ELEIÇÕES

Força-tarefa de pesquisadores alerta combate à desinformação às vésperas de "maratona eleitoral"

Ano que vem terá 70 pleitos em 40 países, desde votações municipais, como aqui no Brasil, até a escolha de novos presidentes e Parlamentos

Urna eletrônica - Antonio Augusto/Ascom/TSE

Em meio à ascensão de líderes com viés populista e em um cenário de dificuldades para regular as plataformas digitais, a resposta à desinformação eleitoral precisa ser transnacional. Além disso, os países do sul global, em especial, devem aprender com as experiências uns dos outros para lidar com o problema.

É o que alerta uma espécie de "força-tarefa" de pesquisadores de universidades espalhadas pelo mundo e dedicados a pensar o combate às fake news que desembarca no Rio para um wokshop organizado pela PUC-Rio, em parceria com a Universidade de Massachusetts Amherst, nos EUA, que se inicia nesta segunda-feira.

O próximo ano será marcado por eleições. Serão mais de 70 pleitos em 40 países. São disputas nacionais, como as previstas nos Estados Unidos, Taiwan, Índia e África do Sul, e pleitos municipais, como os marcados no Brasil.

Para o professor da Universidade de Massachusetts Jonathan Corpus Ong, um dos organizadores do evento no Rio, autoridades e sociedade civil devem estar atentos a experiências passadas. A desinformação, diz Ong, não será resolvida se as plataformas, em geral localizadas no norte global, "clicarem em determinados botões".

" É uma abordagem que precisa ser de toda a sociedade. Uma das principais estratégias de líderes populistas é realmente compreender as ansiedades e medos das pessoas. Eles conhecem suas bases " diz o pesquisador filipino, que acompanhou de perto a eleição, no ano passado, em seu país de Ferdinand Marcos Jr., filho de um ditador que, de 1965 a 1986, foi responsável por assinaturas, torturas e prisões políticas.

Lideranças principalmente da extrema direita já operam globalmente conectadas, acrescenta o pesquisador brasileiro Marcelo Alves, da PUC-Rio, também organizador do encontro na universidade. Exemplos são as táticas digitais semelhantes utilizadas por Donald Trump, Jair Bolsonaro e o recém-eleito presidente argentino Javier Milei, e que incluem do intercâmbio de estrategistas de campanha ao apelo antissistema e ataques ao sistema eleitoral.

"Podemos ver as mesmas estratégias e técnicas de desinformação nos diferentes países" acrescenta Alves. Veremos as mesmas técnicas sendo aplicadas no próximo ano nos Estados Unidos por Donald Trump e elas vão se espalhar por todo o globo. Temos que ter também o oposto, alternativas para compreender o que podemos fazer e aprender uns com os outros.

Na eleição americana, Trump lidera a corrida presidencial, à frente do democrata Joe Biden, de acordo com as pesquisas eleitorais mais recentes. O também professor da PUC-Rio Arthur Ituassu alerta que as eleições argentinas mostraram que candidaturas políticas com viés populista, principalmente de direita, com forte relação com as mídias digitais, ainda têm forte apelo, sobretudo na América Latina e no sul global.

Uma tendência observada, no país latino-americano, foi o uso de plataformas novas ou recém-popularizadas, como o TikTok, e o impacto dessa campanha entre os mais jovens, que tendem a ter uma cultura democrática menos arraigada. O discurso antissistema e radical sobre temas como corrupção, segurança pública e desigualdade social também é outra frente que deve se repetir em pleitos futuros no sul global, em um contexto no qual a confiança na democracia enfrenta reveses.

" O político que tem sabido explorar isso pelas mídias digitais tem tido sucesso eleitoral, inclusive do ponto de vista dos parlamentos"  analisa Ituassu.  Há um descontentamento muito grande com a democracia na América Latina.

Uma um ponto de atenção, na visão dos pesquisadores, é como serão apropriadas as tecnologias de inteligência artificial pelas candidaturas em 2024. O ChatGPT e serviços para criação de imagens estão mais acessíveis que em disputas anteriores. Na Argentina, tanto a campanha de Milei quanto a de Sergio Massa lançaram mão de imagens geradas por IA.

Uma frente de atuação contra desinformação defendida pelos pesquisadores é pensar como formar essas coalizões para conter o avanço de estratégias de desinformação que colocam em risco as democracias pelo mundo. A avaliação é que elas precisam ser heterogêneas, e incluir instituições e organizações com diferentes perspectivas sobre o problema da desinformação eleitoral.

É o que o Brasil das eleições de 2022 tem de lição a outros países, defendem. Por aqui, não só se formou uma frente democrática de partidos políticos em oposição a Jair Bolsonaro (PL) como o próprio Tribunal Superior Eleitoral (TSE) se uniu a organizações da sociedade civil, pesquisadores e jornalistas para responder às tentativas do ex-presidente e de seus apoiadores de lançar dúvidas sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas e das eleições.