"Recife será a primeira cidade do Nordeste em investimento público", diz João Campos
Em entrevista à Folha de Pernambuco, o prefeito do Recife falou de suas expectativas para 2024
O prefeito do Recife, João Campos (PSB), vai entrar no seu último ano de mandato com o maior orçamento do Recife nos últimos anos: R$ 8,2 bilhões. Isso vai permitir, segundo ele, um volume significativo de obras e também tirar do papel projetos para solucionar problemas históricos da cidade . Nessa entrevista à Folha de Pernambuco, ele detalha alguns desses projetos, conversa sobre política e fala sobre a decisão, anunciada na quarta-feira (13), de abrir mão de R$ 7,5 milhões que o Recife iria receber do Governo do Estado, na forma de repasses do ICMS, para que o projeto de redistribuição do imposto - de autoria do Executivo estadual - fosse aprovado na Alepe.
ALAGAMENTOS
“A pior área de drenagem da cidade é a bacia do Rio Tejipió que inclui os afluentes desse. A gente fez a parte mais difícil que é captar dinheiro. Serão vários níveis de soluções diferentes que juntos vão resolver, como alguns bolsões e acumulações de água. A gente está fazendo, o que nunca foi feito na história. A gente vai fazer obras que o Recife nunca viu. O Recife não conhece um dique pra conter enchente, não conhece o que é um parque alagável pra conter enchente, como a gente vai fazer. Vamos ter que explicar isso às pessoas. Mas o que a gente tá fazendo aqui é o que a engenharia e o mundo têm feito. Os problemas crônicos de alagamento vão ter soluções que nunca tiveram.”
POPULAÇÃO DE RUA
“80% de quem está em situação de rua hoje, no Recife, tem ou dependência química ou algum transtorno mental. A gente está aumentando a rede de acolhida. Temos 12 casas, todas sendo reformadas e estamos construindo novas. Tem restaurante popular, abrigo noturno e cozinha comunitária que estão sendo expandidos. É preciso fortalecer o atendimento psicossocial. Isso a gente está fazendo, fortalecendo os CAPES. Mas eu acho que o Brasil deveria fazer uma discussão sobre saúde mental muito mais profunda, que começasse nas escolas. Temos uma finitude de mão de obra nessa área, por exemplo.”
OCUPAÇÃO DO CENTRO
Você precisa criar um incentivo para trazer as pessoas para morar no centro. Como é que se faz isso? Primeiro, ter incentivo tributário. Quem investir no centro, tem que pagar menos imposto. É isso que a gente faz, é isso que o mundo todo faz. Tem que ter crédito mais barato. Além disso, o Minha Casa, Minha Vida tem uma linha retrofit, que não tinha antes. A gente lutou muito para conseguir isso. Você receber dinheiro para retrofitar um prédio. A primeira PPP de locação social do Brasil feita junto com a Caixa Econômica Federal vai ser aqui no Recife. Pegar seis prédios que estão abandonados, retrofitar e colocar gente para morar.
CRECHES
“A primeira vaga de creche do Recife foi aberta em 1981. Eu assumi em 2021, quarenta anos depois. Nesse tempo, foram abertas 6,5 mil vagas. Em quatro anos, a gente vai entregar outras 6,5 mil vagas. Como é que faz em quatro anos o que foi feito em 40 anos? É trabalhando muito.”
ORLA PARQUE
“É uma obra muito grande que será realizada através de contratos diversos. Não iremos tratar somente de Boa Viagem, Pina ou Brasília Teimosa. É Orla Recife. Vamos fazer tudo no mesmo padrão, na mesma qualidade. O maior contrato vai ser o do calçadão, ciclofaixa, iluminação, parque de paisagismo, as centralidades, entre outros. Vamos finalizar o contrato até o início de janeiro e a expectativa é de que, no início de fevereiro, comece a obra do calçadão. É uma obra em torno de R$ 100 milhões. A gente passou mais de um ano e meio estudando e montando o projeto, pegando referências Brasil e mundo afora do que dava certo e do que não dava, para chegar no projeto no Recife.”
GERALDÃO
"A gente lançou um primeiro edital e depois fizemos uma revisão, retirando o edital. Ele passou por algumas consultas no Tribunal de Contas, alguns ajustes. Após a aprovação do TCE, vamos relançar o edital de concessão do Geraldão. Há uma expectativa disso acontecer no próximo ano. O edital tem duas frentes: uma é a manutenção do equipamento e o outro é potencializar a captação de eventos.”
