"Jorge da Capadócia": épico brasileiro conta a história do santo para todas as religiões
Protagonizado, produzido e dirigido por Alexandre Machafer, filme estreia nesta quinta-feira (18)
Venerado por fiéis brasileiros e de outros países, São Jorge já foi tema de músicas, livros, lendas, desfiles de escolas de samba e até novela. Agora, com o filme “Jorge da Capadócia”, que estreia nos cinemas nesta quinta-feira (18), o santo guerreiro terá sua história contada pela primeira vez na tela grande, em uma produção nacional de grande porte.
Com roteiro assinado por Matheus Souza, o filme retrata a trajetória de fé e os obstáculos enfrentados por Jorge durante o violento governo do imperador romano Diocleciano, em 303 D. C. Alexandre Machafer encara a missão de, além de encarnar o personagem, também dirigir e produzir a obra.
“Trabalhei a minha mente e me dividi”, revelou Alexandre, em entrevista à Folha de Pernambuco. Neste sábado (20), ele estará em Olinda, na Casa Criatura, participando da quinta edição da Feijoada de São Jorge, onde divulgará o longa.
O trabalho triplo de Alexandre foi também transformado em livro: “Jorge da Capadócia: os bastidores do primeiro filme sobre o santo guerreiro”, com edição em português já lançada e prestes a sair com uma versão em turco. Distribuído pela Paris Filmes, o filme tem produção da Fundação Cesgranrio e produção associada de Machafer Films, NFilmes e Ziya Dasdeler.
Cyria Coentro, Roberto Bomtempo, Ricardo Soares, Miriam Freeland, Augusto Garcia e Antônio Gonzalez são outros nomes que integram o elenco do longa. Gravada na Capadócia, na Turquia, e em Niterói, no Rio de Janeiro, a produção é repleta de cenas de ação e efeitos visuais, incluindo um dragão feito a partir de computação gráfica.
Confira a entrevista completa com Alexandre Machafer:
Como foi para você lidar com o acúmulo de funções nesse projeto? Saiu esgotado dessa experiência?
Dirigir, produzir e atuar [ao mesmo tempo] é, realmente, uma responsabilidade enorme, porque são três funções extremamente importantes no cinema, mas eu senti que eu tinha que passar por aquilo. Inicialmente, eu não queria atuar. Eu tentei encontrar um ator para ser o Jorge, tentei de todas as formas. No momento em que eu tive que tomar a decisão, diante do presidente da Fundação Cesgranrio (professor Carlos Alberto Serpa), que à época me perguntou quem seria o protagonista e eu ainda não tinha o nome, respondi: “Eu!”. Então, ele respondeu: "Ainda bem, tinha que ser você mesmo!" e, em seguida, assinou a documentação para tornar possível a produção. Ali eu entendi que este era o meu caminho, que eu tinha que fazer isso. Claro que a gente sai esgotado, mas eu acabei fazendo um trabalho mental muito antes do emocional, antes do emocional "me engolir", eu trabalhei minha mente. Eu me dividi. Os meus dias eram assim: de manhã eu era o produtor, durante a tarde eu era o diretor e, na parte da noite, eu era o ator - quando eu fazia o treinamento de luta com os dublês, ensaiava com os atores, discutia sobre tudo. No final, eu tive um esgotamento, é verdade. Na Capadócia, eu dormia duas horas por noite, não tinha como dormir mais. Eu fiz com muita determinação, resiliência e acreditando que daria certo. Claro que, depois, eu fiquei doente e tudo (risos), mas só depois de concluir o filme. Eu, realmente, coloquei na minha mente que nada poderia acontecer até a última diária.
O que levou você a trabalhar em um filme sobre uma figura tão emblemática para o catolicismo?
