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Por que os órgãos do porco, e não de outro animal, são usados em transplantes em humanos?

EUA realizam primeiro transplante de rim de porco para um paciente vivo que luta contra uma doença renal crônica terminal

Porcos - Mark Stebnicki/Pexels

Os Estados Unidos realizaram o primeiro transplante bem-sucedido do mundo de um rim de porco geneticamente modificado para um homem de 62 anos que vive com doença renal crônica terminal. O procedimento representa um marco importante na busca por novas fontes de doação de órgãos.

A cirurgia foi realizada no último sábado (16) e teve quatro horas de duração. O paciente "se recupera bem" e deve receber alta em breve, de acordo com comunicado do hospital Geral do Massachussetts, ligado à Universidade Harvard.

Essa não é a primeira vez que um rim suíno geneticamente modificado é transplantado para um humano. Mas os casos anteriores foram realizados em pacientes com morte cerebral. Esse é o primeiro a ser realizado em um paciente vivo. Mas porque os órgãos de um porco são usados em humanos e não de outro animal?

Isso ocorre porque a anatomia dos porcos é muito semelhante a dos humanos – fígado, rins e coração são os principais órgãos parecidos com os nossos.

Outro ponto é que os suínos alcançam a idade e peso de um adulto bem rápido, além de não serem uma espécie com risco de extinção, que é o caso de alguns primatas – macacos também já foram usados em testes, mas justamente pela grande semelhança com humanos, um risco biológico maior de transmissão de doenças foi notado, o que fez com que a comunidade científica deixasse de usá-los em testes da medicina.

Chamado de xenotransplante, técnica de realização de transplante de órgãos entre espécies diferentes, vem sendo foco de pesquisa há mais de 5 décadas e tentativas clínicas heroicas, realizadas por vários centros de saúde médica no mundo.

Segundo o cirurgião especialista em fígado e aparelho digestivo e diretor do Instituto do Fígado Americas, Ben-Hur Ferraz Neto, em recente coluna para o GLOBO, durante as décadas de 60 a 90, houve mais de “duas dezenas de tentativas de transplantes de órgãos de primatas não humanos em humanos, incluindo rins, coração e fígado. Apenas 1 transplante de rim teve sobrevida de 9 meses e 1 transplante de fígado de 70 dias”, mas todos vieram a falecer horas, dias ou poucas semanas depois.

— Dentro de um raciocínio lógico, porém equivocado, se imaginava que os primatas não humanos, como chimpanzés e babuínos, deveriam ser os mais compatíveis. De alguns anos para cá, associado a evolução surpreendente da genética, com a descoberta do genoma humano e de técnicas que permitem a mudança do DNA (código genético), como “crispr”, passou-se a considerar os porcos como os potenciais “doadores de órgãos” mais adequados aos xenotransplantes. Eles são mais fáceis de serem criados, se reproduzem e crescem mais rapidamente, tem tamanhos diversos e compatíveis com seres humanos de todas as idades, tem um custo de manutenção mais baixo que os primatas não humanos, além da sua similaridade anatômica e funcional mais próxima a do ser humano — explicou.

Este procedimento bem-sucedido é um marco histórico no campo emergente do xenotransplante como uma solução potencial para a escassez mundial de órgãos. O rim é o órgão mais comum necessário para transplante, e estima-se que as taxas de doença renal em estágio terminal aumentem nos próximos anos.