Cinco vítimas de incêndio em famosa boate da Espanha são identificadas
Treze pessoas morreram depois que o fogo atingiu o complexo de discotecas de Múrcia; local era construído com material sintético, papel nas paredes, carpetes e madeira
As autoridades de Múrcia, na Espanha, afirmaram que foram identificadas cinco das 13 vítimas do incêndio num complexo de boates do país, na madrugada de domingo. Representante do governo local, Francisco Jiménez revelou que, das 15 pessoas que eram procuradas após o incidente, duas foram localizadas com vida. Não há mais desaparecidos. Entre as vítimas, há cidadãos de quatro nacionalidades: Colômbia, Nicarágua, Equador e Espanha. Algumas têm dupla nacionalidade espanhola e equatoriana.
O estado dos restos mortais, seriamente danificados pelo incêndio, dificulta a identificação das vítimas. Fontes do Superior Tribunal de Justiça de Múrcia indicaram ao "El País" que a operação composta por juízes e médicos forenses permanecerá em alerta enquanto prossegue o trabalho de remoção de escombros e segurança dos imóveis afetados. Isso, até que se permita uma completa inspeção ocular técnico-policial de toda a superfície danificada.
Conforme explicou o diretor do Instituto de Medicina Legal e Ciências Forenses (IMLCF), Juan Pedro Hernández del Rincón, foram obtidas amostras para realizar análises de DNA no Instituto Nacional de Toxicologia e Ciências Forenses. Uma equipe médica forense também se deslocou à sede da polícia para obter amostras biológicas de parentes diretos e das vítimas (neste caso, amostras colhidas antes da morte). Psicólogos estão encarregados de cuidar dos familiares e amigos das vítimas.
A entrega dos restos mortais das vítimas a familiares ou pessoas próximas será realizada após autorização da autoridade judiciária, uma vez recebido no tribunal o relatório preliminar da autópsia e feita a identificação de todos os corpos.
Fontes de investigação pregam cautela sobre as causas que originaram o incêndio. Apesar disso, o delegado do governo local, Francisco Jiménez, afirmou que as chamas se espalharam rapidamente porque avançaram pelos dutos de ar condicionado.
Espaço era "labirinto", diz cliente
O primeiro andar da discoteca La Fonda, em Múrcia, tornou-se, na manhã de domingo, uma armadilha mortal após um incêndio do qual pelo menos 13 pessoas não conseguiram escapar. É o piso onde ficam as áreas reservadas para os clientes, por exemplo, que fazem alguma comemoração no estabelecimento. São espaços supostamente privilegiados, em altura, com vista para a zona central do salão. Porém, o acesso e a saída não eram fáceis. E menos ainda entre chamas.
Uma jovem que frequenta o estabelecimento descreveu a área no domingo como “um labirinto”.
— Tem uma escada, mas depois é preciso passar por um corredor para chegar aos estandes — disse ela.
Esta foi uma referência ao fato de estes espaços fechados terem sido concebidos em estilo de camarote de teatro, com acesso e saída por um corredor posterior que percorria todo o piso, em forma de ferradura.
— Só havia uma escada — disse a jovem às portas do Palácio Desportivo de Múrcia, onde familiares e amigos dos desaparecidos se reuniam para receber ajuda psicológica.
Pelo menos 13 pessoas morreram no incêndio, embora não esteja descartado que haja mais mortos. Duas pessoas ainda têm paradeiro desconhecido. Outras três pessoas consideradas desaparecidas foram encontradas em boas condições de saúde.
Boate tinha ordem para fechar
A discoteca de Múrcia tinha ordem de fechamento há um ano, informaram nesta segunda-feira as autoridades da cidade do sudeste de Espanha.
Antonio Navarro, responsável pelo Urbanismo da cidade, informou que em junho de 2019 a empresa proprietária informou à Câmara Municipal de Múrcia ter dividido as instalações em duas: Teatre e Fonda Milagros. Esta alteração não foi aceita pela Câmara Municipal, que exigia, para tanto, uma nova licença. Em janeiro de 2022, foi emitida uma ordem de fim das atividades no local. A empresa recorreu desta decisão sem sucesso e há um ano, em outubro de 2022, foi emitida a ordem de execução do encerramento.
