AMÉRICA DO SUL

Diana Salazar, a procuradora-geral que luta contra a 'narcopolítica' no Equador

Primeira mulher negra a comandar o Ministério Público, Diana desvendou o sistema por trás da 'narcopolítica' no país

Diana Salazar, procuradora-geral - Cristina Vega Rhor/AFP

Ela não é adivinha, mas a procuradora-geral Diana Salazar, de 42 anos, antecipou, semanas antes, uma das piores investidas do narcotráfico no Equador. "Que o país esteja preparado", anunciou ela, após remover as fibras mais sensíveis das máfias e seus tentáculos no poder.

"A resposta a esta operação será, certamente, uma escalada de violência", continuou ela, sem hesitar, em 14 de dezembro.

Diana acabava de revelar a investigação "Metástase", descrita como a pedra fundamental da "narcopolítica" no Equador. Existe uma "profunda decomposição estrutural que é galopante no país (…) Um sistema consumido pelo câncer da corrupção", acrescentou.

Juízes, políticos, procuradores, policiais, um ex-diretor da autoridade penitenciária e muitos outros membros de altos escalões do poder foram acusados de beneficiar organizações criminosas em troca de dinheiro, ouro, prostitutas, apartamentos e luxos.

Com mão de ferro, a primeira mulher negra a chegar à chefia do Ministério Público desvendou a trama, depois de escrutinar milhares de chats e registros de chamadas telefônicas de um temido chefão do tráfico assassinado na prisão, em outubro passado, durante um motim.

Desde então, em suas poucas aparições públicas, ela usa colete à prova de balas e anda protegida por um robusto esquema de segurança.

"Digo com nome e sobrenome (...) agora, venham me matar", afirma, em tom de desafio, durante uma audiência, quando pediu a prisão de oito novos suspeitos.

Em 7 de janeiro, a previsão de Salazar se tornou realidade. Ao longo de uma semana, os narcotraficantes colocaram em xeque o Estado equatoriano, fazendo centenas de reféns nas prisões e lançando ataques com explosivos, agressões armadas à imprensa e tiroteios, em uma onda de violência que deixou cerca de 20 mortos.

Salazar x Correa 
Diana Salazar nasceu em junho de 1981 em Ibarra, no norte andino, conhecida como a Cidade Branca, com cerca de 160.000 habitantes. Em entrevista à imprensa local, contou que sua mãe, psicóloga, criou quatro filhos sozinha.

Estudou Ciência Política, tem doutorado em Jurisprudência e vários diplomas em direitos humanos e proteção de pessoas afrodescendentes. Em 2011, tornou-se procuradora local.

Chegou ao cargo máximo em 2019 e, um ano depois, processou o popular ex-presidente Rafael Correa (2007-2017) por corrupção, recomendando a pena máxima de oito anos.

Condenado e exilado na Bélgica, de vez em quando lança-lhe ataques. "Diana Salazar é tão desastrada que ela mesma mostra isso", escreveu o ex-presidente na rede X em 8 de janeiro.

"Em minha escala de valores, não está contactar, ameaçar, nem conversar com condenados nem com foragidos da Justiça", rebateu a procuradora-geral.

Salazar tinha acabado de ligar para o então vice-presidente de Correa, Jorge Glas, para entregar sua versão em uma investigação por peculato em obras públicas contratadas após um terremoto em 2016. Glas se refugiou na embaixada mexicana em Quito, e a Justiça ordenou sua prisão preventiva, a pedido da procuradora.

Alguns criticam-na por investir contra Correa e não avançar em outras investigações relevantes. Outros defendem-na. "Eu a descreveria como uma mulher com coragem, com talento e com determinação", disse o ex-procurador-geral Gustavo Medina à AFP.

"Heroína anticorrupção" 
Eleito por um período de seis anos e por meio de concurso meritório, Salazar acumula casos emblemáticos de corrupção. Entre as investigações mais notáveis está o chamado "FIFA Gate", que culminou com a condenação de dez anos de prisão do ex-presidente da Federação Equatoriana de Futebol Luis Chiriboga, por lavagem de dinheiro.

Também acompanhou o imbróglio envolvendo a construtora brasileira Odebrecht por pagamento de propina, no qual Glas foi condenado a seis anos de prisão em 2017.

Salazar já foi chamada de Loretta Lynch equatoriana, por sua semelhança com a procuradora-geral dos Estados Unidos que também expôs ninhos de corrupção e foi a primeira mulher negra a assumir esse cargo em seu país.

Em 2021, o Departamento de Estado americano reconheceu Diana Salazar como uma "campeã anticorrupção" por ser um exemplo "de heroína para juízes, advogados e procuradores em toda a América do Sul".

Embora tenha sido criticada por sua estreita proximidade com os americanos, a primeira procuradora do Equador, Mariana Yépez (1999-2005), acredita que muitas das acusações estejam relacionadas com machismo.

Salazar já denunciou racismo e ameaças de morte contra ela e sua filha.