Lula sobre ataques antes do 8/1: "Havia pacto entre o ex-presidente, o governador do DF e polícias"
Presidente diz ao Globo que não recebeu as 'informações corretas' sobre a possibilidade de atos golpistas
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ao Globo que havia um “pacto” entre o ex-presidente Jair Bolsonaro, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, o Exército e a Polícia do Distrito Federal durante os ataques a Brasília no dia 12 de dezembro de 2022. Na data da diplomação de Lula no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), houve queima de veículos e tentativa de invasão da sede da Polícia Federal.
Além desta ação, houve um atentado frustrado a bomba nos arredores do aeroporto de Brasília, na véspera do Natal daquele ano. O movimento escalou e, em oito de janeiro do ano passado, houve a invasão às sedes dos três Poderes.
— Tinha havido aquela atuação canalha que envolveu inclusive gente de Brasília, quando tacaram fogo em ônibus no dia em que fui diplomado. Eu estava no hotel assistindo a eles queimando ônibus, carros, e a polícia acompanhando sem fazer nada. Havia na verdade um pacto entre o ex-presidente da República (Jair Bolsonaro), o governador de Brasília (Ibaneis Rocha) e a polícia, tanto a do Exército quanto a do DF (Distrito Federal). Isso havia, inclusive com policiais federais participando. Ou seja, aquilo não poderia acontecer se o Estado não quisesse que acontecesse — afirmou ao Globo Lula nesta sexta-feira (5), ao responder a um questionamento sobre o marco de um ano dos ataques de 8 janeiro.
A atuação de militares e integrantes da Polícia Militar do DF na trama golpista está sendo investigada. A Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou uma denúncia contra sete integrantes da PM — eles estão presos preventivamente.
Lula afirmou que temia que alguma tentativa golpista pudesse ocorrer na sua posse, em 1º de janeiro, especialmente após os episódios de dezembro.
— Não tinha visto o que eu vi aqui. Foi uma coisa inusitada, depois de uma eleição... Eu imaginava que eles tentassem fazer alguma coisa na posse. Acho que eles ficaram com medo porque havia muita gente — afirmou Lula.
"Não tive as informações corretas"
Ao recordar os primeiros dias do terceiro mandato, Lula revelou incômodo com os acampamentos que persistiam em frente aos quartéis e afirmou que antes de viajar para Araraquara (SP), onde estava na data do ataque, conversou com o ministro da Defesa, José Múcio, e disse não ter recebido as informações corretas sobre o risco dos ataques.
— Antes de viajar para São Paulo, conversei com o ministro Múcio, ele disse que estava tranquilo, que as pessoas iam sair. Viajei tranquilo. Não me passava pela cabeça que eu ia ser pego de surpresa com aquela manifestação. Sinceramente, não tive as informações corretas que tinha possibilidade de acontecer aquilo. Tinha informação de que acampamentos estavam acabando, mas depois tive informação que, no sábado, começou a chegar gente de ônibus nos acampamentos. Não imaginei que pudessem chegar à invasão.
Durante os ataques às sedes dos três poderes em Brasília, Lula estava em Araraquara, interior de São Paulo, visitando a cidade que havia sofrido com estragos de uma tempestade. Foi na sede da prefeitura, comandada por Edinho Silva (PT-SP), que Lula traçou a estratégia de reação do governo federal. Do local, Lula falou com auxiliares, ministros e integrantes do Supremo. À noite, Lula retornou a Brasília e visitou o Palácio do Planalto para ver os estragos. O presidente avalia que os ataques de 8 de janeiro devem servir de exemplo para as pessoas “levarem a sério a democracia”
— Nós precisamos levar muito a sério o significado da palavra democracia. Democracia é o direito de a gente divergir, discordar, falar o que quer desde que respeite os direitos dos outros e as instituições que nós criamos para garantir a própria democracia.
Lula afirmou ainda “nunca ter vivido” algo semelhante e lembrou onde estava quando soube do Golpe Militar de 1964.
— Olha, eu nunca tinha vivido um episódio como esse. Estava dentro da Metalúrgica Independência, na Vila Carioca, quando eu recebi a notícia do golpe militar de 1964. Naquele tempo as pessoas mais velhas que trabalhavam comigo falavam assim: ‘Ah, os militares vão dar jeito no Brasil, acabou com comunismo no Brasil.’ Era isso eu que eu via em abril de 1964, em 31 de março. Lembro como se fosse hoje, a gente tinha parado para almoçar, eu comia de marmita, quando a notícia apareceu na fábrica.
Na próxima segunda-feira, data que marca um ano dos ataques, haverá uma cerimônia no Congresso Nacional para lembrar o acontecimento. Lula se empenhou pessoalmente em convidar lideranças do Senado, da Câmara e governadores para o ato e pediu a presença de todos os ministros.