Estreia da TV no país e primeira novela diária: relembre curiosidades de Lolita Rodrigues
Atriz, apresentadora e cantora, que morreu no último domingo, foi precursora da televisão no Brasil ao lado de Lima Duarte, Lia de Aguiar, entre outros
Lolita Rodrigues dizia que nunca havia desejado a fama. A atriz, cantora e apresentadora — que morreu, aos 94 anos, no último domingo (5), em decorrência de uma pneunomia — custava a entender o tamanho do posto que a cristalizou como precursora da televisão no Brasil.
Vale lembrar: foi ela quem estrelou, em 1950, a transmissão de estreia da TV Tupi, primeiríssima emissora no país, entoando a música "Hino da TV brasileira". Coisa simples, casual, costumava ponderar a caçula de uma família de imigrantes espanhóis. Sim, a mulher de olhos verdes jamais se vangloriou do fato. Mas há curiosidades saborosíssimas (e valiosas) por trás desse importante capítulo da televisão.
A rigor, era para Hebe Camargo ter sido a tal "inauguradora" da TV no Brasil. Só que... Na véspera da aguardada data, ela alegou que estava doente e avisou que não poderia comparecer ao compromisso. Tudo mentira — Hebe quis acompanhar o namorado, o empresário Luis Ramos, em outro evento. Sobrou então para Lolita, que logo resgatou, em seu armário, o vestido que havia usado em sua formatura, na Escola Normal. "Não dava para eu ficar gastando dinheiro com roupas. O dinheiro, para mim, sempre foi curto", rememorou a atriz, na autobiografia publicada, em 2008, pela Coleção Aplauso.
Filha de uma empregada doméstica e um motorista de caminhões, a multi-artista — que viveu a infância no bairro do Marapé, em Santos (SP) — demonstrou e frisou, ao longo de suas nove décadas de vida, que era uma pessoa simples. Ela reforçava, sempre que podia, nunca ter convivido com glamour. Quando tudo ainda era mato na telinha — e TV era sinônimo de artesania —, o cenário era outro, ela explicava.
"Não havia estrelismo, nem essa coisa de artista que visa apenas se tornar rico e famoso. Hoje em dia, as pessoas só pensam em ganhar dinheiro. Mas quando começamos, o trabalho na TV não era bem remunerado. Não existia glamour, não existia figurinista, continuísta, cenógrafo. Todo mundo precisava fazer um pouco de tudo. A gente levava roupa, móvel e objetos de casa ou pegava coisas emprestadas dos amigos e da família", relatou ela, numa entrevista.
Primeira novela diária
A artista começou a sentir na pele o peso de aparecer em TVs de todo o Brasil — e ser conhecida (e reconhecida) em qualquer canto do país — depois de encarnar a vilã da novela "2.5499 Ocupado" (1963), primeira produção do tipo transmitida diariamente, de segunda-feira a sábado, para todo o território nacional. O folhetim da extinta TV Excelsior era protagonizado por Tarcísio Meira e Glória Menezes, e trazia no elenco nomes como Neusa Amaral, Lídia Costa e Célia Coutinho.
Apesar de a história ser hoje pouco lembrada ("Era uma novela muito chata", admitiu Tarcísio Meira, anos depois), "2.5499 Ocupado" expôs, sobretudo para o elenco, o quanto a telenovela seria elemento importante para o Brasil já nos anos 1960. Os atores se surpreendiam, naquele período, com o assédio do público nas ruas. Era um fato novo no país. E, em dimensão superlativa, ainda difícil de compreender.
"A novela estava no ar, e eu e Tarcísio fomos para Recife gravar um programa com a Lolita Rodrigues", contou Glória Menezes, em entrevista ao canal "Viva", ao relembrar uma situação que viveu nesse período. "Quando chegamos no aeroporto, invadiram o campo e quebraram a escadinha do avião. As pessoas puxavam meu cabelo, tiravam os botões da minha roupa, queriam guardar qualquer coisa, uma recordação daquele momento. A telenovela foi um divisor de águas para o ator brasileiro, que passou a ser conhecido no país inteiro", acrescentou ela.