ORIENTE MÉDIO

Ao menos 2,2 milhões de palestinos correm "risco imediato" de morrer de fome em Gaza

Isso significa toda população do enclave; região enfrenta escassez de combustível e quantidade de ajuda humanitária que entra esta aquém do recomendado

Palestinos em campo de refugiados em Gaza - Zain Jaafar/AFP

Ao menos 2,2 milhões de pessoas na Faixa de Gaza estão passando fome e correm risco de morrer por inanição — em outras palavras, toda população do enclave palestino. O alerta foi feito pelo Programa Mundial de Alimentos (PAM) da ONU nesta quinta-feira (16), que denunciou uma crise no abastecimento da cadeia alimentar da região devido à falta de combustível e à ajuda humanitária aquém da quantidade necessária.

Por um comunicado, o PAM alertou que a entrada de suplementos alimentares em Gaza corresponde a 10% do total necessário e a falta de combustível paralisa desde a entrega desses alimentos até o funcionamento de padarias. Com o inverno se aproximando, a crise, que já despontava com o alerta de falta d’água no início de outubro devido à falta de combustível para operar as usinas de dessalinização, deve se intensificar.

“O fornecimento de alimentos e água é praticamente inexistente em Gaza e apenas uma fração do que é necessário chega através das fronteiras. Com o inverno se aproximando rapidamente, os abrigos inseguros e superlotados, além da falta de água potável, os civis enfrentam a possibilidade imediata de morrer de fome”, disse a diretora-executiva do programa, Cindy McCain, no comunicado.

McCain disse que “a única esperança” seria abrir mais uma passagem para a entrada de ajuda humanitária, afirmando que “não há forma de satisfazer as necessidades atuais da fome com uma única passagem de fronteira operacional.”

Além de Rafah, único ponto de trânsito sob controle do Egito, Gaza tem apenas outras duas passagens para saída e entrada de pessoas e mercadorias: Erez, que fica ao norte e leva ao sul do território israelense, e foi atacada pelo Hamas na invasão do dia 7 de outubro; e Kerem Shalom, no sul de Gaza, na fronteira com Israel e perto do território egípcio, que serve apenas ao transporte de cargas.

O ponto de trânsito foi aberto no último dia 21 de outubro, após intensas tratativas. O acordo entre Egito, Israel e Estados Unidos, na época, parecia significar um alívio imediato à população do enclave, que enfrentava então um “cerco total” imposto por Israel como resposta ao ataque terrorista em seu território, que matou 1.200 pessoas e fez mais de 200 reféns. A prática frustrou as expectativas das organizações humanitárias. O número de comboios humanitários que passaram a entrar em Gaza — uma média de 40 por dia — estava muito aquém dos 100 recomendados pela ONU. Além disso, segundo a PAM, dos 1.129 caminhões que entraram, apenas 447 transportavam alimentos.

Combustível
Enquanto isso, combustíveis estavam, e assim segue, proibidos de entrar no enclave palestino. Israel teme que ele seja desviado para os terroristas do Hamas. Na última terça-feira, as Forças Armadas de Israel anunciaram, segundo o jornal The Times of Israel, que 24 mil litros entraram no enclave, mas apenas para abastecer os tanques dos caminhões de ajuda humanitária. O Estado judeu também diz que tentou enviar, no último domingo, 300 litros de combustível para o Hospital al-Shifa, o mais importante da região, mas alegou que a oferta foi recusada pelo Hamas.

Sem o produto, Gaza vive uma deterioração lenta, mas fatal. Dos 36 hospitais espalhados pelo enclave, 22 suspenderam as atividades, segundo a Agência da ONU para a Palestina (UNRWA), a entrega de ajuda humanitária e a circulação de ambulâncias ficam comprometidas, as usinas de dessalinização não funcionam e a produção de energia é impactada, o que reflete diretamente em estabelecimentos.

Todas as 130 padarias de Gaza fecharam as portas por falta de combustível, com a última fechando no início desta semana. O pão é um dos principais alimentos da dieta dos palestinos. Além disso, a infraestrutura alimentar no enclave já não funciona. Segundo a ONU, 25% das lojas contratadas pelo programa permanecem abertas, enquanto o estoque de outras já esgotaram.

“Sem acesso a combustível, a nossa capacidade para providenciar alimentos e o seu transporte para aqueles que precisam ficou gravemente comprometida, o que basicamente levou à paralisação da vida em Gaza. As pessoas estão passando fome”, afirmou o representante e diretor nacional da Palestina, Same AbdelJaber.

Além disso, os alimentos que restaram estão sendo vendidos a preços muito altos, o que “força alguns a sobreviver com até uma refeição por dia”. Para driblar a fome, muitos recorreram ao “consumo de cebolas e berinjelas cruas”.

“O colapso das cadeias de abastecimento alimentar é um ponto de viragem catastrófico numa situação já terrível, onde as pessoas foram privadas de necessidades básicas”, pontuou AbdelJaber.

No fim da nota, o programa da ONU voltou a defender a criação de corredores humanitários para a passagem de agentes e entrada de ajuda humanitária no enclave seguras. Mais de 11 mil palestinos já morreram em Gaza desde o início da guerra entre Israel e Hamas. Mais da metade são mulheres e crianças.