GOLPE

GLO, Estado de Sítio e de Defesa: o que são os mecanismos elencados por Bolsonaro a militares

O general Marco Antônio Freire Gomes, que chefiou o Exército, e o tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, ex-responsável pela Aeronáutica, detalharam reuniões com o ex-presidente à PF

Jair Bolsonaro, ex-presidente - Isac Nóbrega/PR

A divulgação do conteúdo dos depoimentos de militares que comandavam as Forças Armadas durante a reta final do governo Bolsonaro trouxe à tona a participação direta do ex-presidente na elaboração de documentos de cunho antidemocrático.

Ouvidos no âmbitos de uma investigação da Polícia Federal (PF) que apura possíveis investidas golpistas, o general Marco Antônio Freire Gomes, que chefiou o Exército, e o tenente-brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, ex-responsável pela Aeronáutica, relataram que textos apresentados por Jair Bolsonaro (PL) após a vitória nas urnas de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) apresentavam diferentes caminhos para que o resultado das eleições não prevalecesse: uma Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e a decretação de Estado de Defesa ou de Estado de Sítio.

Mas qual é, na prática, a diferença entre esses três dispositivos? A GLO, por exemplo, é uma operação militar que permite exclusivamente ao presidente da República convocar as Forças Armadas. A medida ocorre, segundo a legislação, nos casos em que há o esgotamento das forças tradicionais de segurança pública, em graves situações de perturbação da ordem.

As GLOs costumam ser empregadas em situações momentâneas de vulnerabilidade, sendo concedida provisoriamente aos militares a atuação com poder de polícia. O governo Lula se valeu do dispositivo para permitir que as Forças Armadas atuem na segurança de portos e aeroportos.

Já o Estado de Defesa busca “preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza”. Com a medida, há restrições aos direitos de reunião, sigilo de correspondência e de comunicação telefônica. Ela precisa de aprovação do Congresso.

O Estado de Sítio, por sua vez, é acionado em caso de “comoção grave de repercussão nacional”, ineficácia de medida tomada no Estado de Defesa ou quando há guerra ou resposta a agressão armada estrangeira. Para as primeiras hipóteses, não pode durar mais de 30 dias.

A medida autoriza o governo a prender cidadãos sem necessidade de determinação judicial, entre outros pontos. Também demanda aval do Congresso.

Outro dispositivo cuja finalidade é distorcida com frequência pelo discurso bolsonarista é o artigo 142 da Constituição — embora ele não tenha sido citado pelos militares no depoimento à PF.

O texto em questão afirma que "as Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem".

O trecho final, sobretudo, costuma ser utilizado para referendar a suposta legitimidade de um papel das Forças Armadas como poder moderador, passível de ser acionado em caso de divergências entre outros entes, o que não é previsto na Constituição. Um parecer da Câmara dos Deputados, inclusive, reafirma que eventuais conflitos entre os Poderes da República "devem ser resolvidos pelos mecanismos de freios e contrapesos existentes no texto constitucional".