Mudar a meta fiscal pode piorar a perspectiva para a nota de crédito do Brasil, alerta agência
Mercado acompanha debate sobe mudança da meta fiscal do governo, e economistas dizem que haverá efeito cascata sobe as projeções de 2025 e 2026
O mercado financeiro reage rápido: com a expectativa de mudança para pior da meta fiscal de 2024, economistas e investidores já começam a projetar os efeitos sobre os anos seguintes. A recuperação da imagem do país perante as agências de risco também ficará sob xeque. Em meados do ano, duas agências melhoraram a perspectiva da nota de crédito do governo brasileiro: Fitch e Austin Rating.
Na visão do economista-chefe da Austin, Alex Agostini, o risco de mudança da meta é um fato novo que será levado em consideração pelas agências. Isso pode colocar o Brasil mais distante da volta ao grau de investimento.
- É uma sinalização muito ruim alterar a regra no meio do jogo. Por ora, vamos manter nossas projeções, mas ainda vamos avaliar o cenário. Em julho, a Austin elevou a perspectiva sobre a nota do Brasil. Na medida em que não há o cumprimento, como também uma mudança na meta, é possível que haja mudança também sobre a perspectiva do rating do país. Pode piorar ainda mais, é um fato novo - afirmou.
A lógica, segundo economistas e investidores ouvidos pelo Globo, é que o presidente Lula não só desautorizou o arcabouço fiscal enviado pelo próprio governo, como também haverá um efeito cascata. Se a meta de 2024 será revista para um déficit, no lugar de resultado zero, o esforço para se atingir os números dos anos seguintes ficará ainda mais elevado.
- Se a meta de 2024 não fosse cumprida, o percentual dos gastos cairia de 70% da receita líquida para 50% (em relação ao ano anterior), ficando mais fácil cumprir as metas do ano seguinte. Agora, as despesas de 2025 ficam mais altas e, tudo mais constante, o resultado primário fica pior. Tem um efeito cascata para os outros anos - explicou Luis Otávio Leal, economista-chefe do G5 Partners.
Leal já trabalha com projeções de déficit de 0,90% para 2024, déficit de 0,50% para 2025 e déficit de 0,20% para 2026. O risco agora é os números ficarem piores.
- Ainda não refiz os cálculos, mas certamente haverá uma revisão para pior. Para a mesma receita, os gastos serão maiores, porque todos estavam trabalhando com a regra de que eles seriam 50% da receita (do ano anterior) e agora vão ser 70% (já que esse gatilho não será acionado).
O economista-chefe da MB Associados, diz que também já não considerava a possibilidade de o governo reajustar as contas públicas neste mandato.
- Acho que essa meta caminha pra ser revista todos os anos pra baixo. Mas o custo será cada vez maior porque para 2025 era pra ser superávit de 0,5%. Suponha que eles ajustem para baixo, um superávit menor, de 0,25%, por exemplo. Mesmo sendo positivo, vai passar a ideia de que o governo de partida foi muito mais ambicioso do que se conseguiria entregar, e isso ocorre pela fragilidade do arcabouço em si - afirmou.
Segundo ele, o governo Lula repete, em menor escala, erros cometidos pela ex-presidente Dilma e pelo próprio Lula em seu segundo mandato.
- Não bastam gatilhos (para conter despesas), precisaria ter uma visão de governo de que o gasto também precisa ser ajustado. É uma repetição em menor escala dos erros de Lula 2 e Dilma - afirmou.
Já o economista-chefe e sócio da Warren Rena, Felipe Salto, avalia que há precipitação do mercado. Ele entende que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está ganhando tempo para negociar internamente e que o quadro mais provável continua sendo de manutenção das metas fiscais.
- Estão colocando o carro na frente dos bois. Não houve alteração de meta. Aliás, ainda acho que o quadro mais provável é de manutenção do compromisso anual e, se necessário, lá na frente, aciona-se o conjunto de medidas previstas na LC 200, recém-aprovada. Haddad conseguiu ganhar tempo e está negociando, a meu ver, tanto que o próprio Presidente do Congresso emitiu nota numa boa direção - disse.