Os limites dos cartões de crédito e seus impactos no mundo financeiro
A Lei 14.690, de 3 de outubro de 2023 entra em vigor, sob um alarde alvissareiro, lançado nos quatro cantos do País, em relação mais especificamente, ao percentual máximo de cobrança dos juros nas dívidas de cartões de crédito.
Não é que a medida seja ruim. É que não resolverá o problema do (super) endividamento, principalmente por não vir acompanhada de uma devida política de educação financeira, indispensável para a maior parte do consumidor brasileiro.
Anteriormente à nova legislação, as instituições de crédito e bancárias em geral poderiam cobrar juros, sem que houvesse estabelecimento do percentual máximo a ser acrescido ao valor do débito, chegando-se ao abuso de superar 400% em cima do total da dívida.
O novo limite foi fixado em, no máximo, 100%.
Entretanto, a própria Lei (batizada com o jargão “Desenrola, Brasil”), deixou de fora uma questão que poderia ser enfrentada pelo próprio Estado, que diz respeito à indispensável promoção para a educação financeira, como uma via mais eficaz e eficiente no combate ao eterno problema do endividamento.
Sabe-se que, ao lado dessa questão das contas que atormenta a maior parte das pessoas, existe uma certa cultura de inadimplência, em relação às dívidas contraídas, que acaba avolumando as situações de endividamento.
A melhor forma de não se envolver nessa situação, seria com a adoção preferencial de compra à vista, o que não só inibiria pendências futuras, como conferiria algum ganho, em razão do desconto que se adquire.
Entretanto, considerando a sorte de dificuldades financeiras e o próprio poder aquisitivo inerente a maior parte das pessoas, a opção que resta, quase sempre, é a de se comprar a prazo, o que acaba arrastando o consumidor para um porvir perpetuado por indesejáveis encargos.
A referida Lei, embora traga um capítulo, denominado de “Prevenção ao endividamento”, não se mune da devida força normativa, principalmente pela ausência do instrumental necessário, tampouco da previsão de sanções, em caso de descumprimento.
Praticamente, em todo o seu conteúdo, só prevê a concessão de incentivos às instituição que adotarem os critérios de cobrança dos créditos, deixando para que elas próprias adotem o que deveria vir como cartilha obrigatória do Estado. É o que se observa, por exemplo, em seu Artigo 27: “As instituições criadas por lei própria ou autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil e outras instituições que ofereçam crédito deverão adotar medidas de educação financeira direcionadas aos seus consumidores para prevenção ao inadimplemento de operações e ao superendividamento de pessoas físicas”.
Há entendimento, por parte de alguns economistas, inclusive, que a novel (mas insuficiente limitação dos juros), possa ter efeitos negativos, como a possibilidade de se dificultar a concessão de crédito ao consumidor.
Acrescento que possa haver um aumento do falso poder de compra que já acomete a muitos, aumentando numericamente os endividados.
Portanto, vemos o Normativo, ao menos em relação a esse ponto de limitação dos juros, como medida paliativa e de efeitos colaterais prováveis.
*Defensor público e professor
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