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Renda do empreendedor do Rio supera a de São Paulo e se torna a maior entre as capitais

Média de rendimento dos cariocas é de R$ 8,8 mil mensais contra R$ 8,5 mil entre paulistanos. Predomínio de serviços na capital fluminense e menos geração de vagas formais estão entre as explicações

Rio de Janeiro - Pablo Porciuncula/AFP

A renda dos empreendedores cariocas passou a dos paulistanos pela primeira vez e se tornou a maior entre as capitais, aponta estudo da Secretaria municipal de Desenvolvimento Urbano e Econômico do Rio de Janeiro. A média aqui foi de R$ 8,8 mil mensais contra R$ 8,5 mil na capital paulista nos nove primeiros meses de 2023, segundo o levantamento, feito com base em dados da Pnad Contínua, do IBGE. A média nacional foi de R$ 5,4 mil no período.

O perfil da economia da cidade, com predomínio do setor de serviços, menos oportunidades no mercado formal — que acaba impulsionando uma parte qualificada da força de trabalho para o empreendedorismo — e a melhoria do ambiente para a abertura de novos negócios estão entre as explicações para o crescimento da renda entre empreendedores cariocas.

Na pesquisa, foram considerados apenas os empreendedores formais — autônomos e empregadores com CNPJ. Em 2020, o Rio era a sétima capital em rendimento de empreendedores no ranking das capitais.

— Houve melhora no ambiente de negócios e investimentos, com aquecimento no setor de eventos. Isso tem impacto para a economia, gerando mais renda, ampliando o poder de consumo na cidade —diz Chicão Bulhões, secretário municipal de Desenvolvimento Urbano e Econômico.

Os empreendedores cariocas compõem uma parcela maior da população ocupada — 10,6% dos trabalhadores ocupados do Rio de Janeiro são empreendedores, contra 9,9% na média nacional. Isso acontece, primeiramente, porque a economia do Rio de Janeiro é intensiva em serviços, segmento muito relacionado ao trabalho por conta própria.

Turismo favorece empreendedorismo
Os empreendedores cariocas estão mais concentrados no segmento de serviços do que a média nacional — enquanto eles representam 71,8% na cidade do Rio de Janeiro, são apenas 49,7% no Brasil.

— O que diferencia o Rio de Janeiro são as atividades relacionadas ao turismo. A cidade recebe muitos estrangeiros, gerando incentivo ao empreendedorismo no setor de serviços, comércio e turismo — explica o economista Bruno Imaizumi, da LCA Consultores.

No comércio, a taxa de empreendedores é maior no Brasil que no Rio. E o mesmo padrão é visto no caso da indústria e da construção civil.

Além disso, dizem especialistas, a escassez de oportunidades no mercado formal impulsiona uma parte da força de trabalho ao empreendedorismo no Rio. De acordo com Imaizumi, a cidade ainda enfrenta problemas estruturais que podem afastar empresas, como a violência e a corrupção.

Vagas com carteira assinada
Dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que contabiliza admissões e demissões no setor formal, mostram que o saldo de empregos com carteira assinada no Rio de Janeiro fechou o ano de 2023 em 71.825, abaixo do ano anterior, quando foram criados 99.551 postos de trabalho.

Em São Paulo, o saldo foi de 132.263 no ano passado, ante 195.854 em 2022.

Bulhões reconhece que o Rio tem como desafio formalizar mais a economia, simplificando e desburocratizando ao máximo o processo para abertura de novos negócios.

Por isso, a Prefeitura tem lançado mão de iniciativas como o Alvará a Jato, criado em 2023. O sistema permite que um empreendedor obtenha autorização do município para sua atividade e operação por meio de um processo de autodeclaração.

— Quando a atividade é de baixo risco, o empreendedor faz o alvará on-line. O programa veio após a Lei da Liberdade Econômica Carioca (de 2021), que desburocratiza o processo para abrir e formalizar negócios — destaca o secretário.