Realmente, ele é uma figura realmente emblemática, mas acredito que não só para o catolicismo. Ele é uma figura de força, de resiliência. Quando a gente olha para o Jorge, a gente se identifica, mesmo às vezes não entendendo a história. Essa imagem traz tanto conforto, tanta força, faz com que a gente queira continuar lutando, matando esse "dragão" diário. E é claro que na Igreja Católica tem uma representatividade enorme, não só aqui no Brasil, mas no mundo todo. Na Igreja Ortodoxa, inclusive, com uma crença um pouco diferente da nossa. Eles acreditam realmente neste simbolismo, nesta princesa. E São Jorge para eles é uma força enorme. No Brasil, é esse sincretismo todo, latente. Mas o filme foi feito para todo mundo, não direcionei para nenhuma religião, mas para a fé. Qual é a sua fé?
Como ator, como foi o trabalho de construção desse personagem, levando em conta que são poucas as referências nas quais você poderia se basear?
Quando eu decidi fazer o Jorge eu entendi que existia uma fusão ali, eu queria viver aquela história. Não queria ficar pensando em técnica de interpretação - se ficar bom ficou, ficou. Se ficar ruim, ficou. Eu iria assumir essa responsabilidade. Mas eu queria mesmo era me entregar de corpo e alma e eu me entreguei. Mais do que a pretensão de fazer uma cena incrível, eu estava mais preocupado em viver aquela experiência, a história do Jorge, com toda lealdade, com toda força, com todo desejo de entrega que essa mensagem através do Jorge pudesse chegar a todo mundo. E realmente foi um grande desafio, porque a gente não tinha referência. A gente vai se tornar essa referência. Amanhã, se Hollywood quiser produzir um filme sobre Jorge, vai ter que buscar nossa referência. A gente consegue entrar agora no imaginário das pessoas e o que eu tenho recebido de feedback das pessoas é isso. Elas dizem : Nossa, era isso que eu imaginava! Então, tá dando certo, né ? (risos)
Esse não é o seu primeiro filme de temática religiosa. É uma escolha deliberada sua atuar nesse nicho?
Eu não pensei em entrar na esfera religiosa. O presidente da Fundação Cesgranrio, professor Carlos Alberto Serpa, é um homem muito religioso, de muita fé. Sempre foi desejo dele fazer uma série sobre Jesus, nós fizemos a “Bem Aventurados” (2019), que em 29 episódios conta os milagres e as parábolas de Jesus. Logo depois, fizemos “O Filho do Homem” (2019), que narra a crucificação. Mas eu entendi que tudo isso me ajudou a construir esse filme [“Jorge da Capadócia”], que está comigo há 16 anos - os últimos cinco trabalhando nele. Eu precisei passar por esse processo todo. Depois, em “Brasil Imperial” (2020), outra série histórica, eu entendi que o universo me abriu as portas para o segmento épico e eu, realmente, me identifiquei muito. No Brasil, a gente tem que acreditar que pode e deve realizar também longas que apostam neste gênero.
Desde o trailer, o filme chama atenção pelos recursos de efeitos visuais. Você acredita que esse projeto representa um ponto de virada no cinema brasileiro?
Eu espero que “Jorge da Capadócia” seja uma virada para o cinema nacional. Um lugar para a gente acreditar que nós somos capazes de fazer épicos, filmes com dragão, lutas. A gente precisa de investimentos, mudar um pouco a visão, acredito. É nosso cinema sendo representado também, nossos profissionais também trabalhando. É possível, somos capazes. Esse nicho e esse público estão carentes desta temática e querem também assistir esse tipo de filmes produzidos por nós, brasileiros.
Quais foram os maiores desafios de levar adiante uma produção tão grandiosa no Brasil?
Os desafios foram enormes. No meu íntimo, eu sabia que não seria fácil, mas a gente foi resolvendo cada problema, cada entrave, para que pudesse finalizar o filme. A gente resolveu fazer um livro, contando os bastidores, de tantos problemas e adversidades que nós enfrentamos. Livro esse que também resgata a história de Jorge. Eu acredito que no Brasil ainda há muito preconceito. O filme, por mais que tenha a associação com o santo, está contando a história do homem. É o momento de abrir o coração, deixar a mensagem chegar, fazer com que este filme ganhe o mundo. É preciso mudar um pouco a visão no Brasil, para que não somente o “Jorge da Capadócia”, mas outros possam ser realizados aqui.