Lula volta a relacionar Israel e terrorismo: Como ficam os laços entre os dois países?
Apesar da subida de tom do presidente, Itamaraty não acredita em uma mudança de posição da diplomacia do país em relação ao conflito no Oriente Médio
Apesar de o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter intensificado nos últimos dois dias os ataques às ações de Israel, o Planalto e o Itamaraty não acreditam em uma mudança de posição da diplomacia do país em relação ao conflito no Oriente Médio após a liberação dos brasileiros que estavam na Faixa de Gaza.
O grupo com 32 pessoas desembarcou na noite de segunda-feira, em Brasília, o que marcou também uma subida de tom de Lula, quando o presidente disse que “o Estado de Israel também está cometendo um ato de terrorismo”.
A avaliação é que o Brasil vai manter a linha de cobrar uma posição da comunidade internacional em relação ao que o governo classifica como atrocidades cometidas durante a reação de Israel. Integrantes do Ministério das Relações Exteriores definem a posição como “independente e crítica”.
Auxiliares do presidente dizem que, ao condenar os ataques de Israel, Lula busca conter a tragédia humanitária que está ocorrendo agora. São citados o cerco de tropas militares a hospitais, a morte de recém-nascidos e o fato de os moradores da Faixa de Gaza estarem sem acesso a água e energia.
Presidente critica ONU
A justificativa é que o tom do presidente subiu porque a situação piorou, a um ponto considerado intolerável. Membros do governo destacam que o país nunca deixou de condenar os ataques terroristas do Hamas em 7 de outubro, que deixaram cerca de 1.200 mortos em Israel. Lula recebe a todo momento informações sobre o conflito, inclusive com imagens. O presidente discute a situação no Oriente Médio diariamente com o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira.
A orientação do presidente agora é que o Brasil trabalhe pela construção de uma resolução no Conselho de Segurança da ONU com exigência de um cessar-fogo entre Israel e o Hamas.
Ontem, Lula afirmou que a “atitude” de Israel com mulheres e crianças é “igual a terrorismo”, em referência aos bombardeios à Faixa de Gaza, que já deixaram mais de 18 mil mortos, segundo o Ministério da Saúde local, controlado pelo Hamas. O presidente voltou a chamar os ataques do Hamas de terroristas, mas criticou a resposta militar de Israel.
— É por isso que eu disse ontem [segunda-feira] que a atitude de Israel em relação às crianças e às mulheres é igual ao terrorismo. Não tem como dizer outra coisa. Se eu sei que está cheio de criança naquele lugar, pode ter um monstro lá dentro que eu não posso matar as crianças porque eu quero matar os monstros. Eu tenho que matar o monstro sem matar as crianças. É simples assim — afirmou durante sua live semanal.
O presidente ainda disse ser inadmissível que não haja solução para o conflito no Oriente Médio. Também voltou a pedir a reforma do Conselho de Segurança.
— A ONU precisa mudar. A ONU de 1945 não vale mais nada em 2023. É por isso que a gente quer mudar a quantidade de pessoas e o funcionamento e acabar com o direito de veto — disse ele, evocando uma pauta antiga do Brasil por mudanças no Conselho.
Reação no Congresso
Em seguida, o presidente afirmou que a ONU deveria convocar “alguma coisa especial” porque o conflito no Oriente Médio “do jeito que vai, não tem fim”. O presidente afirmou ainda que parece que Israel quer “ocupar a Faixa de Gaza” e “expulsar” os palestinos, e que não é “correto e justo”.
— Nós temos que garantir a criação do Estado palestino para que eles possam viver em paz junto com o povo judeu — disse.
As falas do presidente reverberaram no Congresso e na comunidade judaica. O Senado aprovou ontem um requerimento do senador Jorge Seif (PL-SC) para realizar uma sessão de debate para discutir “a real situação enfrentada pelo Estado de Israel no momento atual na guerra contra o Hamas”.
O presidente do PP, senador Ciro Nogueira (PI), reclamou da fala de Lula. O partido de Nogueira indicou André Fufuca para ser ministro dos Esportes, mas o senador, que foi ministro da Casa Civil de Jair Bolsonaro, tem se classificado como oposição.
— O governo do PT compara Israel com o Hamas. É mais ou menos como comparar a polícia militar com uma facção criminosa, a polícia civil com os traficantes. É ignorar que o Estado combate dentro da lei e o terrorismo é um território sem lei. O presidente começou o governo candidato a Prêmio Nobel da Paz. Está se credenciando a ser Prêmio Nobel da Guerra, infelizmente. Toda vez que fala, defende o lado errado da História, da forma errada, contra os melhores interesses do Brasil — disse.
Na Câmara já há um convite aprovado desde o início do mês para que o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, preste esclarecimentos à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
Em outra frente, Fábio Wajngarten, advogado do ex-presidente Jair Bolsonaro e ex-chefe da Secretaria de Comunicação Social da Presidência, vai reunir em sua casa em São Paulo, no próximo dia 28, líderes evangélicos em um encontro para demonstrar insatisfação contra as falas do presidente. O pastor Silas Malafaia é quem está reunindo os participantes.
A StandWithUs Brasil, organização de apoio a Israel e combate ao antissemitismo, disse que as falas de Lula são “bastante graves”.
“O presidente brasileiro segue equiparando Israel, um Estado democrático a um grupo terrorista com intentos abertamente genocidas que massacrou cerca de 1.200 pessoas — dentre elas, três brasileiros — e sequestrou mais de 240 pessoas”, diz a instituição em nota.