Estudo mostra como passar 1 mês sem alimentos de origem animal transforma o corpo
Acompanhamento do 'Veganuary' revela benefícios como redução do colesterol e da gordura saturada, mas destaca riscos de carência nutricional
Há cerca de 10 anos, o mês de janeiro para muitas pessoas é sinônimo de retirar os alimentos de origem animal do cardápio e seguir uma dieta vegana. No ano passado, por exemplo, a organização inglesa "Veganuary", criadora do movimento conhecido como “Janeiro vegano” no Brasil, recebeu inscrições de mais de 700 mil pessoas.
Os voluntários foram de todos os países do mundo, à exceção apenas do Vaticano e da Coreia do Norte. Eles se cadastram no site da organização para receber dicas de receitas, sugestões de restaurantes e outros conteúdos que fazem parte do universo sem carne e derivados. Mas como essa mudança na dieta durante um mês afeta o corpo humano?
Foi o que pesquisadores da Escola de Biociências da Universidade de Nottingham, no Reino Unido, se perguntaram. Para encontrar a resposta, eles conduziram um estudo com um grupo de 159 participantes, de 18 a 60 anos, recrutados em dois períodos: no final de 2019 e de 2020.
Os cientistas compararam aqueles que se inscreveram no “Janeiro vegano” com os demais, que mantiveram o mesmo padrão alimentar. Os resultados do trabalho foram publicados na revista científica Nutrients e mostraram os efeitos positivos, e alguns negativos, da mudança.
De forma mais proeminente, a dieta vegana levou os voluntários a registrarem uma redução significativa no colesterol, estimada em 10 vezes, e uma diminuição da gordura saturada – ambos fatores ligados a menores riscos de doenças cardiovasculares. Por outro lado, porém, foi observada uma queda acentuada nos níveis de vitamina B12, composto presente majoritariamente nos itens de origem animal, e iodo entre aqueles que não tomavam suplementos dietéticos.
“Embora tenhamos mostrado alguns benefícios claros para a saúde ao mudar de carne e laticínios para veganos, o estudo também destacou as vitaminas e minerais aos quais as pessoas que participam do Veganuary precisam prestar atenção especial, nomeadamente iodo e B12. Nosso conselho para os participantes deste ano seria verificar cuidadosamente os rótulos dos alimentos e tentar garantir que produtos alternativos tenham esses nutrientes adicionados”, diz Simon Welham, professor da universidade e principal autor do estudo, em comunicado.
Embora um quadro de deficiência de iodo seja mais raro – no Brasil, por exemplo, o sal é obrigatoriamente enriquecido com o nutriente –, os cientistas destacam que a falta pode ser perigosa entre gestantes pelo fato de o iodo ser fundamental para o desenvolvimento do cérebro do feto. Já a deficiência de B12 pode levar a problemas como anemia por estar envolvida na formação dos glóbulos vermelhos.
“O ‘Janeiro vegano’ pode ser feito de forma perfeitamente saudável, se seguido de maneira sensata, e nosso estudo mostra que pode haver prós e contras em mudar de uma dieta de carne e laticínios. Para qualquer mudança importante na dieta, é importante que as pessoas planejem adequadamente para garantir que estão recebendo os nutrientes de que necessitam”, diz o pesquisador.
Para Welham, o ideal seria que aquelas pessoas que comem carne e vão aderir ao desafio buscassem o aconselhamento de profissionais especializados antes. Mas pondera que apenas um olhar mais atento aos rótulos dos alimentos já ajudaria:
"Os onívoros que se comprometem com campanhas veganas poderiam procurar aconselhamento nutricional antes de mudarem de dieta para garantir que a sua ingestão de nutrientes é adequada. Como isto é improvável para muitos, na ausência de consulta dietética, há necessidade de uma orientação clara que seja visível para todos aqueles considerando tal mudança na dieta”.
Melhora da insulina e perda de peso
Apesar dos importantes alertas sobre as medidas necessárias para evitar deficiências nutricionais, o novo trabalho se junta a um corpo de evidências que têm destacado impactos positivos em marcadores associados à saúde cardíaca decorrentes da alimentação vegana.
No fim do ano passado, pesquisadores da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, buscaram avaliar esse efeito da forma mais fiel possível – acompanhando dois irmãos gêmeos idênticos, em que um implementou a alimentação sem itens de origem animal, enquanto o outro seguiu a dieta convencional.
O estudo, publicado na revista científica JAMA Network Open, acompanhou 22 duplas, ou seja, 44 voluntários, por dois meses. Analisando os resultados de exames de sangue de antes e depois do estudo, os cientistas observaram que a dieta vegana levou a uma queda significativa no colesterol considerado ruim, o LDL, nos níveis de insulina e no peso corporal.
No início, aqueles do grupo vegano tinham um LDL de, em média 110.7 mg/dL, que caiu para 95.5 mg/dL ao fim das oito semanas. Entre aqueles que seguiram com a alimentação convencional, a taxa passou de 118.5 mg/dL para 116.1 mg/dL. O ideal é que o marcador esteja abaixo de 100 mg/dL.
O primeiro grupo também apresentou uma redução de 20% na insulina em jejum e uma queda de aproximadamente 1,9 kg a mais no peso do que o constatado nos participantes que continuaram com a dieta onívora.