"Não sou comentarista de falas do presidente", diz Fávaro sobre críticas de Lula a ruralistas

Lula comparou parlamentares ligados ao setor do agronegócio à "raposa cuidando do galinheiro"

Ministro da Agricultura, Carlos Fávaro - Rafa Neddemeyer/Agência Brasil

O ministro Carlos Fávaro (Agricultura, Pecuária e Abastecimento) afirmou, nesta quarta-feira (6), que não é "comentarista de fala do presidente" ao ser questionado sobre a recente declaração em que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva comparou parlamentares ligados ao setor do agronegócio à "raposa cuidando do galinheiro".

A fala de Lula voltou a acirrar a tensão com a bancada ruralista e dificultar o ambiente no Congresso Nacional em uma semana importante para o governo.

— Não sou comentarista de fala do presidente — afirmou o ministro após a Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvido Rural ao ser questionado pelo GLOBO.

Como mostrou o Globo, na avaliação de parlamentares, a declaração de Lula evidenciou que, apesar de gestos de aproximação, como o apoio do governo ao projeto que facilita o uso de agrotóxicos no país, chamado de PL do Veneno por ambientalistas, a relação do Executivo com representantes do agronegócio no Congresso continua tumultuada.

A comparação foi feita por Lula durante discurso na Cúpula do Clima (COP-28), em Dubai. Ele usou o termo pejorativo ao comentar a apreciação do marco temporal das terras indígenas pelo Congresso. O presidente vetou a maior parte do projeto, aprovado em setembro pelo Senado, mas já dá como certa a derrubada da sua decisão pelo Congresso.

A reação da bancada ruralista veio um dia depois, no domingo, com uma nota dura na qual acusa o petista de “criminalização da produção rural no Brasil”. “Lula sinaliza para a criminalização da produção rural no Brasil, para a fragilização de direitos constitucionais, em busca de perpetuação no poder e de uma democracia fraca, dependente e corrupta, incapaz de debater seriamente um tema que impacta milhares de famílias brasileiras, expulsas de suas casas em razão de laudos técnicos e ideológicos”, diz o comunicado.

O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, é quem tem feito a ponte do governo com os ruralistas e já expôs sua divergência com o presidente em relação ao marco temporal. Senador licenciado, Fávaro ainda avalia se irá reassumir o mandato para votar pela derrubada do veto de Lula. Questionado pelo GLOBO se já havia uma decisão, o ministro não respondeu.

A tensão corre o risco de se alastrar para outras pautas caras ao governo, como os vetos de Lula a trechos do projeto do arcabouço fiscal e do que trata do voto de qualidade do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf). A manutenção desses dois pontos é vista como crucial para a saúde das contas públicas nos planos do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Segundo líderes da base, a declaração de Lula atrapalhou até mesmo uma tentativa de evitar uma derruba completa do veto ao projeto do marco temporal. Aliados negociavam que o Congresso revertesse apenas os chamados “penduricalhos”, itens considerados estranhos ao texto, como o que flexibilização do contato com povos isolados.

Além da repercussão negativa da fala de Lula, integrantes do Ministério da Agricultura se ressentiram pelo fato de o governo ainda não ter editado o decreto que cria o programa de recuperação de pastagens degradadas, previsto para ser um dos destaques da participação brasileira na COP 28. O texto, em análise na Casa Civil, não ficou pronto a tempo de ser apresentado no evento, mas foi publicado no Diário Oficial da União nesta quarta-feira.

— É a intensificação da nossa agropecuária, são, cálculos estimados pela Imbrapa e Banco do Brasil, 40 milhões de hectares muito propícios a conversão para agricultura, para a própria pastagem de alta qualidade, e ha interesse mundial nesse programa, nós vamos conseguir chegar nisso gerando oportunidade de renda, geração de emprego aos nosso produtores. Vários países do mundo, fundos de investidores já se manifestaram, alguns já em execução, trazendo recurso para cá para intensificarmos a nossa agropecuária — comemorou Fávaro na Comissão.