Nova resolução do CFM impede procedimento para interromper a gravidez após 22 semanas
Conselho passou a proibir que médicos realizem a assistolia fetal, utilizada para os casos de aborto em idade gestacional avançada, mesmo nos cenários em que a lei permite o fim da gestação
O Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou no Diário Oficial da União, nesta quarta-feira (4), uma nova resolução que proíbe os médicos de realizarem o procedimento de assistolia fetal, utilizado para a interrupção da gravidez após 22 semanas, nos casos de aborto legal.
A norma, que entrou em vigor na data de publicação, afirma que o “ato médico ocasiona o feticídio” e define que o método passa a ser vetado “quando houver probabilidade de sobrevida do feto” na idade gestacional citada.
A assistolia fetal é um procedimento recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para os casos de aborto acima de 20 semanas, segundo as últimas diretrizes divulgadas em março de 2022.
Ele consiste na injeção de determinados agentes farmacológicos, geralmente o cloreto de potássio, para interromper os batimentos cardíacos do feto, que depois é retirado da barriga da mulher para interromper da gravidez.
Na prática, a norma passa a impedir que o aborto legal seja realizado após as 22 semanas, embora a lei brasileira não estabeleça limite de idade gestacional para o procedimento, explica o diretor do Centro de Pesquisas em Direito Sanitário da Faculdade Saúde Pública da USP (Cepedisa), Fernando Aith
Hoje, no Brasil, o aborto pode ser realizado quando há risco de vida para a mulher ou se a gravidez resulta de estupro, de acordo com o Código Penal, e quando há o caso de anencefalia do feto, por entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF).
Na resolução, o relator, Raphael Câmara, escreve que “optar pela atitude irreversível de sentenciar ao término uma vida humana potencialmente viável fere princípios basilares da medicina e da vida em sociedade”. “O procedimento de assistolia fetal previamente ao aborto permitido em lei é profundamente antiético”, continua o médico ginecologista, ex-secretário de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde durante o governo Bolsonaro.
Aith, no entanto, diz que uma resolução não pode estar acima da lei, que não define tempo máximo para o aborto, e por isso acredita se tratar de uma norma inconstitucional. Porém, afirma que, enquanto o texto não for contestado na Justiça, ela seguirá vigente e pode levar à punição de médicos que realizarem o procedimento.
"Embora a resolução não altere a lei, o médico que praticar a assistolia fetal, que é necessária para o aborto depois de 22 semanas, pode ser processado por infração ética e ter o registro cassado, suspenso, receber algum tipo de advertência do Conselho. Mas uma resolução de uma autarquia não pode contrariar uma lei federal, então ela já nasce ilegal. Só que enquanto um tribunal não declarar a resolução nula, ela segue vigente" diz o especialista.