MARIELLE FRANCO

Caso Marielle: investigação mostra tentativas da Polícia Civil de livrar irmãos Brazão

Chiquinho, Domingos e delegado Rivaldo Barbosa foram presos em investigação

Caso Marielle Franco - Fernando Frazão/Agência Brasil

A investigação da Polícia Federal que terminou com a prisão de três suspeitos de atuação nos assassinatos da vereadora do Rio de Janeiro Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes mostra que o grupo se movimentou com o intuito de incriminar terceiros e livrar os verdadeiros mandantes. O deputado federal Chiquinho Brazão e o irmão dele e conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE), Domingos Brazão, foram presos suspeitos de serem os mandantes. O ex-chefe da Polícia Civil Rivaldo Barbosa também foi detido suspeito de ter obstruído as investigações.

Rivaldo era chefe da Delegacia de Homicídios quando o atentado foi planejado e se tornou chefe da corporação na véspera das execuções. O ex-policial militar Ronnie Lessa, apontado como o executor dos homicídios, afirmou que após a morte de Marielle teve uma reunião com os irmãos Brazão, ocasião em que eles “teriam revelado que Rivaldo estava cuidando do redirecionamento das investigações”.

Tempos depois, surgiu uma “testemunha-chave”, Rodrigo Ferreira, chamado de Ferreirinha, que afirmou à polícia que o então vereador Marcello Siciliano e o miliciano Orlando Oliveira de Araújo (ou Orlando Curica) eram os responsáveis pela morte de Marielle e de Anderson. Havia uma atuação, segundo a PF, do delegado Giniton Lages, responsável pela investigação na época, e do policial civil Marco Antônio de Barros Pinto.

“A deflexão da investigação para a falsa imputação em face da dupla Marcello Siciliano e Orlando Curicica, por meio da utilização da testemunha Rodrigo Jorge Ferreira, no entanto, foi o ápice das diligências obstrutórias emanadas pela dupla [Giniton e Marco Antônio]”, diz a PF.

Questionado sobre esse redirecionamento da investigação relatado pelos irmãos Brazão em reunião, o próprio Lessa disse que o atribuiu à “entrada em cena” de Siciliano e Orlando Curicica.

Para a polícia, os “reiterados episódios de obstrução da investigação foram esquematizados por Giniton e operacionalizados por Marco Antônio”, sendo ambos os executores “do projeto delineado por Rivaldo”.

 

“A posição dos dois na cadeia hierárquica da organização criminosa indica que, apesar de não terem participado do ajuste prévio do homicídio, ambos foram fundamentais para o sucesso da empreitada que garantiu a impunidade do crime até os dias atuais, visto que eram os responsáveis diretos pela apuração nas horas de ouro, fundamentais para qualquer investigação de homicídio”, informa relatório da PF.

A polícia cita que o miliciano Jorge Alberto Moretti, chamado de Beto Bomba, afirmou em áudio enviado a Siciliano que a testemunha Ferreirinha foi “plantada” para redirecionar a investigação para o vereador e para Orlando Curicica.

“Aqui reside uma das tacadas de mestre do grupo criminoso composto pelos Irmãos Brazão e Rivaldo Barbosa. Imputar o delito em tela ao então vereador Marcello Siciliano teria o condão não só de garantir-lhes a impunidade, mas também fulminaria politicamente um dos concorrentes eleitorais da família Brazão nos bairros da Zona Oeste carioca”, pontuou a PF.

Execução longe da Câmara
Em depoimento à Polícia Federal, o ex-policial militar Ronnie Lessa, preso em março de 2019 pela participação nas mortes de Marielle e Anderson, afirmou que Rivaldo exigiu que a vereadora não fosse executada no trajeto de deslocamento para a Câmara do RJ para evitar suspeita de conotação política do crime.

Em delação premiada, Ronnie Lessa declarou que aceitou cometer o crime, pois os irmãos Brazão expressamente afirmaram que o então chefe da Divisão de Homicídios da Polícia Civil do Rio de Janeiro "teria contribuído para preparação do crime, colaborando ativamente na construção do plano de execução e assegurando que não haveria atuação repressiva por parte da Polícia Civil".

"O Rivaldo disse que não poderia ser de outra forma; ele [Domingos Brazão] foi bem firme nisso, foi contundente, então não é não, e não pode porque o Rivaldo não quer. Então, na verdade nós sentimos até bastante firmeza pela magnitude da coisa, tá lidando com o diretor da DH [Delegacia de Homicídio]; se o diretor da DH faz uma exigência dessa, na minha concepção ele já tem uma linha traçada pra desviar o assunto" disse Lessa em trecho da delação que consta do relatório da PF.