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Sem Bolsonaro no Planalto, Telegram perde usuários pela primeira vez no Brasil

Base de aplicativo em smartphones do país caiu de 66% para 63% após cinco anos de alta

Jair Bolsonaro discursa para apoiadores em ato realizado na Av. Paulista - Nelson Almeida/AFP

O Telegram, serviço de troca de mensagens concorrente do WhatsApp, perdeu usuários pela primeira vez no Brasil. A taxa de smartphones com o aplicativo caiu de 66% para 63% entre agosto de 2023 e janeiro deste ano.

Os dados são da pesquisa Panorama Mobile Time/Opinion Box - Mensageria no Brasil, que entrevistou 2.112 brasileiros com mais de 16 anos que acessam a internet e têm smartphones. As entrevistas foram feitas entre 10 e 23 de janeiro de 2024. A margem de erro é de 2,1 pontos percentuais, e o grau de confiança, de 95%.

O movimento coincide com a saída de Jair Bolsonaro do poder, presidente com um dos maiores canais do mundo, com mais de um milhão de usuários. O Telegram é conhecido por abrigar, além de outras comunidades, grupos de extrema-direita, atraídos pela baixa restrição do aplicativo a discursos de ódio.

A perda de usuários interrompe cinco anos de crescimento no Brasil. Em janeiro de 2019, o aplicativo estava instalado em 13% dos smartphones no país, taxa que chegou a 65% em agosto de 2022. Desde então, vinha se mantendo constante, até cair na última aferição.

No mesmo intervalo, o Telegram registrou também uma diminuição em sua frequência de uso: baixou de 53% para 50% a proporção de usuários que abrem o aplicativo todo dia ou quase todo dia.

O WhatsApp continua como aplicativo preferido dos brasileiros, de acordo com a pesquisa. A base de usuários tem se mantido constante nos últimos cinco anos, em torno de 98% dos smartphones. O Instagram teve um crescimento rápido de 2019 até 2020, quando passou de 65% até 81%, mas ficou estagnado nessa taxa por dois anos. Em agosto de 2022, passou para 86%, e hoje está em 88%.

Já o Facebook Messenger perdeu usuários desde agosto de 2019, quando estava instalado em 79% dos smartphones do país. Hoje o índice é de 69%. O Signal mantém uma estabilidade rígida, porém baixa: 13%, a mesma desde 2021, dentro da margem de erro.

Refúgio bolsonarista
Ao longo de seu mandato, e até hoje, Bolsonaro incentiva seus apoiadores a se inscreverem em seu canal no Telegram. Grupos e canais de apoio ao ex-presidente se tornaram abrigos onde extremistas organizaram manifestações, acampamentos e os ataques golpistas à Praça dos Três Poderes em Brasília, em 8 de janeiro de 2023.

Desde a eleição de Bolsonaro, chats de extrema-direita se proliferaram no aplicativo, impulsionando conteúdo de ódio, antivacina e apologia ao nazismo. O Globo também identificou venda de armas de fogo e munição, cédulas falsas, receitas médicas, pornografia sem consentimento e pedofilia.

Ao longo dos anos, acossado pela Justiça brasileira e depois de muita resistência, o Telegram passou a colaborar com determinações judiciais e bloqueou chats com atuação extremista. Mas as polêmicas não cessaram.

Em maio de 2023, durante a tramitação do projeto de lei que instituiria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, conhecido como PL das Fake News — e que aumentaria a responsabilização sobre as plataformas digitais para o combate de desinformação —, o Telegram fez circular uma mensagem para todos os usuários com ataque à proposta.

A mensagem impulsionada pela empresa teve 1,2 milhão de visualizações e foi compartilhada em mais de 200 chats de extrema-direita até ser apagada por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF).

A mensagem ajudou a endossar o discurso de extremistas de que o PL das Fake News seria uma forma de mordaça à liberdade de expressão dos usuários. Mensagens com o termo "censura" explodiram na plataforma nas 24 horas seguntes.

Fernando Paiva, editor da Mobile Time, diz ser difícil fazer uma associação entre a saída de Bolsonaro do poder e a queda dos usuários no Telegram. Mas ele encontra paralelos entre os eleitores do ex-presidente e o público que abandonou o aplicativo:

— A gente verificou a maior queda entre de penetração do Telegram nos últimos seis meses entre pessoas com mais de 50 anos e nas classes A e B. A gente sabe também que é justamente nesse público que o Bolsonaro tem um eleitorado bastante forte.