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Chile quer impor limites a "narcofunerais", que têm caravanas de carros e salva de tiros

Gabriel Boric vai enviar projeto de lei ao Congresso para restringir numero de participantes e tempo destinado a homenagens de facções a traficantes e assassinos

O presidente do Chile, Gabriel Boric - Presidência do Chile/Reprodução

O presidente chileno, Gabriel Boric, assinou um projeto de lei nesta quarta-feira que será enviado ao Congresso para limitar o tempo e o lugar onde se realizam funerais de alto risco, conhecidos no país como “narcofunerais”. A prática que vem aumentando no Chile pode envolver longos cortejos nas ruas do bairro onde vivia o traficante morto, que podem durar até 3 dias, e também no interior dos cemitérios, quando os comparsas da facção criminosa costumam disparar para o alto, lançar fogos de artifício e detonar bombas que aterrorizam as pessoas próximas.

Autoridades calculam que mais de 1.700 funerais em homenagem a traficantes e assassino ocorreram nos últimos 4 anos. É costume também protagonizarem caravanas de carros que interrompem o trânsito.

O projeto de lei do Executivo, com abordagem semelhante a de outras quatro iniciativas apresentadas anteriormente por parlamentares de todos as vertentes políticas, propõe que os funerais durem no máximo 24 horas e que a cerimônia se realize apenas nas instalações do cemitério ou crematório a fim de “reduzir o espaço de ação das organizações criminais que realizam o funeral e assim resguardar a tranquilidade e a segurança no espaço público”. Além disso, restringe a quantidade de pessoas presentes.

— Não é aceitável que uma cerimônia fúnebre se traduza em tiros, fogos de artifício e desordens ou incivilidades. Por maior que seja a tristeza legítima que causa a perda de um ente querido, não é aceitável que um funeral paralise um bairro inteiro, suspenda aulas, feche ruas ao trânsito de veículos ou de pessoas — disse Boric, durante a apresentação do projeto no Palácio de La Moneda.

O presidente chileno disse ainda que não vão “naturalizar a cultura do narcotráfico” nem permitir que “se insira” na vida cotidiana.

Em março, 15 colégios e estabelecimentos universitários da região de Valparaíso, a 120 km de Santiago, tiveram que suspender as aulas por causa de um desses funerais. Na ocasião, uma caravana de carros percorreu várias regiões de Valparaíso para a despedida de um bandido conhecido como Ñaju, que morreu baleado diante de uma escola. Ele estava dentro de um carro estacionado quando três pessoas se aproximaram em um outro veículo e dispararam ao menos 20 vezes.

"Narcocultura"
Esse tipo de cortejo também obriga a polícia a fazer escolta, e, mesmo assim, tiros são disparados para o alto. O projeto propõe que os delegados responsáveis por cada região sejam encarregados de avaliar quando se trata deste tipo de funeral com base em um informe dos Carabineros que determinará o nível de risco do enterro seguindo três variáveis: os antecedentes criminais do morto, a relação que tinha com facções criminosas e a quantidade de parentes diretos com histórico criminal.

O governo convidou nove prefeitos da região metropolitana de Santiago para participar da apresentação do projeto, entre eles Claudia Pizarro, de La Pintana e Rodolfo Carter, de La Florida. Os dois sofreram ameaças e estão sobre proteção policial. Pizzaro foi a primeira autoridade de uma comuna chilena a denunciar o que chama de “narcocultura”. Carter demoliu uma série de casas de traficantes este ano.

Desde junho, o governo chileno também retirou uma série dos chamados “narcomausoléus”, monumentos construídos por parentes, comparsas ou organizações criminosas em homenagem a bandidos mortos. Até agora, já foram destruídas 8 construções como estas em 8 municípios.

O Chile vive uma crise de segurança que se traduziu em aumento do número de homicídios, principalmente pelo uso de armas de fogo. Segundo dados do Ministério Público, foram 6,7 vítimas de homicídio a cada 100 mil habitantes em 2022, um aumento de 46% em relação à 2021.