Dia do Perdão Judaico: data é comemorada a partir deste domingo (24)
Tradição é dedicada à santificação, busca por um mundo melhor e preparação espiritual
O dia mais sagrado do calendário judaico é o chamado Yom Kipur, Dia do Perdão, que é comemorado a partir do anoitecer deste domingo (24) e vai até o mesmo período da segunda-feira (25), pois segue o calendário lunar. Em Pernambuco, há cerca de 450 famílias que fazem parte da comunidade e seguem a religião monoteísta mais antiga do mundo. O Dia do Perdão é uma data de reflexão e oração, onde se perde perdão pelos erros e pecados cometidos no ano que passou.
Quando surgir a primeira estrela no céu, domingo, os religiosos entram no período de reflexão. No livro MAZCHOR estão contidas as rezas que a comunidade faz durante o período. A primeira, assim que começa o Dia do Perdão, é a KOL NIDREI. Nela, os judeus apresentam a Deus um pedido de perdão e iniciam um jejum de 25 horas, simbolizando o desligamento material deles e a conexão com o sagrado. Este momento, ao mesmo tempo, serve para introspecção individual e vivência coletiva.
Entre as rezas do período da manhã, está o YZKOR dedicado a reverenciar aqueles que já se foram, tanto no presente tempo como nos momentos históricos para os judeus, a exemplo do Holocausto (1933-1945) e os que atuaram na defesa do Estado de Israel.
Segundo a tradição religiosa, durante o dia, os judeus vão à sinagoga, que é o lugar onde eles prestam cultos e reverência a Deus. Lá, passam o dia inteiro buscando o perdão , entoando cânticos com toda a congregação. Ao final do dia, quando surgir a primeira estrela no céu, na segunda-feira, eles fazem apelos por perdão de pecados e que Deus escreva o nome deles no livro da vida, quando é feita a oração de encerramento. Quando se ouve o toque do Shofar, feito do chifre de carneiro, significa que a oração foi levada a Deus. Esse sonido é um chamado à mudança, ao encontro de novos caminhos.
Como sugere a data, os judeus buscam o arrependimento sincero pelas faltas cometidas e também devem pedir perdão a qualquer semelhante com o qual não tenham agido bem. A pessoa a quem se pede o perdão deve estar com o espírito preparado para aceitá-lo plenamente, sem ressentimentos.
Por fim, ainda segundo a tradição judaica, cada um deve buscar melhorar como ser humano, aperfeiçoar a conduta e procurar contribuir na melhora do mundo em que vive. Vale salientar que essa prática é repetida por judeus do mundo inteiro.
Em hebraico, essa data recebe o nome de Shabat HaShabatot, ou Sábado dos Sábados, em português, que representa o sétimo dia da semana, considerado sagrado.
História do Dia do Perdão
A tradição religiosa relata que Deus julgou a humanidade, em Rosh Hashaná, que é o Ano Novo Judaico, e registrou a sentença do povo no Livro da Vida, mas ofereceu um período de dez dias para que os pecadores se arrependessem dos delitos e concupiscências, que é o pecado planejado.
Calendário
O primeiro mês do calendário Judaico é o Tishrei, que fica entre setembro e outubro no calendário gregoriano (que usamos, habitualmente). Neste ano, foi em 15 de setembro. O décimo dia do ano judaico é exatamente o Dia do Perdão, que tipifica o fechar do Livro da Vida. Daí, ainda segundo a liturgia, Deus vai definir quem vai viver mais um ano e quem não vai.
A data não se repete no mesmo dia todos os anos. O professor de Cultura e de História Judaica do Colégio Israelita Moysés Chvarts, Jáder Tachlitsky, que também é coordenador de comunicação da Federação Israelita de Pernambuco, conta a diferença.
“O calendário judaico é lunissolar [baseado nas fases da lua], ou seja, se tem 12 meses que variam entre 29 e 30 dias, ao final de cada ano fica uma diferença de cerca de 12 dias. O ano judaico é mais curto, então todo ano dá uma diferença no calendário, o que é ajustado a cada três anos com 13º mês, que é acrescido nesse calendário. É uma matemática bem interessante que foi criada há milênios. Só que por conta disso, todo ano muda. A data vai ficando mais para frente, se distanciando, depois volta para atrás, mas [quase] nunca se repete”, explica.
