Partido de ex-premier pró-Rússia vence eleição e aproxima Eslováquia de corte na ajuda à Ucrânia
Admirador de Victor Orbán e de pautas de costumes da ultradireita, Robert Fico ainda precisa atrair aliados para ter a maioria no Parlamento necessária para governar
O Partido populista Smer-SD, do ex-premier pró-Rússia Robert Fico, venceu as eleições legislativas de sábado na Eslováquia, encaminhando o país para o que pode ser uma guinada à direita com consequências para além das fronteiras — atingindo a Ucrânia e toda a Europa. Com 99,43% dos votos apurados, a legenda conquistou 23,3% dos votos, à frente do Eslováquia Progressista, de centro, que teve 17%.
Admirador de Viktor Orbán e de pautas da ultradireita como a ataque a comunidade LGBTQIA+, Fico prometeu cortar a ajuda a Kiev e defendeu uma maior aproximação com a Rússia. Para analistas, a volta do ex-premier ao poder vai mudar radicalmente a política externa do país, que faz parte da Otan — a aliança militar ocidental encabeçada pelos EUA.
No entanto, nenhum dos partidos têm maioria sozinho para governar, e as negociações para formação de alianças prometem ser complexas e demoradas.
O Smer-SD deve conquistar 42 cadeiras das 150 do Parlamento eslovaco, onde a maioria é de 79 votos. A legenda deve buscar aliança com o Hlas, de centro-esquerda, comandado pelo ex-premier Peter Pelegrini. Na semana passada, ele disse que não havia definido para quem seria seu apoio, mas deixou escapar uma preferência inicial por Fico. A legenda conquistou 17 vagas parlamentares.
Pellegrini assumiu o governo em 2018, logo após a renúncia de Fico, em meio a protestos nacionais contra o assassinato de um jornalista crítico ao governo. O repórter Jan Kuciak e a noiva foram mortos, dias antes da publicação póstuma da reportagem em que ele denunciava ligações entre o governo e a máfia Italiana.
Os dois partidos se aliaram no passado ao nacionalista Partido Nacional Eslovaco (SNS), também contra a ajuda à Ucrânia, que deve atingir 10 cadeiras no Parlamento nesta eleição.
'Nem uma bala'
Fico, de 59 anos, comandou o país em dois períodos, de 2006 a 2010 e 2012 a 2018, quando renunciou. Nos últimos meses, vem sendo uma das principais vozes contra a maciça ajuda europeia à Ucrânia, e expressou posições pró-Rússia recentemente — em um discurso, disse que, caso fosse eleito, não mandaria “uma bala sequer” a Kiev. Ele também chamou as sanções aplicadas contra a Rússia de “inúteis”, e deixou clara suas visões sobre o Ocidente em um comício.
— A guerra sempre vem do Ocidente. E a liberdade e a paz sempre vêm do Leste — afirmou a apoiadores. Na mesma fala, reiterou a promessa de vetar a candidatura da Ucrânia para entrar na Otan. A Eslováquia integra a aliança militar, que é o principal pilar de apoio aos ucranianos desde o início da invasão russa.
A Eslováquia é uma das nações que mais contribuíram com as forças ucranianas desde o início da invasão russa, se for considerada a proporção da ajuda em relação ao tamanho da economia. O ministro da Defesa eslovaco, Martin Sklenar, visiou Kiev antes da votação, e o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, agradeceu o apoio eslovaco.
Posturas contra a guerra também estão sendo vistas em discursos eleitorais em outros países europeus, como a Polônia. Mas o que deixou analistas e políticos em alerta, além das falas de Fico, são as alianças que ele pretende formar caso retorne ao cargo. O ex-premier se diz um admirador do líder da Hungria, Viktor Orbán, e pode fortalecer posições contrárias às defendidas por Bruxelas, inclusive sobre a Ucrânia.
Fico também é um vocal opositor de políticas voltadas à população LGBTQIAP+ — o casamento entre pessoas do mesmo sexo não é previsto pela lei eslovaca, e o candidato chegou a dizer que relações do tipo são “uma perversão”.