Europa muda seu modelo para se manter na corrida espacial
Com os americanos, chineses e indianos na corrida para a Lua, as empresas emergentes em pleno auge e a previsão de que uma economia espacial dupla de tamanho até 2040
Diante da forte concorrência internacional, a Agência Espacial Europeia (ESA) quer mudar de modelo para manter o Velho Continente na corrida espacial, mesmo que isso implique em revisar suas regras históricas de funcionamento.
Com os americanos, chineses e indianos na corrida para a Lua, as empresas emergentes em pleno auge e a previsão de que uma economia espacial dupla de tamanho até 2040, sem esquecer da crise dos lançadores que os privados do acesso ao espaço, os europeus tiveram que reagir.
A ESA quer se posicionar como simples cliente e deixar de administrar diretamente alguns programas espaciais.
Ao fim das duras negociações em Sevilha, os 22 Estados-membros chegaram a um acordo que “marca um rito decisivo na história espacial europeia”, segundo o ministro francês da Economia, Bruno Le Maire.
O acordo estabelece o início de um novo modelo baseado na adoção pela Nasa, nos Estados Unidos, há vários anos.
Para os próximos programas de foguetes, a ESA colocará os fabricantes para competir entre si.
A ESA planeja alocar 150 milhões de euros (160 milhões de dólares ou 778 milhões de reais) no financiamento de fabricantes selecionados para desenvolver seus foguetes e, em seguida, comprará serviços de lançamento deles.
Os europeus aprenderam a lição após o Ariane 6. "Até Ariane 5, o lançador foi desenhado e desenvolvido por uma agência, e os fabricantes eram simplesmente subcontratados", explica uma fonte próxima ao assunto.
“É possível simplesmente comprar serviços de lançamentos dos fabricantes responsáveis pelo desenvolvimento. O problema com o Ariane 6 foi que se criou um modelo com o pior dos dois mundos”, acrescenta.
Como resultado, entre atrasos e sobrecustos, os Estados-membros da ESA viram-se obrigados em Sevilha a subsidiar a exploração do foguete com até 340 milhões de euros (363 milhões de dólares ou 1,76 biliões de reais) por ano para garantir a sua competição frente à gigante SpaceX.
Mas a SpaceX também está sendo “subsidiada em grande medida pelo governo americano”, que paga muito mais pelos voos que compram do que cobra dos clientes comerciais, segundo Philippe Baptiste, presidente do Cnes, a agência espacial francesa.
"Contribuição equitativa"
A origem da dificuldade da Europa vem da chamada regra do justo retorno geográfico. Ela estipula que o investimento de cada país deve se traduzir em benefícios equivalentes para suas empresas.
“A regra do retorno justo é criticada porque impede os fabricantes de elaborarem projetos mais eficazes”, explica à AFP Pierre Lionnet, diretor de pesquisa do Eurospace, que representa a indústria europeia.
Ao favorecer o surgimento de um ecossistema em todo o continente, “esse mecanismo permitiu à Europa criar uma das indústrias mais competitivas e inovadoras do mundo”, argumentou o diretor-geral da ESA, Joseph Aschbacher.
“Dito isso, temos uma nova situação com a comercialização (do espaço), por isso que a ESA está discutindo com os Estados-membros uma evolução do retorno geográfico”, concluiu.
Ao invés de simplesmente aboli-lo, Pierre Lionnet acredita que a ideia é passar para um sistema de "contribuição equitativa", que já está em vigor para alguns programas específicos da ESA.
Atualmente, cada país conhece anteriormente o rendimento industrial que obterá por sua contribuição financeira. Nesse caso, o investimento de cada Estado “será decidido a posteriori em função da montagem industrial proposta pelo projeto vencedor” da licitação, explica.
Um país que optou por participar de um programa da ESA “não saberá previamente quanto injetará, nem o nível ou a qualidade da participação de sua indústria”, acrescenta Lionnet.