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Esgotados, habitantes de Gaza esperam fim da guerra, mas Israel mantém ofensiva

Um correspondente da AFP reportou disparos de artilharia contínuos durante a noite em Rafah e Khan Yunis

Menino palestino coleta madeira perto de cemitério danificado por bombardeios em Rafah, no sul de Gaza - Mohammed Abed/AFP

Os combates voltaram a se intensificar neste sábado (30) na Faixa de Gaza, cujos habitantes, esgotados pelos deslocamentos e pela escassa ajuda humanitária, estão desesperados pelo fim da guerra entre Israel e o Hamas, que entra em sua 13ª semana.

No sul do território, fumaça era vista sobre a cidade de Khan Yunis neste sábado, enquanto em Rafah, na fronteira com o Egito, os habitantes continuavam se amontoando, tentando se salvar dos bombardeios incessantes de Israel.

Um correspondente da AFP reportou disparos de artilharia contínuos durante a noite em Rafah e Khan Yunis.

"A guerra vai durar muitos meses", assegurou o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, durante coletiva de imprensa no sábado à noite.

"Chega desta guerra! Estamos totalmente exaustos. Nos deslocamos constantemente de um lugar para outro com este frio", exclamou Um Louay Abu Khater, de 49 anos, em um acampamento de Rafah.

"Bombas caem em cima de nós dia e noite. Esperamos mísseis (a qualquer momento), enquanto outros se preparam para comemorar o Ano Novo", lamentou a mulher.

 

Apesar do repúdio internacional crescente, o exército israelense mantém sua ofensiva e informou sobre "intensos combates" e ataques aéreos no pequeno território palestino.

Em Beit Lahia, no norte de Gaza, "as tropas desmontaram dois complexos militares do Hamas", informou no sábado um comunicado militar, e dezenas de "terroristas" morreram na Cidade de Gaza.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, reafirmou na sexta-feira seu apelo por "um cessar-fogo humanitário imediato" e a Organização Mundial da Saúde (OMS) alertou para a ameaça crescente de doenças infecciosas.

Disposto a negociar
Israel iniciou em 7 de outubro uma devastadora campanha aérea e terrestre contra Gaza, que deixou ao menos 21.507 mortos, a maioria mulheres e menores de idade, segundo o Ministério da Saúde deste território, governado pelo Hamas.

A guerra em Gaza se seguiu aos sangrentos ataques do Hamas contra Israel naquela data, que deixaram 1.140 mortos, a maioria civis, segundo contagem da AFP com base em dados israelenses.

O movimento islamista palestino também fez cerca de 250 reféns, mais da metade dos quais são mantidos em Gaza.

Segundo o exército israelense, 168 de seus soldados morreram no território.

Mais de mil pessoas protestaram na noite deste sábado em Tel Aviv em apoio aos reféns e pedindo que "voltem para casa".

As forças armadas de Israel publicaram no sábado um vídeo de túneis do Hamas, equipados com eletricidade, sistemas de ventilação e inclusive salas de oração, que o exército israelense destruiu na sexta-feira.

Ahmed al-Baz, nascido em Gaza há 33 anos, afirmou que o ano que termina foi "o pior de [sua] vida".

"Foi um ano de destruição e devastação. Passamos pelo inferno e conhecemos a própria morte", relatou. "Só queremos o fim da guerra e começar o novo ano nas nossas casas, com uma trégua declarada".

Enquanto isso, os mediadores internacionais continuam se esforçando para conseguir uma nova pausa nos combates.

O veículo de comunicação americano Axios e o site israelense Ynet, citando funcionários israelenses que não se identificaram, informaram que, segundo os mediadores cataris, o Hamas estaria disposto a retomar os diálogos sobre novas libertações de reféns em troca de um cessar-fogo.

Na sexta-feira, uma delegação do Hamas chegou ao Cairo para discutir um plano egípcio que contempla tréguas renováveis, a libertação escalonada de presos palestinos e, por último, o fim da guerra, segundo fontes próximas do movimento islamista.

Israel não comentou formalmente o projeto, mas o primeiro-ministro israelense afirmou na quinta-feira às famílias dos reféns que o governo está "em contato" com os mediadores egípcios e que trabalha "para trazer todos de volta".

Venda emergencial de munições
Segundo a ONU, mais de 85% dos 2,4 milhões de habitantes de Gaza deixaram suas casas e muitos passam fome e são obrigados a se abrigar da chuva em barracas improvisadas.

Israel impôs um cerco total ao território, que provocou escassez de comida, água potável, medicamentos e combustível. As caravanas de ajuda só chegam para mitigar esporadicamente a situação.

Segundo a OMS, cerca de 180.000 pessoas sofrem de infecções respiratórias e foram registrados 136.400 casos de diarreia, a metade entre menores de cinco anos.

Na sexta-feira, a África do Sul, que apoia longamente a causa palestina, solicitou à Corte Internacional de Justiça que iniciasse um processo contra Israel por "ações genocidas contra o povo palestino em Gaza". Israel repudiou estas acusações.

Os Estados Unidos, por sua vez, anunciaram na sexta a venda para Israel de munições explosivas de artilharia por 147,5 milhões de dólares (R$ 714 milhões, na cotação atual).

"É uma prova clara do apoio total da administração americana a esta guerra criminosa", denunciou o Hamas em um comunicado.

O conflito em Gaza também acentuou a violência no outro território palestino, a Cisjordânia ocupada, onde pelo menos 317 palestinos morreram desde 7 de outubro.

Neste sábado, soldados israelenses mataram perto de Hebron um palestino que teria atacado um posto militar com seu carro, segundo as forças armadas de Israel.

Além disso, a guerra intensificou as tensões na região.

Bombardeios aéreos "provavelmente israelenses" mataram 23 combatentes afins ao Irã e feriram cerca de 20 no leste da Síria, segundo o Observatório Sírio para os Direitos Humanos (OSDH).