SAÚDE

Heroína, cocaína e mais: primeira "sala de consumo de drogas" é aprovada na Escócia; entenda

Clínica permitirá que viciados usem substâncias pesadas; projeto tem supervisão de profissionais de saúde treinados e aborda assunto como emergência de saúde pública

Nicola Sturgeon renunciou como primeira-ministra - ANDY BUCHANAN / AFP

A primeira sala oficial de “consumo de drogas” do Reino Unido foi aprovada pelas autoridades nesta quarta-feira. Em Glasgow, na Escócia, uma clínica permitirá que viciados consumam substâncias pesadas, incluindo heroína e cocaína. O projeto é piloto e contará com a supervisão de profissionais de saúde treinados.

Proposto pela primeira vez em 2016 após um surto de HIV na cidade, a criação de salas de consumo de drogas foi alvo de disputas políticas entre os governos escocês e britânico nos últimos anos. Embora o governo do Reino Unido tenha discordado, ele afirmou que não irá intervir na instalação, que possui investimento avaliado em R$ 13,9 milhões.

Taxa de mortalidade
A Escócia possui a pior taxa de mortalidade por uso de drogas na Europa. Em 2022, o país contabilizou 1.051 óbitos. No ano anterior, foram 1.330. No início do mês, a Lord Advocate Dorothy Bain KC, principal oficial de Justiça do país, anunciou que não seria “do interesse público” processar pessoas que usarem a instalação. A fala teria dado “luz verde” ao projeto.

Antes de Nicola Sturgeon renunciar como primeira-ministra, ela admitiu que seu governo havia “perdido o foco” em relação às mortes por drogas na Escócia. Em reunião de comitês do Parlamento nesta terça-feira, Kirsten Horsburgh, diretora-executiva do Scottish Drugs Forum, disse que a avaliação do sucesso da iniciativa em Glasgow não deve atrasar a abertura de mais instalações em outras partes do país.

— Recebemos muito bem esta notícia. [Mas] é importante que, ao introduzirmos essas instalações, tenhamos vários tipos diferentes — afirmou. — Portanto, poderíamos ter unidades móveis, fixas, apenas uma sala dentro de uma área que já fornece instalações de trocas de agulhas. Espero que outras áreas não sejam atrasadas pela introdução desta.
 

'Desmistificar o estigma'
A instalação ficará localizada no mesmo prédio de uma instalação de tratamento de drogas. Saket Priyadarshi, médico que vai ajudar a administrar o local, disse que não se sentiria “nervoso” com pacientes sofrendo overdose sob sua supervisão. Ao “Telegraph”, ele pontuou que “é preferível que isso aconteça na proximidade de pessoal treinado”.

Alguns membros do Parlamento Escocês, por outro lado, expressaram preocupações sobre o impacto na área local, incluindo nos negócios. Ao comparecer perante o comitê, Tracey McFall, presidente do Scottish Recovery Consortium, enfatizou a necessidade de trabalhar com as comunidades locais na criação de serviços.

— Não podemos impor isso às comunidades. Precisamos levá-las conosco. Houve diversos exemplos ao longo dos anos em que foi estabelecido um serviço de reabilitação residencial e houve oposição local. Mas, em alguns desses serviços, a comunidade realmente se envolveu. É sobre desmistificar parte do estigma associado a esse trabalho — disse ela.

Emergência de saúde pública
McFall ainda acrescentou que, com base em sua experiência no desenvolvimento de serviços ao longo dos anos, “se a comunidade for incluída, ela entenderá”. Simon Rayner, líder de serviço do Aberdeen Alcohol and Drug Partnership, disse que é preciso garantir que os locais sejam adequadamente equipados para evitar “incidentes e comportamentos indesejados”.

Em 2021, a ex-ministra da Política sobre Drogas da Escócia descreveu a taxa de mortalidade do país como uma “emergência de saúde pública”. Embora o número de mortes relacionadas ao uso de drogas esteja no nível mais baixo desde 2017, o relatório do National Records of Scotland (NRS) deixou claro que a taxa de mortes ainda está “muito mais alta” do que era quando os dados começaram a ser registrados em 1996.