PF vê ''relação criminosa'' entre ministro de Lula e empresário
Conversas analisadas pela Polícia Federal abrangem o período de 2017 a 2020
A Polícia Federal (PF) encontrou mensagens que indicam a existência do que classificou como "relação criminosa" entre o ministro das Comunicações do governo Lula (PT), Juscelino Filho (União-MA), e o empresário Eduardo José Barros Costa, conhecido como "Eduardo DP" ou "Imperador".
Eduardo é apontado como dono de uma empreiteira investigada por desvios na Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), comandada pelo Centrão. Segundo o jornal Folha de S.Paulo, nas conversas, Juscelino, que na época era deputado federal, teria indicado nomes e contas de pessoas onde a empresa faria pagamentos.
As mensagens analisadas pela PF abrangem o período de 2017 a 2020 e estavam no celular de Eduardo, citado pelos investigadores como sócio oculto da empresa Construservice. As informações constam em um relatório enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), no qual a Polícia Federal afirma que Juscelino integra uma "organização criminosa " com o empresário. O grupo seria responsável por um "suposto desvio ou apropriação e uso indevido de, no mínimo, R$ 835,8 mil".
Em uma as conversas, de 18 de janeiro de 2019, Juscelino passa ao interlocutor o nome de uma pessoa e indica o valor de R$ 9,4 mil. No dia seguinte, Costa responde com um recibo de depósito efetuado. O empresário ainda troca mensagens com seu irmão, responsável por sua movimentação financeira, explicando o pagamento.
"Isso é do Juscelino lá de Vitorino, o deputado, faz isso aí, que a terraplanagem daquela pavimentação quem fez foi ele, é pra descontar, viu?", diz Eduardo ao parente em uma mensagem de áudio.
Ainda de acordo com o relatório da PF, as mensagens reforçam a "atuação criminosa de Juscelino Filho". O documento frisa ainda que a função do hoje ministro na organização criminosa "era conhecida por todos os membros".
"Resta cristalina a relação criminosa pactuada entre Juscelino Filho e Eduardo DP", destaca outro trecho do relatório da PF.
Os investigadores apontam ainda Eduardo DP como o líder do esquema. O celular dele foi apreendido em julho de 2022, durante a primeira fase da operação Odoacro. Na ocasião, a PF chegou a prender temporariamente o empresário e apreendeu mais de R$ 1 milhão em dinheiro vivo, além de itens de luxo, como bolsas e relógios.
Segundo as investigações, os criminosos criavam empresas de fachada e simulavam competições durante as licitações, com o propósito de fazer com que a empresa vencedora fosse sempre a de Eduardo. Sem nunca ter firmado contratos com o governo federal antes de 2019, a Construservice participou de obras de pavimentação em seis estados por um valor que pode chegar a cerca de R$ 400 milhões, de acordo com o Portal da Transparência. O valor empenhado do governo para a empresa foi aumentando ano a ano: foram R$ 32 milhões em 2019; R$ 16 milhões em 2020; e R$ 92 milhões em 2021.
Em setembro deste ano, pessoas ligadas ao ministro das Comunicações também foram alvo da terceira fase da mesma operação, para investigar suspeitas de desvio de dinheiro público envolvendo uma emenda parlamentar de Juscelino, quando era deputado federal, repassada à Codevasf. Foram cumpridos 12 mandados de busca e apreensão nas cidades de São Luís (MA), Vitorino Freire (MA) e Bacabal (MA). As medidas foram autorizadas pelo ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Um dos alvos era a irmã de Juscelino Filho, prefeita de Vitorino Freire, Luanna Resende. Ela foi afastada do cargo, também por decisão do STF. Juscelino Filho, por sua vez, não foi alvo de mandados. À época, a PF ponderou que envolvimento de Juscelino foi ter apresentado as emendas, o que não é crime.
Em nota assinada por seus advogados, o ministro nega qualquer ilegalidade em sua relação com o empresário Eduardo DP e afirma que as mensagens do relatório são "sem origem e fidedignidade conhecidas". O texto chama ainda de "ilação absurda" as afirmações do documento da PF.
"Não há qualquer irregularidade nas obras, cujas emendas atendem a demandas da população, conforme já esclarecido às autoridades. Emendas parlamentares são um instrumento legítimo e democrático do Congresso Nacional e todas as ações de Juscelino Filho foram lícitas. São absurdas as ilações de que Juscelino tenha tido qualquer proveito pessoal com sua atividade parlamentar, sobretudo construídas a partir de supostas mensagens sem origem e fidedignidade conhecidas", diz o texto assinado por Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso, advogados de Juscelino.
Desde o governo passado, a Codevasf é comandada pelo Centrão. A estatal foi turbinada com verbas do antigo orçamento secreto, direcionadas para as bases eleitorais dos parlamentares.