Acusações

O governo britânico indenizará funcionários dos correios acusados injustamente de roubo

Entre 1999 e 2015, quase mil responsáveis por agências do Estado foram alvo de acusações baseadas em informações de um software

Os funcionários dos correios tiveram que esperar por uma série de televisão para que o público e as autoridades tomassem conhecimento do escândalo - Adriano Dennis/AFP

Pressionado por “um dos maiores erros judiciais” na história do Reino Unido, o governo britânico prometeu, nesta quarta-feira (10), indenizar “rapidamente” e anular todas as acusações judiciais existentes contra quase mil ex-diretores de filiais dos correios, erroneamente acusados de roubo.

Os funcionários dos correios tiveram que esperar por uma série de televisão para que o público e as autoridades tomassem conhecimento do escândalo, no qual milhares foram acusados. Alguns ficaram falidos, outros foram presos por roubo e quatro se suicidaram.

Entre 1999 e 2015, quase mil responsáveis por agências do Estado foram alvo de acusações baseadas em informações de um software de contabilidade chamado Horizon, instalado pela Fujitsu no final dos anos 1990, que se revelou defeituoso.

Os dirigentes do serviço postal, recusando-se a considerar problemas com o software, obrigaram os trabalhadores a reembolsar os déficits contábeis que o sistema havia registrado por engano, levando muitos deles à ruína.

“Trata-se de um dos maiores erros judiciais na história de nossa nação”, admitiu nesta quarta-feira o primeiro-ministro do Reino Unido, Rishi Sunak, no Parlamento.

“As pessoas que trabalharam duro para servir a população viram suas vidas e reputações destruídas sem terem culpa alguma. As vítimas devem obter justiça e compensação”, acrescentou Sunak.

Dessa forma, o governo apresentará uma nova lei no Parlamento para que as vítimas sejam “rapidamente inocentes e indenizadas”, prometeu o primeiro-ministro.

Em vez de processos legais individuais que poderiam ser longos e dolorosos, o texto anulará todas essas condenações, uma medida extremamente rara.

Série de televisão
O escândalo veio à tona após a transmissão, na semana passada, de uma série no canal ITV, "Mr Bates vs The Post Office", que gerou uma onda de simpatia pelas vítimas.

A série conta a história de Alan Bates, que processou uma instituição postal em nome de 555 funcionários em 2017 para que sua inocência fosse reconhecida.

Também narra o caso de Jo Hamilton, acusado injustamente de roubar 36 mil libras (224 mil reais na cotação atual), mas que preferiu, como outros funcionários, se declarar culpado de cumprir uma pena de prisão.

Nos últimos anos, quase 150 milhões de libras (935 milhões de reais) foram pagos a cerca de 2.500 vítimas, informou Sunak.

Em setembro, o governo anunciou que os responsáveis pelas agências condenadas injustamente poderiam receber cada um um 600 mil libras (3,73 milhões de reais), embora pudesse optar por rejeitar a oferta e entrar com ações legais.

Até o momento, apenas 93 condenações foram anuladas e 21 milhões de libras (131 milhões de reais) foram pagos em indenização aos funcionários afetados.

O novo texto prevê uma indenização de 75 mil libras (467 mil reais) para as vítimas acusadas injustamente, mas não condenadas pelos tribunais, o que se aplica a centenas de trabalhadores.

Em 2019, a Suprema Corte Britânica reconheceu que o sistema Horizon poderia ter sido a causa do problema. E um juiz também condenou os correios por "obstinação institucional" ao se recusar a investigar o problema.

Diante da magnitude do escândalo, Paula Vennells, que já o sistema público postal entre 2012 e 2019, anunciou na terça-feira que devolveria uma condecoração que foi concedida pela rainha Elizabeth II em 2018. Uma petição pela retirada dessa condecoração obtida mais de um milhão de assinaturas.

O governo também indicou que a Fujitsu, criadora do software defeituoso, seria responsabilizada, caso fosse considerada culpada de irregularidades, e participaria das compensações.

“A Fujitsu desculpa-se pelo seu papel no sofrimento dos funcionários dos correios e compromete-se a apoiar a investigação para entender o que aconteceu e aprender com isso”, afirmou a empresa japonesa num comunicado.