Ele afirma que o foco agora é ampliar o Crédito Carioca, programa de microcrédito que conta hoje com duas entidades parceiras, o Estímulo Rio e o Sicoob Rio.

Escolaridade
Bulhões ressalta o nível de qualificação do empreendedor carioca. A taxa de empreendedores formais cariocas com nível superior é de 57,3%, bem superior à média nacional (35,5%).

O economista Manuel Thedim, diretor-executivo do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), explica haver um contexto para o Rio contar com uma fatia tão larga de empreendedores de alta escolaridade:

— Após 2020, desde a pandemia em particular, temos cada vez mais pessoas trabalhando para vários empregadores. É um reflexo da Gig Economy, com uma oferta maior de serviços formais prestados por profissionais mais sofisticados, como arquitetos, médicos e consultores. E há, no Rio, menor demanda por trabalho em empresas formais do que em São Paulo, por exemplo.

O conceito de Gig Economy é usado para descrever a nova economia da era digital, em que os trabalhadores são autônomos, independentes e prestam serviço para diferentes plataformas on-line, empresas ou mesmo ao consumidor final.

Modelo contemporâneo de trabalho
Thedim reforça que o ambiente de negócios da cidade do Rio vem melhorando, assim como a economia do país com um todo. Mas houve, ao longo desses últimos anos, outros fatores importantes, como a chamada “pejotização” de trabalhadores, sobretudo com a permissão para que empresas pudessem terceirizar colaboradores até em suas atividades fins após a Reforma Trabalhista do governo de Michel Temer.

O Rio tem, em paralelo, a vantagem de ser o maior polo de produção audiovisual do país e ter força na atividade do turismo, destaca o economista, áreas com robusta prestação de serviço.

— As economias estão se sofisticando, serviços crescendo por impacto da pandemia e do trabalho remoto. Não tem volta. O trabalho já mudou e vai mudar ainda mais. Para o Rio, é sensacional. Estamos na frente nesse modelo contemporâneo de trabalho — avalia Thedim.

Marcel Balassiano, subsecretário de Desenvolvimento Econômico e Inovação, lembra que o Rio de Janeiro é uma cidade com uma quantidade relevante de nômades digitais, pessoas que realizam atividades profissionais no Rio de Janeiro para empresas de diversos lugares do mundo.

— Isso tem relação com o que queremos que o Rio se torne: a capital da inovação da América Latina. E temos tomado medidas neste sentido, como o Porto Maravalley (polo de inovação e tecnologia em Santo Cristo) e o projeto educacional Programadores Cariocas.

Participação feminina
No Rio, também há mais mulheres empreendedoras. O percentual de empreendedores femininos no Rio de Janeiro (39,1%) é maior do que a média nacional (35,5%). Também há mais mulheres cariocas empreendedoras empregadoras (35,5%) do que brasileiras. O mesmo comportamento se repete no caso das empreendedoras autônomas: elas são 41% no Rio e 37,4% no Brasil.

Luciana Kramer, de 41 anos, e Roberta Castro, de 39 anos, são duas cariocas empreendedoras. Luciana é dona da Tour Pelo Mundo, de seguro viagem e pacotes internacionais. Roberta é dona da Viaggio, focada em viagens para pessoas com mais de 50 anos.

As duas resolveram unir forças após participarem do Labtur, projeto da Secretaria Municipal de Turismo para negócios inovadores.

Agora, elas tocam o Tour para Cariocas, das duas empresas juntas, iniciativa é voltada para mulheres com mais de 50 anos que querem visitar lugares diferenciados na cidade, pouco frequentados pelo público comum.

— Foram seis meses de consultoria com a Lab. De meados de 2022 para 2023, crescemos bastante. Nos utilizamos de tudo o que tem de promoção para termos preços diferenciados — afirma Luciana, acrescentando que a Tour Pelo Mundo cresceu 150% em 2023, na comparação com o ano anterior, enquanto a Viaggio teve quase 60% de crescimento nesse período.