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João Carreiro fez sucesso com músicas em novelas; relembre trajetória do cantor

Artista sertanejo, que morreu aos 41 anos, era um dos grandes nomes do sertanejo no país e se notabilizou pela defesa da cultura de viola

Sertanejo João Carreiro não resistiu a uma cirurgia cardíaca - Douglas Melo/Reprodução Instagram

João Carreiro era um dos grandes nomes da música sertaneja. O cantor — que morreu, aos 41 anos, na noite da última quarta-feira (3), após uma cirurgia no coração — iniciou a trajetória artística em sua cidade natal, Cuiabá, no Mato Grosso, e ganhou projeção nacional, sobretudo entre o público jovem e universitário, depois de formar a dupla João & Capataz, ao lado do colega Hilton Cesar Serafim.

Graduado em administração de empresas, o compositor, violeiro e intérprete João Sérgio Batista Corrêa Filho se notabilizou pela defesa da cultura de viola caipira num cenário marcado pela crescente modernização do gênero sertanejo. "Meu pai sempre escutou Tião Carreiro & Pardinho. Para mim, consequentemente, não foi diferente. Cresci escutando isso, e sempre fui até muito bitolado nessa parte da viola e do cantar grave", contou ele, em entrevista ao canal do jornalista André Piunti, em outubro de 2021.

Ao lado de Capataz, o artista se tornou um dos principais destaques entre os nomes da nova geração sertaneja dos anos 2000, misturando a viola caipira com elementos de estilos como o rock e o funk. Depois de a música "Bruto, rústico e sistemático", presente no álbum "Os brutos do sertanejo", integrar a trilha sonora da novela "Paraíso" (2009), da TV Globo, a dupla conquistou um número maior de ouvintes e obteve sucesso em nível nacional. Em 2011, outra canção foi destaque num folhetim televisivo — "Xique bacanizado", tema da trama de "Araguaia".

No projeto musical "Lado A e Lado B", de 2011, a dupla voltou às raízes ao gravar 21 músicas do sertanejo tradicional — interpretadas pela voz grave dos cantores —, sendo 15 delas inéditas. A continuação do projeto veio com com o trabalho "Lado B", com outras 18 músicas de João Carreiro.

É da dupla, também, sucessos como "O que essa moça fez aqui?", "Volta pro meu coração" e "É pra cabá (Pequi do Goiás)", todas composições de João Carreiro.

"Quando comecei, havia um preconceito com a viola caipira. Quando que você ia ouvir uma moda caipira numa rádio FM às duas da tarde? Eu escutava muito dos outros que esse estilo não 'vendia'. E eu ficava puto com isso, com o perdão da palavra. O povo tachava os caipiras como gente que não tinha competência. E aí me dediquei muito nessa parte de composição, de mostrar para os outros que, não era porque a gente era caipira, que a gente não sabia também fazer outras coisas", contou ele, na mesma entrevista a André Piunti.

Em 2014, João interrompeu a parceria com Capataz e se afastou dos palcos para tratar problemas de saúde mental. À época, ele revelou que enfrentava uma depressão e sintomas de Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC). "Eu estava com filhinha pequena, e a gente estava estourado. E aí eu lembrava do meu Cuiabá, da época em que tocava uma vez por semana num barzinho, ganhava um trocado e já estava feliz, sabe?", afirmou ele, na mesma entrevista, ao relembrar o fim da dupla: "Queria viver um pouco com a minha família, com a minha filha, com a minha esposa. Era uma dor no coração".

Desde o fim da dupla, João Carreiro não mantinha qualquer tipo de contato com Capataz. O encerramento da parceria artística determinou também o término da amizade de ambos, como os próprios relatavam. "A gente se separou de vez. Fiquei muito chateado. Quando acabou a dupla, ele (Capataz) arrumou um cara que canta igual a mim, colocou um nome parecido com o que era o nosso. Achei sacanagem... Eles trabalharam em cima do meu repertório. Sou meio rancoroso", disse João Carreiro.

Sumiço após depressão
Nesse período, João Carreiro se afastou totalmente do cenário artístico para tratar uma depressão, doença que já vinha lidando há tempos. Em meio à pressão de pessoas próximas para que ele não abandonasse a carreira (e a dupla com Capataz), ele desenvolveu o TOC.

"Como me senti traído, passei a não acreditar em mais em ninguém. Na minha cabeça, via as pessoas que eu amava e gostava judiando de mim. E era como se todo mundo me judiasse mesmo. Eu criava cenas na minha cabeça, e era tudo muito real. Pensava que eu era profeta do meu destino, e que tudo o que imaginava iria acontecer mesmo", explicou ele.

"Num dia, por exemplo, meus primos de Cuiabá foram me visitar. E quando eles falaram que iriam me visitar, minha cabeça formou uma cena com eles me batendo, me judiando, me matando, me levando embora... E eu chorava e falava para a minha esposa que eles iam me pegar. Era coisa de louco, pois eu acreditava friamente que aquilo ia acontecer", relatou o cantor, em desabafo acerca do diagnóstico de TOC, caracterizado, em seu caso, pela "repetição contínua de imagens de tragédia na mente", como contou.

Retomada da carreira
João retomou a carreira em 2018, com o projeto "Brutos de verdade – Jads & Jadson e João Carreiro – O encontro mais bruto da música sertaneja!". Em 2023, ele participou do projeto "Fazendinha Sessions", ao lado de nomes como Ana Castela, Hungria, LP, Us Agroboy, Felipe Amorim e DJ Chris no Beat.

João Carreiro deixa a esposa, Francine Caroline, e duas filhas — a mais nova, Helena, tem 5 anos.