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Asma: descoberta de nova causa para a doença respiratória pode ajudar na busca pela cura

Equipe de cientistas descreve a morte celular que ocorre no trato respiratório e explica os sintomas da doença

Pessoa com asma utilizando medicação inalatória - Julia Moraes/Folhapress

A palavra asma vem do grego, e uma de suas primeiras referências escritas é para se referir à falta de ar que os heróis do livro "Ilíada", de Homero, sofreram após travarem uma luta até a morte. Alguns milênios mais tarde, a causa dos ataques de asma – um encerramento súbito das vias respiratórias que pode ser fatal – está longe de ser clara. Esta doença respiratória crônica é um dos problemas de saúde respiratória mais recorrentes no Brasil.

Um estudo, publicado nesta quinta-feira (6) na revista Science, acaba de revelar uma nova causa para as crises de asma e sugere um caminho para novos tratamentos que permitam não só aliviar os sintomas, mas também evitar os graves danos que eles podem causar à saúde.

Até agora, pensava-se que a asma era uma doença do sistema imunitário contra um agente interno, genético ou externo, como o pólen ou a poluição. Essa reação imunológica produz asfixia, inflamação do trato respiratório, muco, tosse e demais sintomas que caracterizam a doença. Os tratamentos atuais baseiam-se nesta ideia e visam abrir as vias aéreas inflamadas com inaladores que dilatam os brônquios, mas não atacam a causa subjacente da doença.

O novo trabalho, liderado por pesquisadores do Reino Unido e dos Estados Unidos, explora a contração repentina das vias aéreas, especialmente dos seus ramos dentro dos pulmões, os brônquios. A equipe analisou essa compressão a nível celular nos pulmões de camundongos que sofrem de asma e no tecido respiratório de pacientes. Os resultados descrevem um fenômeno conhecido como extrusão, que parece ser o responsável por todos os efeitos subsequentes da asma nas vias aéreas .

A farmacologista Elena Ortiz-Zapater, pesquisadora do departamento de bioquímica da Universidade de Valência, foi quem desenvolveu os modelos animais do estudo, do qual é coautora.

— Vimos que após a compressão causada pela asma, as vias aéreas ficam muito pequenas muito rapidamente, o que afeta as células epiteliais que revestem o interior dessas vias aéreas. Estamos falando de um tipo de células que não são tão flexíveis quanto as células musculares e que não estão preparadas para tal ataque. Com a compressão, as células epiteliais ficam sem espaço e acabam morrendo e desaparecendo — explica.

Após a crise, as vias aéreas permanecem “expostas” e permitem a penetração de poluentes ou agentes alérgicos no corpo, o que explica por que os asmáticos são mais propensos a sofrer infecções respiratórias e também detalha como ocorre o ciclo vicioso de inflamação, obstrução e falta de ar.

Novo tratamento
Esta descoberta é o resultado de mais de dez anos de trabalho, como destaca Jody Rosenblatt, bióloga celular do King's College London, no Reino Unido, e autora principal do trabalho.

"Como biólogos celulares, conseguimos mostrar que a constrição física de um ataque de asma causa destruição generalizada da barreira das vias aéreas. Sem esta barreira, os pacientes com asma têm muito mais probabilidade de sofrer de inflamação prolongada, problemas de cicatrização de feridas nas vias respiratórias e infecções que levam a mais ataques. Ao compreender este mecanismo fundamental, estamos agora em melhor posição para prevenir todos estes eventos", detalhou Rosenblatt numa nota divulgada pela sua instituição.

O estudo também testou um tratamento experimental que poderia ser o primeiro a atacar as causas da asma e não apenas a aliviar os seus sintomas. Os pesquisadores demonstraram como prevenir esta destruição generalizada da barreira celular das vias respiratórias utilizando gadolínio, um composto utilizado como contraste em ressonâncias magnéticas.

“Felizmente, podemos usar um composto barato, o gadolínio, que é frequentemente usado em imagens de ressonância magnética, para impedir danos nas vias aéreas em camundongos, bem como a inflamação e a secreção de muco que se seguem. E prevenir esses danos poderia evitar o acúmulo de músculos que causa ataques futuros”, ressalta Rosenblatt.

Isso teria que ser feito, ressalta Ortiz-Zapater, procurando um composto que imitasse a atividade do gadolínio, pois pode ser tóxico se administrado com muita frequência.

Esta descoberta “poderia parar o ciclo inflamatório e até revolucionar os tratamentos atuais para a asma”, afirmam Jeffrey Drazen e Jeffrey Fredberg, especialistas em saúde ambiental da Universidade de Harvard (Estados Unidos), num comentário ao estudo também publicado na Science.

O mesmo mecanismo, de acordo com eles, pode ser relevante para a compreensão e tratamento de outras doenças, como a síndrome do intestino irritável, também caracterizada por danos às células epiteliais devido a contrações súbitas semelhantes às causadas pela asma nas vias aéreas.

— A experimentação apresentada no artigo define o papel da via de extrusão no controle dos sintomas subsequentes de uma crise de asma e pode abrir caminho para futuras pesquisas sobre possíveis alvos terapêuticos — elucida José Gregorio Soto Campos, diretor da Unidade de Gestão Clínica de Pneumologia e Alergia do Hospital de Jerez em declarações ao portal Science Media Center da Espanha.

Para o futuro, resta esclarecer por que ocorre essa compressão súbita das vias aéreas típica da asma. É provável, ressalta Ortiz-Zapater, que isso se deva a vários fatores. O mistério da causa original da doença descrita pelos gregos continua.