Turquia diz que Israel sofrerá ''consequências'' após ameaças de caça ao Hamas no seu território
Declaração ocorre em meio à expansão das operações de Israel no Sul de Gaza, sinalizando um risco maior de desestabilização na região
Após Israel afirmar que iria caçar o Hamas "em todo o mundo", incluindo a Turquia, o governo turco alertou sobre "sérias consequências" caso isso realmente ocorra em seu território, disse um oficial da inteligência turca nesta segunda-feira (4), sinalizando um risco maior de desestabilização na região.
A declaração também ocorre em meio à expansão das operações do Exército de Israel no Sul da Faixa de Gaza após a trégua de uma semana, apesar da crescente pressão internacional para proteger a população civil no enclave palestino.
"Os avisos necessários foram feitos aos interlocutores com base nas notícias das declarações das autoridades israelenses, e foi expresso a Israel que (tal ato) teria consequências graves", disse o funcionário, falando sob condição de anonimato, acrescentando que tais movimentos unilaterais teriam repercussões nos laços bilaterais.
O comentário citado pela Reuters veio após gravações do chefe da Agência de Segurança israelense, o Shin Bet, virem à tona neste fim de semana, afirmando a determinação de matar líderes do grupo fundamentalista islâmico em todo o mundo, citando a Turquia nominalmente pela primeira vez desde o início do conflito.
"Na Faixa de Gaza, na Cisjordânia, no Líbano, na Turquia, no Catar, em todos os lugares", disse o chefe da agência israelense, Ronen Bar. "Levará alguns anos, mas estaremos lá para fazer isso", acrescentou.
Há três semanas, o porta-voz interino do Exército de Israel, Jonathan Conricus, já havia declarado que seria "apenas uma questão de tempo" para que os membros do Hamas fossem executados ou capturados "dentro e fora de Gaza", reiterando uma declaração feita pelo primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, em um discurso no dia 25 de outubro.
— A orientação é definitivamente matar ou capturar (...) todos os líderes do Hamas. Já dissemos abertamente. Todos eles estão condenados à morte. E é apenas uma questão de tempo, dentro e fora de Gaza, até que eles sejam capturados ou mortos por Israel — afirmou Conricus na entrevista citada pelo jornal britânico The Guardian.
A Turquia, que defende uma solução de dois Estados para o conflito de décadas, condena a campanha israelense em resposta aos ataques do Hamas em 7 de outubro, que resultaram em mais de 15.500 mortes, segundo o Ministério da Saúde de Gaza.
Em comentário nesta segunda-feira, o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdgogan, voltou a dizer que Netanyahu será julgado como "criminoso de guerra" devido à ofensiva no enclave palestino, e criticou fortemente os países ocidentais que apoiam Israel. Em outra ocasião, na semana passada, chamou Netanyahu de "açougueiro de Gaza" e o acusou de instigar o antissemitismo no mundo.
— Netanyahu já escreveu seu nome na História como o açougueiro de Gaza — disse Erdogan em um discurso aos parlamentares de seu partido. — Netanyahu está colocando em perigo a segurança do povo israelense, assim como de todos os judeus do mundo, ao incitar o antissemitismo com os assassinatos que cometeu em Gaza.
O presidente turco também já chamou Israel diversas vezes de "Estado terrorista" e afirmou que o Hamas é um "grupo de libertadores que protegem sua terra".
A Turquia tem papel-chave em esforços de mediação que envolvam o Hamas. O país, que é integrante da Otan — a aliança militar ocidental encabeçada pelos EUA — recebe altos integrantes do grupo palestino que controla Gaza e não o classifica como terrorista, como já faziam Israel e as potências ocidentais mesmo antes dos ataques terroristas de 7 de outubro.
Ataques no Sul
Israel e os EUA compartilham o objetivo de desmantelar o Hamas, com ênfase em uma operação abrangente no Sul da Faixa de Gaza. Washington apoia Israel, mas enfatiza a necessidade de zonas seguras para limitar as baixas de civis. Enquanto isso, muitas nações alertam Israel contra o uso de força avassaladora no Sul do enclave palestino, especialmente diante do deslocamento de 1,8 milhão de pessoas, segundo a ONU.
Esta fase do conflito ganhou força após o fim, na sexta-feira, de um cessar-fogo de uma semana para libertar alguns reféns israelenses — mediado pelo Catar, Egito e EUA — em troca de prisioneiros palestinos em Israel. Também segue as advertências de Washington sobre as mortes em Gaza desde o início dos combates em Outubro, com o secretário da Defesa dos EUA, Lloyd Austin, alertando para uma potencial "derrota estratégica".
Neste domingo, a região foi atingida por ataques aéreos durante a noite, quando os militares de Israel afirmaram ter atacado cerca de 200 alvos, incluindo depósitos de armas utilizados pelo Hamas. Os ataques ocorreram horas depois das Forças de Israel terem instado aqueles que fugiram para o Sul a deixarem a região mais uma vez.
A ofensiva vai "de casa em casa, de túnel em túnel", disse o porta-voz das Forças Armadas, Daniel Hagari, afirmando que os alvos são baseados em "informações precisas". Ele, entretanto, não fez nenhuma referência às advertências de Washington sobre reduzir as mortes de civis em Gaza e que a destruição vista no Norte "não deveria ser repetida no esforço para erradicar o grupo" no Sul do enclave, controlado pelo Hamas desde 2007.