RIO DE JANEIRO

Perguntas e respostas: o que já foi revelado e o que ainda falta esclarecer sobre o caso Marielle

Vereadora e seu motorista, Anderson Gomes, foram mortos em 14 de março de 2018

Marielle Franco - EFE/Mário Vasconcellos/Direitos Reservados

Seis anos após o assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, a principal pergunta sobre o caso permanece sem resposta. Mas o ponto final da investigação pode estar perto.

Um acordo de delação premiada do ex-policial militar Ronnie Lessa, acusado de ser o autor dos disparos contra a vereadora Marielle Franco (PSOL), apontou para a possibilidade do crime ter dois mandantes.

Desde que a Polícia Federal assumiu o caso, em fevereiro do ano passado, personagens envolvidos na trama foram revelados e algumas perguntas já foram respondidas. Confira.

Qual foi a motivação do crime?
A Polícia Federal investiga se uma disputa por terra na Zona Oeste do Rio motivou o assassinato da vereadora em março de 2018. Em delação que ainda depende de validação do Superior Tribunal de Justiça, o ex-sargento da PM Ronnie Lessa, acusado de ser o autor dos disparos contra a parlamentar, deu informações reforçam essa linha de investigação.

De acordo com Lessa, Marielle teria virado vítima por defender a ocupação de terrenos por pessoas de baixa renda e que o processo fosse acompanhado por órgãos como o Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio (Iterj) e o Núcleo de Terra e Habitação, da Defensoria Pública do Rio.

O mandante do assassinato apontado por Lessa buscaria, segundo ele, a regularização de um condomínio inteiro na região de Jacarepaguá sem respeitar o critério de área de interesse social, ou seja, o dono tinha renda superior à prevista em lei. O objetivo seria obter o título de propriedade para especulação imobiliária.

O que aconteceu com a arma usada no crime?
A metralhadora HK MP5 usada no homicídio teria sido desviada durante incêndio no Batalhão de Choque da PM, no Centro do Rio, na década de 1980, segundo levantamento feito pela PF com base em informações fornecidas por Queiroz. A arma seria do Batalhão de Operações Especiais (Bope), segundo o ex-PM.

De acordo com a Polícia Federal, “a confirmação de que houve pelo menos dois incêndios em unidades do Batalhão de Choque e de que havia submetralhadoras HK MP5 em seus arsenais torna o relato sobre a origem da arma verossímil”. No entanto, os investigadores descobriram que os dois incêndios, em 1982 e 1984, atingiram paióis no Batalhão de Choque (BPChq), e não no Bope.
 

Na década de 1980, o BPChq foi o quartel da corporação responsável pela guarda de 12 submetralhadoras HK MP5. As armas chegaram ao batalhão em janeiro de 1983 e, posteriormente, em 1989, passando a integrar o arsenal do Núcleo da Companhia de Operações Especiais, atual Bope.

Em depoimento, Queiroz contou que Lessa costumava usar uma metralhadora HK MP5 em ações do Bope e tinha um “carinho” por essa arma. Até hoje, a arma usada no crime não foi encontrada. À PF, Queiroz afirmou ter ouvido de Ronnie que a arma teria sido jogada no mar depois do crime. “No início, ele ficou com ela ainda, mas quando o negócio começou a tomar muito vulto mesmo, eu perguntei: “O que você fez com essa arma?” Ele falou: “Eu serrei ela todinha”. Ele falou que serrou ela todinha, pegou a embarcação lá na Barra da Tijuca, foi numa parte que tinha trinta metros, e jogou ali”, contou ele.

O que fizeram com carro usado para matar Marielle Franco?
Élcio contou à polícia que no dia 16 de março ele foi dirigindo o Cobalt prata em direção a Rocha Miranda, na Zona Norte, para entregar o veículo a Orelha. Durante todo o percurso, ele foi acompanhado por Ronnie Lessa em outro veículo. O trajeto feito pelos dois foi beirando a linha do trem até chegar a Avenida dos Italianos, onde Queiroz e Lessa teriam encontrado Orelha, próximo a uma pracinha do bairro. O local, inclusive, fica perto da área onde o ex-bombeiro e o ex-sargento da PM têm uma rede ilegal de internet e TV a cabo. Ambos quebraram a placa do carro em diversos pedaços, jogando-os na linha do trem que tinha no caminho.

Neste dia, segundo Élcio, Orelha entrou no Cobalt e Lessa explicou que precisava de um fazer um favor. Na tentativa de se justificar, ele teria dito que o carro estava saindo na mídia e que não tinha nada a ver com ele e que aquele carro era parecido com o que saiu na mídia. E, para evitar problemas, precisaria se livrar dele.

Orelha então teria ficado apavorado e dito a Lessa que não queria saber de nada. "Não precisa me contar nada não. O Suel já falou comigo" teria dito em resposta ao pedido de Lessa, segundo Élcio.

Quem mandou matar Marielle?
Apesar de a delação premiada do ex-policial militar Élcio de Queiroz trazer à tona detalhes sobre a execução e participação de outros suspeitos no crime, a questão central ainda está em aberto. A polícia ainda não sabe quem é o mandante ou mandantes e qual foi a motivação do crime. Em janeiro, o blog Segredos do Crime revelou que a Polícia Federal investiga dois mandantes pelo assassinado. E que informações prestadas pelo ex-sargento da Polícia Militar Ronnie Lessa, acusado de ser o autor dos disparos contra a parlamentar, poderiam fortalecer essa linha de investigação.

Adriano da Nóbrega teve envolvimento na morte da vereadora?
Nas investigações, o ex-capitão do Bope Adriano da Nóbrega aparece como um personagem que teria se negado a realizar o crime, antes de Lessa ser procurado para fazê-lo. As investigações sobre o duplo homicídio, no entanto, tinham sido o fio da meada para a Operação Intocáveis, do MPRJ com a Polícia Civil, que atingiria a cúpula da mais antiga milícia do Rio, da qual Adriano era acusado de fazer parte.

Apontado como chefe do bando de pistoleiros do Escritório do Crime, ele ficou foragido por cerca de um ano, até ser localizado em um sítio no interior baiano, onde foi morto em uma troca de tiros com policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Bahia, com apoio da inteligência da Polícia Civil fluminense.

Quem foi o autor dos disparos?
Ronnie Lessa foi preso em março de 2019 pela participação nos assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes. Na delação de Élcio de Queiroz, ele é apontado como autor dos disparos que mataram a vereadora e seu motorista. Lessa foi expulso da PM e condenado, em 2021, a quatro anos e meio de prisão pela ocultação das armas que teriam sido usadas no crime.

Quem são Élcio de Queiroz e Suel?
Élcio de Queiroz é ex-sargento da Polícia Militar e foi expulso da corporação em 2015. Em sua delação, afirmou que dirigia o carro que perseguiu o veículo onde estavam a vereadora e seu motorista.

Élcio preso desde 2019 e fez a delação premiada na qual apontou a participação de mais uma pessoa, Maxwell Simões Corrêa, o Suel, nas mortes de Marielle Franco e Anderson Gomes.

Suel, que responde ao processo, é ex-sargento do Corpo de Bombeiros e é acusado de ter cedido um carro para a quadrilha, esconder as armas após o crime e auxiliar no descarte delas. Segundo Queiroz, o ex-bombeiro também participou de uma tentativa frustrada de matar a vereadora em 2017. Naquela ocasião, Maxwell, que estava dirigindo, não teria conseguido emparelhar com o táxi onde estava Marielle na hora que Lessa mandou.