Nem o atual vereador nem o anterior responsável, Andrés Guerrero, souberam responder por que não foi realizada nenhuma fiscalização para o cumprimento da ordem. O único processo que existe na Câmara Municipal após a adoção desta decisão é um projeto de legalização que não foi concluído. As instalações continuaram abertas, sem autorização.
Tanto Navarro como Guerrero negaram qualquer responsabilidade e transferiram-na para a empresa, por não cumprir a ordem de encerramento das atividades, e para os serviços de fiscalização, também municipais, que tinham obrigação de checar o cumprimento da ordem.
Local tinha materiais inflamáveis
Entrar na Fonda Milagros transportava o cliente para quase todos os países da América Latina. Decorações simulando folhas de palmeira, vegetação, ainda que de plástico, e "vallenatos, cumbias e rancheras" como trilha sonora. Era um local frequentado, sobretudo, pela comunidade latina de Múrcia, mas entre os seus clientes também havia espanhóis. Muito material sintético, papel nas paredes, carpetes, madeira: tudo que nos fazia viajar para aquele ambiente caribenho virou combustível.
As equipas de resgate continuam a revistar os destroços, disse a polícia.
Até ao momento não se sabe a origem do incêndio que atingiu as discotecas Teatre, Golden e La Fonda. A porta-voz da boate Teatre, María Dolores Abellán, explicou aos meios de comunicação que o fogo começou na boate La Fonda, local que conta com pista de dança e restaurante, e não no Teatre, como inicialmente noticiado.
O incêndio teria se espalhado de La Fonda para os dois locais anexos da festa. A direção da discoteca Teatre, onde se celebravam vários aniversários neste sábado, garantiu aos jornalistas que as suas instalações foram evacuadas devido ao incêndio e que todas mortes ocorreram em La Fonda. A Polícia Nacional confirmou esta informação ao "El País". As chamas se espalharam pelas casas noturnas da área comercial e de lazer conhecida como Las Atalayas.
Três das cinco pessoas dadas como desaparecidas foram encontradas sãs e salvas na manhã de segunda-feira, segundo o prefeito de Múrcia, José Ballesta. “As famílias deles pensaram que eles poderiam ter estado no clube, mas descobriu-se que não”, disse ele à rádio Onda Cero, acrescentando que dois deles passaram o fim de semana fora da cidade.
Até às 7h30 de segunda-feira (horário local), disse Ballesta, nenhum outro corpo havia sido encontrado. Mas a polícia disse temer que o número de mortos pelo incêndio ainda possa aumentar.
“Podemos confirmar a triste notícia de que 13 pessoas morreram – três das quais já foram identificadas”, disse um porta-voz da Polícia Nacional à emissora estatal RTVE na manhã de segunda-feira.
“Quando se trata do número de pessoas desaparecidas, optamos pela cautela. Não descartamos que possa haver mais pessoas mortas lá dentro. Ainda não conseguimos entrar no interior do clube… O estado em que se encontram as instalações está a dificultar as coisas tanto aos bombeiros como à polícia.”
A causa do incêndio está sob investigação.
O prefeito e o presidente regional, Fernando López Miras, decretaram três dias de luto oficial após o ocorrido. Além das vítimas que morreram, ao menos outras quatro pessoas, duas mulheres de 22 e 25 anos e dois homens de 41 e 45 anos, receberam tratamento por terem inalado fumaça. As primeiras imagens da região mostram vários jovens nas ruas próximas às discotecas, das quais saía fumaça preta. A maioria das pessoas que estavam no estabelecimento conseguiu abandonar o local por própria conta.
"Mamãe, eu a amo"
“Mamãe, eu a amo, vamos morrer”, disse uma jovem em mensagem de áudio transmitida por um homem que se identificou como Jairo e se apresentou como pai de uma das vítimas. Segundo o homem, a jovem deixou a mensagem de voz às 6h06, na qual se ouvia chorar. Ele não conseguia mais se comunicar com ela desde então.