Quem Lula contrariou ao indicar Dino para vaga no STF
Ministros do STF e do governo já se posicionaram favoráveis à indicação de uma mulher para a Corte, que perde representatividade pela primeira vez na história
Anunciada nesta segunda-feira, a indicação do ministro da Justiça e da Segurança Pública, Flávio Dino, ao Supremo Tribunal Federal (STF) vinha gerando mal-estar entre vários grupos antes mesmo de o nome ser oficializado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Grupos progressistas, políticos e magistrados defendiam o nome de uma mulher para a vaga da ministra Rosa Weber, que se aposentou no final de setembro, como forma de manter a representatividade feminina na Corte.
Pouco antes de se aposentar, a ministra disse que a quantidade de mulheres no STF era "ínfima" em comparação com os espaços ocupados na base da magistratura. A declaração foi dada durante encontro com o presidente da Finlândia, Sauli Niinistö, em junho:
— Aqui no Brasil nós temos muitas mulheres na base da magistratura, na Justiça em primeiro grau, mas o número decresce no intermediário. Na cúpula, nos tribunais superiores, o número é ínfimo — afirmou a ministra.
Weber, que foi a terceira mulher a ser indicada na história da Corte, voltou a tecer críticas à falta de representatividade em agosto, poucos dias depois de o ministro Cristiano Zanin tomar posse no Supremo. A magistrada afirmou que o déficit de representatividade feminina nos espaços de poder representa "um déficit para a própria democracia brasileira".
Desde o começo das discussões, o entorno de Lula apontava três homens como favoritos para o cargo. Além de Dino, chegaram a ser cotados o advogado-geral da União, Jorge Messias, e o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas.
A pressão pela indicação de uma mulher ao STF foi endossada por outros colegas de Corte. Outra mulher a ocupar cadeira no colegiado, a ministra Cármen Lúcia defendeu que "passou muito da hora" e que "não há razão" para não ter uma mulher negra na Corte. Em entrevista à revista Marie Claire, a magistrada disse que o país tem juízas e desembargadoras negras "competentíssimas" que poderiam atuar para evitar cenário de "preconceito cortando vidas profissionais" e que poderiam trazer "um enorme benefício para a sociedade brasileira".
A defesa de uma mulher negra na composição do Supremo também foi defendida pelo ministro Edson Fachin, que em março acenou para uma vindoura indicação de mulher negra no colegiado. A declaração foi dada durante sessão em homenagem ao Dia Internacional da Mulher.
— Em especial, cumprimento as senhoras ministras na data de hoje. Ministra Rosa (Weber) e ministra Carmen (Lúcia), que aqui estão, e a ministra Ellen (Gracie), que aqui esteve. E peço licença para cumprimentar uma 4ª ministra, que, quem sabe, um lugar do futuro colocará nesse plenário. Uma mulher negra — afirmou.
Pressão de ministros e sociedade civil
A contrariedade a uma eventual nomeação de um homem também foi externada por integrantes da Esplanada dos Ministérios. Os ministros Anielle Franco, da Igualdade Racial, e Silvio Almeida, dos Direitos Humanos, também foram publicamente favoráveis a uma indicação com esse perfil, mas sem defender um nome.
— É fundamental que haja uma mulher negra no STF, uma pessoa negra para que a gente comece a discutir a democratização nos espaços de poder — disse Almeida após uma visita ao STF em março.
Na outra ponta, organizações da sociedade civil passaram meses articulando e divulgando manifestos em defesa de um nome feminino ou de uma mulher negra, para a vaga de Rosa Weber. Setores do movimento negro impulsionaram nomes de juristas, professoras, juízas e advogadas de currículos estrelados e notório saber jurídico, requisitos previstos pela Constituição.
Nos últimos meses, alavancaram o nome da promotora do Ministério Público da Bahia Lívia Sant’anna Vaz, que também recebeu apoio da organização Mipad (Most Influential People of African Descent), ligada à ONU, em carta aberta a Lula. Outros nomes defendidos foram o da advogada e professora Soraia Mendes, que figurou em listas tríplices divulgadas por movimentos e associações. Também foram lembradas a juíza federal Adriana Cruz, titular da 5ª Vara Criminal do Rio, e a magistrada do Tribunal de Justiça de São Paulo Flávia Martins de Carvalho, que hoje atua como juíza auxiliar do gabinete de Barroso.