LUTO

José Cláudio: pernambucano deixa legado de uma obra vasta e inspiradora

Artista visual e escritor morreu na última terça-feira (12), aos 91 anos

José Claúdio, artista plástico pernambucano - Paullo Allmeida/Arquivo Folha de Pernambuco

O nome de José Cláudio se junta aos de tantos outros representantes do modernismo pernambucano de meados do século 20 que já nos deixaram, a exemplo de Francisco Brennand, Tereza Costa Rêgo e, mais recentemente, Montez Magno. Tal e qual seus contemporâneos igualmente saudosos, o pintor e escritor natural de Ipojuca - que faleceu na última terça-feira (12), aos 91 anos - deixa um legado inestimável para as artes visuais e que deve seguir inspirando novas gerações de pintores. 

"José Cláudio é um artista vasto. Suas criações estão entre a literatura e a crônica, a história da arte e a poesia visual, o desenho e a pintura, a xilogravura e a escultura. É difícil dimensionar o alcance de uma obra assim, tão complexa, que engendrou diferentes tipos de diálogo e identificação com as pessoas, da década de 1950 aos dias de hoje", afirma a crítica de arte e curadora Clarissa Diniz, que assinou a curadoria da última exposição individual do artista, "Primeiro a fome, depois a lua", realizada na Galeria Marco Zero, em Boa Viagem, no ano passado.

Ainda na infância, o futuro pintor exercitava o talento no desenho nos papéis que serviam de embrulho na loja do pai. Sua formação artística, de fato, veio com a criação do Ateliê Coletivo da Sociedade de Arte Moderna do Recife (SAMR), em 1952, na companhia de figuras como Abelardo da Hora, Gilvan Samico e Wellington Virgolino.

O jornalista e crítico de arte Júlio Cavani conviveu com Zé Cláudio - como era conhecido o pintor - nos últimos anos, entrevistando-o várias vezes para a escrita do livro "José Cláudio: Aventuras à Mão Livre", biografia do artista lançada pela Cepe em 2020. Sobre a visão que o artista mantinha em relação à própria obra, o pesquisador afirma que ele reconhecia ser influenciado pelo contexto em que se encontrava. 

"Na época em que participou do Ateliê Coletivo, por exemplo, achava que a convivência com Abelardo da Hora e outros artistas do grupo afetava o estilo e as temáticas que ele trabalhava. Depois, foi para a Bahia e conviveu muito com Carybé. Arnaldo Pedroso D'Horta foi um artista que o influenciou por outro caminho, quase abstrato, mais em preto e branco, com uma presença mais forte do desenho. Com essa fase, ele foi morar em São Paulo e lá foi muito influenciado pelos artistas daquela época. Sua obra dos anos 1950 tem coincidências com alguns nomes do período, como Goeldi e Marcelo Grassmann", conta.  

O trabalho de José Cláudio ficou especialmente marcado pela pintura de caráter figurativo, colocando nas telas cenas do cotidiano e paisagens do Nordeste, além de animais, plantas e personagens. "Foi um grande retratista. Retratou não só pessoas, mas também pintou pássaros ou folhas com a mesma subjetividade atribuída aos rostos pintados de seus filhos... pintou frutas cheias de identidade, manguezais e canaviais que mais pareciam um bloco de carnaval dada a vida por ele projetada, de forma singular, sobre cada capim, cada galho, cada pedra. Tudo tem expressão na pintura dele", analisa Clarissa.

Atento aos problemas sociais que o cercavam, o pernambucano também não deixou de expressar isso em alguns de seus trabalhos. O interesse por temas variados e a vontade de experimentar, aliás, nunca o abandonaram. "Depois dos 90 anos de idade, ele ainda pintava telas diariamente e estava cada vez mais detalhista nas pinturas, com uma precisão técnica impressionante e muita expressividade", revela Cavani.