Ainda segundo o professor, os intuitos do povo judeu em manter o compromisso com o propósito dessa data são a construção de um mundo cada vez melhor, livre do pecado e de uma sociedade mais justa.
"É preciso ter a compreensão da necessidade do respeito a todas as pessoas, independente de credo ou origem. Esses dias intensos, culminados no Yom Kipur, são o momento do exercício do aperfeiçoamento individual, através da reflexão, do arrependimento, do pedido de perdão e da prática de boas ações", complementa.
Marcelo Kozmhinsky, que já foi diretor do Colégio Israelita, segue a prática pela tradição da sua família que é judaica. Aos 60 anos, ele afirma que faz o jejum para perdão dos pecados e passa o dia na sinagoga, chegando às 9h e saindo às 16h. Por conta do calor, Marcelo confessa que é difícil fazer o sacrifício, mas se sente bem ao se conectar com o judaísmo.
"Eu me conecto com o meu judaísmo, com os meus antepassados e com o Israel, que é o País da promessa de Abraão e que se tornou uma potência nas áreas tecnológica e agrícola. É um orgulho ser judeu, fazer parte desse povo e poder compartilhar e vivenciar essas tradições", afirma.
O nível da conexão com Deus oferece a Marcelo tal refrigério espiritual que, em entrevista à reportagem, ele assegura de que sente a necessidade de fazer com que o dia seja especial dentro dele para que suas atitudes melhorem a natureza.
"Quando cometemos algum pecado, falhamos, porque é da natureza humana. Mas essa natureza pode melhorar. No judaísmo se acredita muito na capacidade de fazer de se fazer um balanço sobre as nossas ações. Eu acho que a gente vive um mundo muito conturbado em valores, crenças e pensamentos", complementa.
Ao terminar o jejum, Marcelo confessa que fica com o corpo fraco, afinal, não é uma tarefa fácil se abster de alimentos e bebidas por 25 horas. Mas ele acredita que vale o sacrifício.
"Vai vir mais um ano pela frente que a gente vai poder ser melhor consigo mesmo e com o outro. Para mim é muito importante vivenciar isso em família".
Judaísmo presente no Recife
Em Pernambuco, a Sinagoga Kahal Zur Israel é a primeira das Américas. Ela é o local ideal para quem buscar conhecer mais sobre as origens judaicas e a história da comunidade no Estado. Atualmente, o templo da Rua do Bom Jesus não funciona exclusivamente para práticas religiosas, pois foi restaurado em 2001 por um projeto que recriou as características originais da construção erguida no século 17 e tornou o local em museu, com fotos, pinturas e mapas.
O prédio que abrigou a Congregação Rochedo de Israel, tradução do nome original, tem dois andares que contêm a história dos judeus que participaram dessa construção. Também fazem parte da estrutura: o Memorial Judaico, Poço original do século XVII e o MIKVE, uma estrutura de piscina usada em rituais de purificação.
No segundo andar, o destaque é para a sala de culto, onde se encontram itens como a Torá, que abriga os cinco primeiros livros da Bíblia, chamados de Pentateucos (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio), que contam desde a criação do mundo até a entrada do povo judeu em Israel.
O local recebe visitantes do mundo inteiro para uma verdadeira imersão no mundo judaico. Rosana Rosenbaum é gestora da sinagoga e secretária da Federação Israelita de Pernambuco. Ela conta como funcionam as visitações.
"A gente recebe muitas pessoas aqui que vêm conhecer um pouco desse universo sagrado. A sinagoga está aberta de terça a sexta, das 9h às 17h, e nos domingos das 14h às 18h. Os ingressos custam R$ 20, a meia para professores, alunos e pessoas acima dos 60 anos, e R$ 40 a inteira. Crianças não pagam", explicou.
Excepcionalmente, no domingo (24), o local vai ter horário excepcional, por conta do You Kipur, funcionando das 13 às 16h. O local é acessível para cadeirantes, cegos, surdos e mudos.