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"Clã familiar": Rede de tráfico de crianças é descoberta no Peru; líder está foragida

Segundo a Defensoria do Povo, 299 crianças desapareceram em Cusco desde janeiro deste ano; Ministério Público estima que ao menos 20 crianças foram traficadas

Como um recém-nascido revelou uma rede de tráfico de crianças no Peru - Reprodução

Antes de ser encaminhada para a prisão de mulheres em Cusco, no Peru, Fanny Hurtado, de 45 anos, tentou comover o tribunal. Ela foi detida em no dia 4 de setembro por estar com um bebê que não era seu. Às autoridades, disse: “Eu me deixei levar porque queria ser mãe como toda mulher. Estava deprimida porque meu pai acabara de morrer. Não queria fazer mal ao bebê. Eu o salvei. Pequei por amar uma criança”.

Fanny contou que estava no mercado San Jerónimo quando uma mulher se aproximou e pediu que ela cuidasse do bebê de uma sobrinha por três dias. “Ela soube que eu não podia ter filhos por causa das minhas colegas comerciantes do mercado”, disse ela aos juízes. “Às vezes, compartilhava minhas preocupações com elas”, completou. Fanny também afirmou que, no passado, havia visitado centros de reprodução assistida.

Durante os interrogatórios, a mulher negou ter pago pelo bebê. Nesta sexta-feira, 22, a criança completará um mês de vida sob a proteção do Ministério da Mulher e Populações Vulneráveis. Conversas entre Fanny e uma mulher chamada Rosa Doris Huayhua mostram que houve um pagamento de 3 mil soles (R$ 3,9 mil) pelo bebê. Fanny disse ter pensado que este era o dinheiro “para os trâmites da adoção legal”.

Tráfico de crianças
Ela fala no plural sobre os outros envolvidos: Rubén Mora e Lizet Zambrano, filha de Rosa Doris, que aparece como a grande líder desta suposta rede de tráfico de crianças que operava perto da Plaza Mayor de Cusco sob a fachada de um centro obstétrico. Tanto Rubén quanto Lizet foram os destinatários dos depósitos de dinheiro. Apesar disso, a juíza concedeu-lhes liberdade temporária.

Rosa Doris Huayhua não retornou à audiência em que foi decidida a prisão preventiva de nove meses contra ela, e agora ninguém sabe onde ela está. Por causa dessa decisão, o escritório de controle do Poder Judiciário de Cusco abriu uma investigação contra a juíza. O paradeiro de Lizet também é um mistério. Embora ela não tenha sido presa em flagrante, sua ligação é direta.
 

No organograma do grupo, chamado Los Imperiales de San Jerónimo, ela cuidava do atendimento e certificação dos nascimentos, apresentando-se como bacharel em obstetrícia no local da organização. Emiliana Huacasi, decana do Colégio de Obstetras de Cusco, esclareceu que a mulher “não era membro do colégio e não estava habilitada para exercer”.

Lizet Zambrano não é a única filha de Rosa Doris Huayhua envolvida. O jornal Perú 21 publicou imagens de conversas que envolvem Candy Gutiérrez Huayhua, que até então não estava no caso. Tudo indica que eram um clã familiar. Mãe e filha se dedicavam a atrair gestantes, e a segunda filha falsificava documentos.

E eles não apenas comercializavam bebês, mas também fetos. Além disso, de acordo com Paulo Rivera, fiscal adjunto de Tráfico de Pessoas, se os bebês tivessem alguma deficiência, “as conversas indicam que eles poderiam ser mortos”. No centro obstétrico, fechado há duas semanas, foi encontrado um altar com incenso e carvão.

299 crianças desaparecidas
Segundo a Defensoria do Povo, 299 crianças desapareceram em Cusco desde janeiro deste ano. Esse número pode ser uma consequência das atividades criminosas dos Los Imperiales de San Jerónimo. Isso pode até esclarecer o misterioso roubo de dois cadáveres nos últimos meses: em julho, um feto desapareceu da morgue do Hospital Antonio Lorena; em agosto, uma sepultura que continha os restos de uma criança de oito meses foi profanada no cemitério Sol de Oro.

— Há mais envolvidos, inclusive pessoal da saúde. Não seria o primeiro bebê levado ao hospital onde Fanny Hurtado Altamirano foi capturada — disse uma fonte policial ao jornal de Cusco. O Ministério Público estima que cerca de vinte crianças foram traficadas.

Um terceiro filho de Rosa surgiu nesta história. Trata-se de Álvaro Zambrano Huayhua, suboficial da Polícia Nacional. Quando sua mãe foi presa, o policial ficou ausente de sua base na região de Puno por quatro dias. De acordo com o chefe de polícia Enrique Felipe Monroy, “ele partiu de forma irregular, sem o conhecimento de seus superiores”. O oficial declarou, ainda, que não vai “encobrir nenhum desses atos”.

Enquanto isso, a Promotoria de Tráfico de Pessoas continua em busca da mãe biológica do recém-nascido que revelou esta rede de traficantes, bem como das mulheres que foram atendidas neste centro obstétrico, onde ocorriam partos e abortos.