''Me sinto muito culpada'': favorita ao Oscar, Da'Vine Joy Randolph diz que ficha ainda não caiu
Depois de levar título de melhor atriz coadjuvante em outras premiações, americana comenta sucesso após atuação em ''Os Rejeitados'': ''Meu mundo inteiro mudou''
Até agora, Da'Vine Joy Randolph, a estrela de "Os Rejeitados", teve uma temporada de prêmios encantadora: considerada a favorita ao Oscar de atriz coadjuvante, já levou o Globo de Ouro, o Critics Choice Award e os prestigiosos troféus do Círculo de Críticos de Cinema de Nova York e da Associação de Críticos de Cinema de Los Angeles. Agora, acaba de receber também o Bafta 2024, o Oscar britânico, realizado ontem em Londres.
A atriz de 37 anos conhece bem o poder desses prêmios e sabe que apenas o fato de estar na disputa pelo Oscar pode mudar o rumo de uma carreira. Mas será que isso significa que sua temporada de premiações tem sido tranquila?
— Para ser bem sincera, é intensa demais. A temporada de premiações é realmente uma prova de fogo — admitiu Randolph em uma conversa franca que tivemos recentemente.
A campanha para o Oscar, que dura um mês, pode ser mais árdua do que as pessoas imaginam: um amontoado de perguntas e respostas, ajustes de figurino, mesas-redondas, sessões de fotos, entrevistas, tapetes vermelhos, cerimônias, estreias de filmes, coquetéis e participações em festivais que exigem níveis elevados de equilíbrio e adrenalina. Nesses eventos, todo mundo quer algo da pessoa — uma conversa, uma selfie, um autógrafo, um discurso de aceitação — e, no fim dessas noites extenuantes e glamorosas, não sobra muito para ela.
Randolph não é nenhuma novata: indicada ao Tony por seu papel na versão musical do filme "Ghost — Do outro lado da vida" (2012), ganhou um Oscar por sua atuação marcante no filme "Meu nome é Dolemite" (2019) e vem trabalhando constantemente em produções como "Estados Unidos vs. Billie Holiday" (2021) e séries de TV como "Only murders in the building", "The Idol" e "Alta fidelidade". Ainda assim, nada do que experimentou até agora se compara aos holofotes dos prêmios que se direcionaram para ela na sequência de "Os rejeitados", e a atriz ainda está descobrindo como se ajustar a todo esse brilho.
— Mesmo coisas que antes eram pequenas agora são amplificadas — comentou.
Dirigido por Alexander Payne, "Os rejeitados" apresenta Randolph no papel de Mary, gerente da cafeteria de um colégio interno que se une a um professor rabugento (Paul Giamatti) e a um aluno problemático (Dominic Sessa) quando permanecem na escola durante as férias de Natal. Cada um tem feridas próprias, mas a de Mary pode ser a mais difícil de curar: está de luto por seu filho, morto na Guerra do Vietnã.
— Ao ler o roteiro, percebi que ela era o coração dolorido do filme e sabia que, se aceitasse o papel, teria de ser corajosa — disse Randolph.
Embora Mary nem sempre seja franca em relação à dor que está sentindo, toda essa agonia interior irrompe em uma cena crucial, ambientada na cozinha de uma festa de Natal, onde ela finalmente se abre e chora.
— Acho que esse foi provavelmente o momento mais nu ou vulnerável que já demonstrei, e vai ficar registrado para sempre. Mas, quando ficava apreensiva, eu me fortalecia com a ideia de que era preciso fazer isso, porque as pessoas se sentiriam vistas e seriam capazes de se curar — contou a atriz.
Almocei com Randolph em Los Angeles, poucos dias depois de sua indicação ao Oscar. Simpática e comunicativa, desculpou-se pela voz rouca:
— Quando o nome de Paul é chamado, perco o controle — disse ela, referindo-se às suas reações de alegria à indicação de Giamatti ao Oscar e às recentes vitórias dele no Globo de Ouro e no Critics Choice Awards.
Será que tem sido mais fácil para ela processar a boa sorte de Giamatti do que a própria na temporada de premiações? Ela admitiu que sim:
— Fico feliz por poder vivenciar isso com pessoas humildes e gentis, porque, quando elas vencem, a sensação é ainda melhor.
A seguir, alguns trechos editados de nossa conversa:
Como está seu dia?
— Muito cheio. É bom, só que não dá tempo.
Não dá tempo para fazer tudo que é preciso em um dia só?
— Pois é. Sinto que, quando acordo, já estou atrasada. Mas, como dizem, são "problemas de primeiro mundo"... problemas que todo mundo gostaria de ter.
Apesar de todas as coisas fantásticas que estão acontecendo no momento, acho que muita coisa deve ter mudado na sua vida.
— Cara, é insano. Em um período de quatro semanas, de forma totalmente fora do normal, meu mundo inteiro mudou. Em consequência, todos ao meu redor também mudaram. Agora me pego alertando meus pais e minha família: "Vocês não podem falar da nossa vida para todo mundo. Às vezes, pode parecer que as pessoas só querem bater papo, mas elas podem ter outros interesses." Meus pais são inteligentes, eles entendem isso. Mas, ainda assim, foi um momento em que tive de perceber que esse tipo de coisa estava nos afetando. É muito louco.