INCENTIVO À CULTURA
"A gente tem uma agenda muito intensa na cultura, com muitas conquistas. Não existia antes uma lei de patrimônio vivo do Recife e a gente criou essa lei. Anualmente, são três pessoas ou instituições eleitas através de votação, passando pelo Conselho de Cultura. Isso é uma conquista muito forte para a cultura popular. Temos também um sistema de incentivo à cultura. Tivemos um processo inteiro de lançamento de editais, com a profissionalização da escolha. A gente vai ter uma comissão de pareceristas, que se chamam as pessoas que avaliam os projetos. “
RÉVEILLON E CARNAVAL
“O modelo do Carnaval do Recife do próximo ano já está consolidado, pronto, montado, todo desenhado. Já temos quase 90% das contratações feitas. O Carnaval é a realização mais difícil de ser feita na cidade. Temos duas pessoas de gestão que monitoram todo esse processo. Não haverá mudanças. Esse Réveillon é um formato novo. É uma festa que o mundo inteiro comemora. Quem sai ganhando é quem potencializa as atrações locais para captar turistas. Fizemos esse modelo com uma parceria público-privada, sem custo, com 97% do chão ocupado de forma gratuita e 75% do palco. Serão R$ 7 milhões investidos, mas zero da Prefeitura. Economizamos recursos para lançar três novos polos: Casa Amarela, Ibura e Lagoa do Araçá.”
INVESTIMENTOS
“A gente tem batido recordes de investimentos em todas as áreas. Isso é um desafio. Não adianta ter dinheiro se não se tem capacidade de fazer. Fiz uma seleção simplificada de engenheiros e arquitetos com aproximadamente 200 profissionais É preciso ter gente para fazer projeto, para fiscalizar obra. Vamos passar de R$ 700 milhões investidos este ano. É o maior da história do Recife. No próximo ano, minha meta é o Recife ser a primeira cidade do Nordeste em investimento público, ultrapassando cidades que têm uma arrecadação maior como Salvador. Tem como fazer. Agora, isso, lógico, demanda um esforço de gestão enorme.”
OBRAS NOS MORROS
“Durante a eleição, não foi um compromisso verbalizado bater recorde de investimento e infraestrutura de morros. A gente tinha uma média de investimento na cidade que era de R$ 30 milhões por ano em infraestrutura de morro. São mais de 3,4 mil obras entregues em áreas de morro. Vamos fechar este ano com R$ 120 milhões. O que era R$ 30 milhões, virou R$ 120 milhões. Por isso que tem muita obra.”
BID
“São dois empréstimos: um de R$ 500 milhões e outro de R$ 1,5 bilhão. A gente já recebeu R$ 126 milhões dos R$ 500 milhões. Agora entrou os primeiros R$ 64 milhões do (empréstimo) de R$ 1,5 bilhão. A turbina está sendo ligada e ela vai começar a acelerar mesmo a partir do próximo ano. Então, o volume de obras que a gente já vê é sem o maior volume dos R$ 2 bilhões do BID. A partir do ano que vem, cinco anos para frente é obra que não acaba mais. O dever de casa que a gente fez até aqui, rodou muita coisa com recursos próprios e um pouco com operação nacional de crédito com Caixa Econômica e Banco do Brasil”.
REFORMA TRIBUTÁRIA
“É inegável que o Brasil precisa de uma reforma tributária. Mas que seja o mais justa possível. Se você quebrar um mecanismo de incentivo do dia para noite, várias empresas deixam o Nordeste para ir a outro lugar. Então, tem que ter mecanismos de proteção de desigualdade regional como o fundo compensação. E super tributar a área de serviços é um risco muito grande, principalmente para cidades como o Recife. Os principais setores estão protegidos no texto, a exemplo da saúde e educação. E talvez a principal medida que a gente tenha conseguido colocar – fico feliz de ter sido um articulador direto disso – é um dispositivo para regeneração de centros urbanos. Ele vai possibilitar que áreas de degradação urbana possam ter um regime especial de tributação. como será o Porto Digital.”
ACORDO SOBRE ICMS
“Eu acho que a nossa prática tem que caber dentro do discurso. Eu disse lá na Amupe. Se tiver uma solução que precise do apoio de Recife, Se for algo razoável, contem comigo porque eu acho uma coisa injusta você botar quem é grande para brigar com o pequeno, como se tivesse essa diferença de tamanho. Estou sendo coerente com o que eu disse. Estranho seria se eu tivesse dito isso e, ao receber uma ligação do deputado Álvaro Porto (presidente da Alepe), eu tivesse dito não tem nada a ver comigo.Eu não sou assim. Se eu puder ajudar, eu vou ajudar. Os R$ 7,5 milhões, é menos de 1% do repasse de ICMS ao Recife. Eu vou ter um dever de casa que é ir atrás desses R$ 7,5 milhões de outra forma. Se pegar a arrecadação do ISS deste ano e for verificar a do próximo ano, vocês me cobram se a gente não tiver incrementado esse valor em R$ 7,5 milhões.”
