Câncer de pulmão: cientistas criam sensores inaláveis que detectam a doença sem precisar de raio-X
Novidade pode ser importante ferramenta para ampliar o acesso ao diagnóstico precoce em lugares com menos recursos, esperam os pesquisadores
Cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT, na sigla em inglês), nos Estados Unidos, desenvolveram uma nova tecnologia capaz de detectar de forma precoce o câncer de pulmão sem precisar de exames de imagem, como tomografia ou raio-x. A novidade envolve sensores em forma de nanopartículas que são inalados pelo paciente e sinalizam na urina a presença, ou não, do tumor.
O estudo em que detalham a criação e os primeiros testes com animais foi publicado neste mês na revista científica Science Advances. Até chegar à rotina médica, no entanto, ainda é necessária a realização de testes clínicos que comprovem a eficácia do novo método.
No entanto, a expectativa dos pesquisadores é alta, já que a ferramenta pode tornar o diagnóstico precoce – um dos entraves para um tratamento com melhores perspectivas de cura – algo mais acessível. Isso porque pode substituir a necessidade de tomografias, que é o padrão-ouro na identificação da doença, mas demanda máquinas que estão menos disponíveis em países de média e baixa renda.
“O câncer vai se tornar cada vez mais prevalente nesses países, a epidemiologia do câncer de pulmão a nível mundial é impulsionada pela poluição e pelo tabagismo. Por isso sabemos que são lugares onde a acessibilidade a esse tipo de tecnologia pode ter um grande impacto”, afirma Sangeeta Bhatia, professora de Ciências da Saúde e Tecnologia e de Engenharia Elétrica e Ciência da Computação no MIT, em comunicado.
O câncer de pulmão também é um dos mais agressivos, especialmente quando detectado de forma tardia. No Brasil, por exemplo, segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (Inca), ele é o segundo que mais mata, responsável por quase 29 mil mortes em 2021.
Como os sensores funcionam
Bhatia passou a última década desenvolvendo nanosensores que pudessem ser utilizados para detectar doenças. No caso do câncer de pulmão, são nanopartículas de polímero que podem entrar no organismo por meio de um inalador ou um nebulizador.
As partículas são revestidas com uma espécie de “código de barras” de DNA, que é programado para se soltar ao encontrar, dentro do corpo, determinadas enzimas entre as chamadas proteases – moléculas que costumam ser hiperativas em tumores.
Ao encontrarem o alvo e se soltarem, esse material se acumula e é eliminado na urina do indivíduo. Com isso, por meio de um simples teste em que se molha uma fita de papel, semelhante a um de gravidez, com resultados em 20 minutos, os pesquisadores conseguem detectar a presença, ou não, dos sinais.
Se estiverem presentes, quer dizer que os nanosensores encontraram as proteínas, o que, por sua vez, indica a possibilidade de existir um câncer. Outras versões, destinadas a câncer de fígado ou de ovário, funcionavam por meio de injeção intravenosa, porém os pesquisadores buscaram algo que pudesse ser mais facilmente implementado nos lugares com poucos recursos, daí a ideia de usar um inalador.
Qian Zhong, pesquisador do MIT que participou do estudo, explica que o objetivo é “melhorar a disparidade de recursos e a desigualdade na detecção precoce da doença”. “Buscamos algo que possa estar disponível no local de atendimento em um ambiente com poucos recursos, então a ideia era não fazer nenhum processamento de amostra, não fazer nenhuma amplificação, apenas para poder colocar a amostra diretamente no papel e ler em 20 minutos”, continua.
O sistema foi testado em camundongos geneticamente modificados para desenvolver tumores de pulmão semelhantes aos de humanos. Os sensores foram administrados 7,5 semanas após o início da formação do câncer, algo que corresponde a um estágio 1 ou 2 da doença em pessoas.
No primeiro experimento, foram testados 20 diferentes nanosensores, com proteases distintas como alvos. Usando um algoritmo para analisar os resultados, eles identificaram quatro opções que forneceram um diagnóstico mais preciso. Eles adotaram, então, essa combinação em outros animais e observaram que ela de fato conseguia indicar a doença em seu início.
O próximo passo agora é analisar biópsias de tumores humanos para avaliar se os nanosensores também funcionam. A longo prazo, a expectativa é que os aparelhos entrem em testes clínicos, necessários para um possível futuro aval de agências reguladoras e uso na prática clínica.
No entanto, uma empresa chamada Sunbird Bio já realiza estudos clínicos de fase 1 com um sensor semelhante desenvolvido pelo laboratório de Bhatia, para uso no diagnóstico de câncer de fígado e uma forma de hepatite conhecida como esteatohepatite não alcoólica (NASH).