Então, como você processa tudo isso?
— Pratico a compaixão com eles e comigo mesma, respiro fundo, e depois faço uma reflexão: do que realmente preciso neste momento? O que não é útil para mim? Porque meu mundo está maior agora, tudo dentro de mim e ao meu redor se ampliou.
Você ainda consegue encontrar aqueles pequenos momentos essenciais entre todas as coisas importantes que estão acontecendo?
— Sim. E são os lugares mais irônicos — uma viagem de avião, ir ao banheiro. A hora de dormir se tornou um ritual para mim; dou importância e valor ao meu sono e meu autocuidado. Pergunto a outras pessoas que estão vivendo esse momento comigo: "Isso é normal? O que te ajuda a lidar com tudo isso?" E tem sido uma comunidade muito legal de pessoas, muitas passando pela mesma situação, compartilhando pequenas dicas.
Quer dizer que realmente se cria um vínculo com os colegas indicados durante a temporada de premiações.
— Ah, sim, a gente se vê praticamente todo fim de semana. Na verdade, essa é a melhor parte, por isso me apego a esses momentos. Mas, sim, é muita coisa. A temporada de premiações é realmente uma prova de fogo.
Como assim?
— É cansativo. Dá para entender por que as pessoas se sentem neuróticas, enlouquecidas ou choram. Acho que, durante uma cerimônia de premiação, há tantos sentimentos lutando dentro da gente e pipocando no corpo que parece que a gente vai explodir. Mas surgem momentos lindos, coisas preciosas em meio a essa correria toda. Quando alguém te para na rua para dizer como seu trabalho o afetou, é aí que digo: "Calma, Da'Vine. Isso é importante." E sei disso, mas é um bom lembrete.
É esse tipo de coisa que a temporada de premiações deve representar, não?
— Com certeza, e tento sempre me lembrar disso; me ajuda a me ancorar, me ajuda a passar por tudo isso.
Você já absorveu totalmente a notícia de sua indicação ao Oscar? Ou ainda está processando a informação?
— Ainda estou processando, sem dúvida. E não tem problema. Estou tentando me acolher, porque me sinto muito culpada por isso.
Culpada? Por quê?
— Não que eu não esteja feliz, mas ainda não caiu a ficha. É quase como quando você recebe a notícia de que alguém que você ama faleceu. Estou nessa fase.
Você já viu cair a ficha de outras pessoas?
— Acho que sim. É quase como um êxtase. E sinto isso, mas ainda não estou demonstrando dessa forma. É avassalador, para ser bem sincera.
Faz quase dois anos que vocês começaram a filmar "Os rejeitados", certo? Uma longa jornada para um filme tão pequeno.
— É verdade. Só fiz o filme porque o roteiro era bom e a personagem era complexa. Nunca pensei que chegaria a esse ponto.
Por que você acha que o filme fez tanto sucesso? É só o filme certo na hora certa?
— Acho que o momento certo e a sorte são sempre um componente do ramo. Também acho que é um filme honesto. Principalmente depois da pandemia, estamos implorando por autenticidade. As pessoas querem a verdade, não querem mais truques nem máscaras. Querem autenticidade sem filtro. É assustador, mas parece que as pessoas precisam disso.
Em uma das principais cenas do filme, sua personagem tem um colapso nervoso na cozinha durante uma festa de Natal. Como é assistir a uma cena como essa, depois de ter feito algo tão vulnerável na tela?
— Não assisto às minhas cenas.
Você ainda não viu "Os rejeitados"?
— Vi o filme. Eles me obrigaram. Disseram: "Vá para a sala de exibição, está tudo pronto. Você tem de ir, porque senão o que você vai dizer quando for entrevistada?" Eu estava, tipo, acho que me lembro do que meu corpo passou, mas tudo bem. Então me sentei lá e assisti. Foi muito desconfortável.
Há um momento silencioso e devastador em que Mary abre uma caixa com as roupas de bebê do filho. Como foi a filmagem dessa cena?
— O Alexander filmou a cena por um bom tempo. Achei que faríamos em cinco minutos, mas ele realmente me deixou sentar naquelas salas. Foi lindo porque, em determinado momento, meu cérebro se esqueceu da filmagem e fiquei só naquele espaço, mergulhada naquela ação. Mas o que eu fiz foi compor solilóquios para mim mesma. Quando alguém parece perdido em pensamentos durante o luto, na verdade está falando consigo mesmo em voz alta, racionalizando, tentando descobrir como aquilo aconteceu, "onde foi que errei?". Ou, às vezes, quer se confortar e reproduzir boas lembranças de quando estava com a pessoa que se foi. Eu queria mostrar todas as fases do luto, porque logo entendi que elas nem sempre acontecem em uma sequência conveniente. Há muita fluidez e imprevisibilidade no luto. Você está sempre negociando: deixo que a dor me leve em sua onda poderosa? Ou tento fincar os dez dedos dos pés na areia e deixo a onda bater e quase me derrubar?
Da'Vine, essa é uma descrição do luto ou da temporada de premiações?
— (Risos) A esta altura, meu amigo, vai saber...