiro CFP, destaca como a melhor ferramenta a previdência privada, que tem tíquete mínimo de entrada muito baixo. A partir de R$ 100, é possível aplicar em previdência privada via aportes mensais, anuais ou esporádicos. E escolher entre vários tipos de fundos de investimento: mais conservadores, moderados ou multimercado. É definido um prazo para vencimento dessa aposentadoria, quando o dono da previdência é contatado para escolher o que fará com o dinheiro: se resgatará toda a quantia, se quer aplicar em outro investimento que dê uma renda mensal, ou se prefere que vire renda vitalícia. Para cada decisão, há um cálculo diferente. A previdência privada também tem o benefício tributário, ou seja, escolhendo a tributação regressiva, passados dez anos chega-se à menor alíquota de Imposto de Renda possível dentro da previdência no longo prazo.

Protegendo dependentes: Ainda sobre a previdência privada, é possível incluir beneficiários. Assim, caso aconteça alguma coisa com o titular, os beneficiários receberão o recurso diretamente em conta, sem precisar passar pelo inventário.

Para os arrojados: Para aqueles que entendem muito do mercado de investimentos, há possibilidades no mercado de ações. Na Bolsa de Valores, há fundos imobiliários que garantem uma renda mensal e são isentos de Imposto de Renda. Existem também ações que pagam dividendos, mas é preciso ter estômago para aguentar as oscilações comuns a esse mercado. E o investidor arrojado ainda pode escolher a previdência privada, que tem opções com fundos arrojados de ações.