Reforma Tributária aprovada: redução de exceções é positiva, dizem especialistas
Mesmo com ponderações, avaliação é de que ajustes finais reduziram problemas da versão aprovada no Senado
A aprovação final da Reforma Tributária pela Câmara nesta sexta-feira (15) foi considerada positiva por especialistas. Apesar das ponderações e imperfeições, o novo sistema será melhor do que o atual, e as alterações feitas de última hora na proposta de emenda à Constituição (PEC) tiveram a vantagem de reduzir as exceções.
"Muito legal a reforma ser aprovada, estou comemorando, mas é só o começo. O próximo ano, ou os próximos dois anos, serão muito intensos em discussão da legislação infraconstitucional", afirmou Larissa Longo, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Tributação do Insper, em referência a todas as leis complementares que colocarão de pé o novo sistema tributário.
Para Larissa, as principais alterações na proposta de emenda à Constituição (PEC), na última versão aprovada na Câmara, foram positivas, porque implicam uma redução na quantidade de exceções do novo sistema.
Ao longo da tramitação da reforma no Congresso, especialistas ressaltaram que, quanto mais exceções um sistema tributário possui, maior teria que ser a alíquota de referência do futuro Imposto sobre o Valor Agregado (IVA). As exceções aparecem tanto por meio de alíquotas reduzidas quanto em regimes diferenciados, para atividades econômicas cujas especificidades dificultam a cobrança do IVA.
Larissa destacou a extinção da chamada cesta básica estendida. Pela versão da PEC aprovada no Senado, a cesta estendida seria formada por produtos que não estão na cesta básica nacional, mas que teria uma alíquota reduzida do IVA. Assim, a cesta básica teria IVA zero, enquanto a cesta estendida teria um IVA menor.
"A decisão de supressão foi positiva. Já vai existir a cesta nacional", afirmou Larissa, lembrando que, quanto menos exceções houver, menor será a alíquota padrão do futuro IVA.
Regimes diferenciados contam mais
Já a Marina Thiago, cofundadora do Movimento Pra Ser Justo, ressaltou que a redução do grande número de regimes diferenciados foi ainda mais importante do que a mudança na cesta básica. A versão da reforma aprovada no Senado ampliou os regimes especiais, enquanto a proposta final aprovada em definitivo suprimiu vários deles, como para os setores de saneamento básico, concessões rodoviárias e transporte aéreo.
"Tem alguns casos em que precisamos cobrar o IVA de forma diferente. Nos combustíveis, como é um mercado com muita ilegalidade, é melhor cobrar na refinaria. No sistema financeiro, é difícil calcular o valor agregado", disse Marina, explicando a razão de ser dos regimes específicos, usados em vários países que adotam o IVA. "O que começou a acontecer é que alguns setores que não tinham motivo começaram a ser incluídos como regime diferenciado na reforma".
Segundo Marina, alguns setores que não precisam de cobrança diferenciada, como o turismo, seguiram com a previsão constitucional de ter um regime diferenciado, mas, pelo menos, são menos atividades do que havia na versão da reforma aprovada no Senado.
"Como movimento da sociedade civil, um dos nossos principais objetivos é que tenha o mínimo possível de exceções. Exceções aumentam a complexidade da tributação e muitos estudos apontam que elas acabam beneficiando as pessoas mais ricas", afirmou Marina.
Zona Franca
No caso do impasse em torno da forma pela qual os bens produzidos na Zona Franca de Manaus serão protegidos, Larissa, do Insper, disse que as alterações feitas na Câmara dizem respeito apenas à destinação dos recursos.
Na versão aprovada no Senado, a arrecadação com o tributo adicional sobre os produtos similares produzidos fora da Zona Franca iriam apenas para o Amazonas. Na versão da Câmara, irão para todas as esferas de governo.
Mesmo assim, o maior problema é que a Zona Franca seguirá existindo, causando distorções, inclusive em termos de complexidade – já que será preciso listar todos os produtos fabricados na Zona Franca e apurar os tributos sobre eles, para além do IVA.
Transição preocupa
A advogada Renata Emery, sócia da área de Direito Tributário do TozziniFreire Advogados, ressaltou que embora o desenho final da Reforma Tributária não seja ideal, é “aquele possível de ser aprovado no atual momento político do nosso país” e será um “importante avanço na modernização do nosso sistema tributário”.
Renata chamou a atenção ainda para os próximos passos. Além de atenção à elaboração das leis complementares que colocarão de pé o novo sistema tributário, haverá o período de transição. Nos primeiros anos, provavelmente, não haverá impactos imediatos para as empresas. Pelo contrário, as firmas “terão de conviver com o novo e o antigo sistema, o que sem dúvidas trará uma carga adicional de trabalho”, avaliou Renata.
Retirada de vedações abre brechas
Já o advogado Marcel Alcades, sócio da área de Tributário do escritório Mattos Filho, classificou como “muito ruins” duas alterações feitas pela Câmara. São as eliminações de dois dispositivos que serviriam para tirar incentivos para aumento da carga tributária.
Um deles era a proibição de que a União, estados e municípios editem normas infralegais tributárias sem dar ampla publicidade aos estudos e pareceres que as embasaram. Sem ela, há mais espaço para a criação de complexidades tributárias.
O outro dispositivo era a proibição expressa da proposição de projetos de lei que objetivem um aumento de tributos sem uma avaliação e demonstração do seu impacto econômico-financeiro. Sem essa proibição, está permitido “o aumento da carga tributária de diversos setores de maneira mais fácil, disse Alcades.