ELEIÇÕES 2024
“A gente falou aqui de empatia, de se colocar um lugar do outro. Eu me coloco também no do eleitor e do cidadão, principalmente. Eu tenho certeza que o pessoal quer me ver trabalhando, focando na gestão, focando nas entregas do que estar focado na disputa política ou na eleição. A gente tá fechando o ano e o ano que vem é eleitoral. A partir do momento que vai chegando o período eleitoral as decisões vão sendo tomadas. A gente tem aquela máxima de que ‘quem tem prazo não tem pressa’. Vocês não vão ver a minha agenda ser diferente. Do dia que eu assumi até aqui, eu trabalho de forma intensa e não vou parar.
PT NA VICE
“Vários partidos aliados nos ajudam na gestão, inclusive o PT. A gente conversa no dia a dia com os partidos, mas na minha cabeça está muito claro. A gente tem etapas diferentes num governo. Você tem a etapa, no início, de consolidar os projetos, organizar os planos, definir as diretrizes. No segundo ano é um ano decisivo de área meio, de botar para funcionar, e a gente tá no momento acelerando, a gente bateu recorde esse ano de investimento e vai bater no ano que vem. Se perder o foco, quem sai perdendo é a cidade.”
UNIÃO BRASIL
“Foi um movimento que me deixou muito satisfeito do ponto de vista político por vários motivos. Esse reencontro com Fernandinho (Coelho, deputado federal), Miguel (ex-prefeito de Petrolina) e Antônio (atual secretário de Turismo da PCR) tem também um caráter afetivo. Eu tive a oportunidade e eu vi meu pai caminhando com eles. Eu tenho uma uma relação muito boa também com um presidente nacional, Luciano Bivar, que é um parceiro que tem um diálogo sempre próximo da gente. Antonio, com dois ou três meses de secretário, conseguiu estruturar um Réveillon de grande porte, montar uma lei de incentivo ao turismo, fazer o circuito natalino. Quando você junta a o arranjo político com a capacidade administrativa. Isso é muito bom.”
LULA E BOLSONARO
“Eu acho que esse ano, a gente começou a viver em uma espécie de primavera, né? Em um tempo de coisas florescerem no Brasil que estavam esquecidas. Eu fui deputado federal e do primeiro ao meu último dia de mandato eu fiz uma oposição rigorosa a Bolsonaro, virei prefeito, continuei na oposição, mas busquei dialogar. Fui a Brasília tentar falar com algum ministro, conversar com o deputado da base. Vocês nunca vão me ver sem dialogar, sem conversar, porque eu acredito e faço. Mas o fato é que o Brasil, hoje, ele vive um momento diferente. Bolsonaro não fez nada pelo Recife, nada esses dois anos do senhor. Como gestor ele travou o Brasil todo. Era um governo desmontado. Eles gastavam energia só com essas pautas absurdas que não melhoram a vida de ninguém. O Governo Lula, nesse primeiro ano, teve um papel fundamental de restabelecer essa institucionalidade e lógico para a gente, como aliado político, isso é muito importante porque a cidade está ganhando.”
DINO NO STF
Conversei com ele quando ele foi indicado e também na véspera da Sabatina (no Senado). Eu acho Flávio Dino (até então filiado ao PSB) um dos maiores quadros públicos brasileiros. Conheci ele quando fui pra São Luís do Maranhão acompanhando o meu pai. Um cara muito fora da curva, uma pessoa brilhante, preparada, de espírito público elevadísimo. Eu não tenho dúvida nenhuma de que ele talvez seja o mais brilhante Ministro que o Supremo Tribunal tenha visto aí no período recente. Eu disse inclusive a ele que meu coração estava dividido porque minha outra metade do coração pensa na política e a política perdeu.
SUBSTITUTO DO PSB
A gente entende que existem quadros no partido com alta capacidade para poder conduzir o trabalho que Dino vinha fazendo. O PSB tinha um espaço, perdeu. É natural que o PSB reivindique, que faça uma conversa. Agora, o que não é feitio do nosso partido, vocês nunca vão ver, é uma conversa de nível rasteiro, de chantagem, de ameaça, isso não existe. Mas quem vai conduzir isso é o presidente Lula. É um princípio fundamental respeitar a autoridade do Presidente da República. Essa história de querer enfrentar o presidente, querer desmoralizar o governo, querer ir com isso. Isso a gente tem um presidente eleito, um presidente aliado, um presidente está fazendo um bom trabalho no Brasil que precisa do apoio do nosso conjunto e nós vamos apoiar a decisão do presidente Lula.