Argentina: Milei deve apresentar pacote econômico hoje. Veja o que o mercado espera
Operações com taxa oficial de câmbio exigirão autorização prévia do Banco Central. Importadores são diretamente afetados
O esperado anúncio de um pacote de ajuste fiscal pelo governo argentino não se confirmou no primeiro dia de trabalho do novo presidente da Argentina, Javier Milei, frustrando analistas de mercado.
Tudo indica que as medidas para conter a crise econômica do país, que envolve inflação de três dígitos e forte desvalorização cambial, devem ser reveladas hoje pelo recém-empossado ministro da Economia, Luis Caputo.
A principal expectativa de economistas e analistas de mercado é sobre como Milei pretende concretizar a ideia de promover um forte ajuste nas contas públicas argentinas como forma de deter a inflação. Ele prometeu um ajuste fiscal da ordem de 5% do Produto Interno Bruto (PIB) do país, o que é considerado por economistas muito forte. A expectativa é que essa medida acentue a recessão argentina.
Até agora, a única medida econômica anunciada tem relação com o câmbio: quem quiser comprar o dólar na taxa oficial precisará, a partir de agora, de uma autorização prévia do Banco Central.
Na prática, é uma espécie de "feriado cambial", segundo jornais argentinos. Importadores são diretamente afetados, pois usam o dólar oficial para as transações internacionais. Cidadãos comuns que usam o cartão de crédito para uma compra internacional, por exemplo, também são afetados.
A decisão não tem impacto sobre compra e venda do chamado dólar blue, negociado no mercado informal, pela população e por turistas.
Quatro eixos
Especula-se que o plano terá quatro eixos centrais: um rigoroso ajuste fiscal para alcançar rapidamente o déficit zero, um salto na desvalorização da taxa de câmbio oficial, o fim do controle de preços e a eliminação dos passivos remunerados do Banco Central.
Na manhã de ontem, o porta-voz do governo, Manuel Adorni, disse que as medidas que serão anunciadas nesta terça-feira serão acompanhadas de um "forte corte fiscal com remoção de privilégios".
No domingo, em seu primeiro decreto, o novo presidente cortou pela metade o número de ministérios, de 18 do governo anterior para nove. Na semana passada, antes da posse de Milei, o jornal Clarín informou que a versão que circulava no círculo mais íntimo do presidente continha 14 medidas, incluindo privatizações.
Desvalorização cambial
Uma das medidas que devem fazer parte do pacote de ajuste é a desvalorização do câmbio oficial. O dólar comercial seria fixado em cerca de 600 pesos.
Mas, segundo reportagem do Clarín da semana passada, a taxa de câmbio oficial teria um acréscimo adicional de 30% do imposto PAIS (sigla para Por uma Argentina Inclusiva e Solidária). Assim, o novo valor do dólar - se o imposto for aplicado - ficaria em torno de 700 a 800 pesos.
"No hay plata"
No seu discurso de posse, no domingo, o novo presidente argentino Javier Milei repetiu o seu mote atual: "No hay plata", ou seja, "Não há dinheiro". A Argentina está sem recursos em caixa e vai ter de cortar gastos e subsídios, avisa o presidente. E que o país deveria se prepararar para um "choque" econômico.
Na semana passada, antes da posse de Milei, o economista-chefe da MB Associados, Sergio Vale, disse ao GLOBO que considera positiva a opção do novo presidente por um ajuste mais forte no começo do governo, lembrando que o ex-presidente Mauricio Macri tentou fazer reformas graduais, mas não teve êxito. Mas o economista brasileiro admite que a redução de subsídios e a liberação de preços devem gerar insatisfação no eleitorado:
— Falar de ajuste fiscal não significa só você fazer corte de gastos, mas reequilibrar e readequar o enorme sistema de subsídios para a população.
Na Argentina, as tarifas de energia e gás (que, no inverno, é usado no aquecimento) são fortemente subsidiadas, assim como os transportes. Na cidade de Buenos Aires, por exemplo, a tarifa básica de ônibus é de 60 pesos, o equivalente a cerca de R$ 0,30.