"Quer me ver perdendo o emprego no TikTok?" Essa é a nova tendência entre jovens demitidos
Vídeos de profissionais dispensados por empresas de tecnologia nos EUA viralizam em redes sociais e mostram uma nova relação com um momento da vida que a maioria preferiria esconder
“Estou prestes a ser demitida”, disse Folashade Ade-Banjo para a câmera enquanto posicionava seu smartphone, “e você está prestes a ver isso”.
Em um vídeo de cinco minutos publicado no TikTok neste mês, a profissional de marketing de 30 anos aparece sentada em silêncio em sua mesa de trabalho, em Los Angeles, olhando para o computador com uma expressão sofrida no rosto enquanto balança a cabeça, dizendo-se pronta para começar.
Ela estava sendo demitida por um gigante de tecnologia americana. O vídeo acumulou meio milhão de visualizações e milhares de comentários em poucas horas na rede social mais popular entre os jovens.
"Uma das minhas resoluções para este ano foi ser muito mais aberta e honesta com as coisas que enfrento na minha própria vida, então parte disso é realmente mostrar partes da minha vida que podem não ser tão glamorosas", afirmou Ade-Banjo, dias depois, em uma entrevista.
Enquanto várias empresas de tecnologia, da startup Discord ao Google, cortam centenas de empregos nas últimas semanas, alguns profissionais da área de tecnologia estão usando as redes sociais para compartilhar suas experiências de demissão, e muitos desses vídeos se tornaram virais.
As imagens mostram pessoas chorando enquanto conversam com representantes do setor de recursos humanos ou simplesmente retratam a rotina de quem começa o dia sabendo que tem uma reunião misteriosa na agenda que provavelmente se revelará como a notícia de sua demissão.
A tendência faz parte de um movimento impulsionado por trabalhadores millenials ou da geração Z que consiste em compartilhar nas redes sociais todos os aspectos de suas vidas, desde histórias sobre um encontro romântico ruim até revelações profundamente pessoais em vídeos do tipo “prepare-se comigo” em atividades cotidianas diárias, como fazer sua maquiagem, dizem especialistas em carreira.
Os vídeos de demissões, muitas vezes seguidos de posts de procura de emprego em sites como LinkedIn e X, o antigo Twitter, estão lançando uma nova luz sobre um momento privado que muitas pessoas tentam esconder, como o da demissão.
— A fronteira entre o pessoal e o profissional foi quebrada — diz Sandra Sucher, economista de Harvard que estuda demissões.
Alguns trabalhadores dizem que estão usando esses vídeos para processar as emoções que envolver a perda do emprego. Joni Bonnemort, de 38 anos, filmou-se chorando quando a empresa financiamento de reformas em que trabalhava em Salt Lake City a dispensou de sua função de marketing, em abril.
Ela planejava compartilhar o vídeo apenas com sua família, mas acabou postando no TikTok depois de descobrir que a empresa havia pago bônus aos funcionários que ficaram uma semana depois de fazer uma série de demissões. O vídeo dela acumulou mais de 1,4 milhão de visualizações e muitos comentários de apoio.
— Eu não queria parecer amarga, mas, ao mesmo tempo, é a minha experiência — afirmou Bonnemort. — Isso aconteceu com tantas pessoas.
Vanessa Burbano, professora da Columbia Business School que estuda como as práticas empresariais influenciam o comportamento dos funcionários, avalia que o trabalho remoto encorajou muitas pessoas a se manifestarem on-line:
— A interação entre os indivíduos e suas empresas mudou fundamentalmente com o aumento do trabalho remoto.
Após receber de um novo gerente um convite de 30 minutos para uma reunião, há poucas semanas, Mickella Simone Miller, que trabalhava remotamente como gerente de projetos em uma empresa também de Salt Lake City, filmou como era seu dia trabalhando em casa, incluindo a escolha de um caneca de café com a frase estampada: “O mundo está desmoronando ao nosso redor, e estou morrendo por dentro”. O vídeo termina com ela ouvindo um anúncio de sua empresa de que sua função seria eliminada.
Além de ter sido terapêutico, conta Miller, o vídeo acabou chegando a recrutadores, que a procuraram com possíveis novas oportunidades. E cerca de 30 convites para se candidatar a novas vagas foram feitas, embora ela ainda não tenha encontrado um novo emprego.
Matthew Prince, CEO da empresa de cibersegurança Cloudflare, resolveu responder no X a um vídeo de 9 minutos publicado neste mês no TikTok sobre uma demissão em sua empresa. Ele defendeu a decisão de demitir o trabalhador, mas admitiu que a empresa deveria ter sido “mais gentil e humana”.
Brittany Pietsch, a ex-funcionária da Cloudflare que postou o vídeo, disse que passou a receber mais de 10 mil mensagens no LinkedIn, incluindo muitas de recrutadores.
— Não tenho nenhum arrependimento — diz ela. — Tudo o que fiz foi ser sincera e mostrar uma conversa que não estava roteirizada.
Atenção, empresas
As empresas precisam entender que tudo pode ser registrado e compartilhado nas redes hoje em dia, numa época em que as pessoas se sentem cada vez mais confortáveis em fazer publicações on-line, alerta Lindsey Pollack, autora de livros de carreira sobre locais de trabalho multigeracionais.
Ela vê como positivo que as pessoas compartilhem experiências de demissão e não achem que isso prejudicará suas chances futuras de emprego.
Embora especialistas em recursos humanos afirmem que é improvável que as postagens prejudiquem as carreiras e futuras oportunidades desses profissionais, alertam que aqueles que postam vídeos com suas demissões precisam estar preparados para a possibilidade de ganhar notoriedade.
Ade-Banjo se assustou e tornou seu vídeo privado logo após publicá-lo, na tentativa de proteger a identidade dos gestores que a demitiram. Ela disse que seu objetivo com a publicação era simplesmente esclarecer e desestigmatizar o processo de demissão, não constranger:
— Se outra pessoa está passando por essa situação, pelo menos sabe que não está sozinha.