Saúde

Alzheimer: estudo desvenda como um composto menos conhecido da Cannabis pode proteger o cérebro

Em testes iniciais, derivados do CBN demonstraram um alto efeito neuroprotetor; pesquisadores defendem potencial terapêutico da molécula

Estudo explora como o canabinol, composto menos conhecido da Cannabis, pode proteger o cérebro. - Divulgação / Instituto Salk

Nas últimas décadas, têm crescido os estudos com medicamentos feitos à base de canabidiol (CBD) ou baixas concentrações de tetrahidrocanabinol (THC), duas das cerca de 500 substâncias da planta Cannabis sativa. Cientistas investigam os possíveis benefícios dos compostos para uma série de patologias, como para as doenças neurodegenerativas, caso do Alzheimer e do Parkinson.

Agora, um novo trabalho conduzido por pesquisadores do Instituto Salk para Pesquisas Biológicas, nos Estados Unidos, aponta que um terceiro canabinoide, menos conhecido, tem despertado o interesse da comunidade científica e pode ter um potencial maior para os diagnósticos neurológicos: o canabinol (CBN).

Publicado na revista científica Redox Biology, o trabalho identificou propriedades protetoras do cérebro do CBN em laboratório e criou quatro moléculas aprimoradas derivadas do canabinol para avaliá-las em animais e células humanas.

Todas elas tiveram uma melhor performance neuroprotetora do que o próprio CBN, o que para os pesquisadores indica o potencial terapêutico do desenvolvimento de medicamentos à base de canabinol. Uma delas foi “altamente eficaz” para tratar lesões cerebrais traumáticas em moscas de frutas, afirmam.

"O CBN não só tem propriedades neuroprotetoras, como também seus derivados têm o potencial de se tornarem novas terapias para vários distúrbios neurológicos. Conseguimos identificar os grupos ativos no CBN que estão fazendo essa neuroproteção e, em seguida, melhorá-los para criar compostos derivados que têm maior capacidade neuroprotetora e eficácia semelhante à de um medicamento", resume a professora do instituto Pamela Maher, autora sênior do estudo, em comunicado.

De acordo com os cientistas, muitos distúrbios neurológicos envolvem a morte de neurônios devido a uma disfunção na ação da mitocôndria dentro dessas células cerebrais. Eles afirmam que já se sabia que o CBN de alguma forma parecia evitar essa disfunção, por isso o conhecido efeito neuroprotetor. Porém, os detalhes ainda eram um mistério.

Em um trabalho anterior, de 2022, os pesquisadores do Salk descobriram que o CBN modula a função mitocondrial para evitar uma forma específica de morte celular chamada de oxitose, ou ferroptose, ligada à perda de um antioxidante que, consequentemente, leva a organela a sofrer danos oxidativos.

Após o estudo, eles começaram a aplicar métodos de descoberta de novos medicamentos para ir além na identificação dessas propriedades protetoras do CBN e avaliar se fármacos a base do composto poderiam ou não ter uma atuação significativa na prática.

No novo trabalho, primeiro eles quebraram o canabinol em pequenos fragmentos e observaram quais deles tinham mais propriedades associadas à neuroproteção. Depois, sintetizaram quatro moléculas semelhantes ao CBN, mas que continham esses fragmentos amplificados para aumentar a resposta dos neurônios. As substâncias foram testadas em células humanas e de camundongos.

"Estávamos procurando análogos do CBN que pudessem chegar ao cérebro de forma mais eficiente, agir mais rapidamente e produzir um efeito neuroprotetor mais forte do que o próprio CBN. Os quatro análogos do CBN que encontramos tinham propriedades químicas medicinais aprimoradas, o que foi empolgante e muito importante para nosso objetivo de usá-los como terapêuticos", diz Zhibin Liang, primeiro autor e pesquisador de pós-doutorado no Salk.

Numa segunda etapa, as opções mais bem-sucedidas foram avaliadas com moscas de fruta que tinham um modelo animal de lesão cerebral traumática. Um deles, que recebeu o nome de CP1, teve uma eficácia especialmente elevada em tratar essas lesões, incluindo aumentando a sobrevida das moscas.

"Nossas descobertas ajudam a demonstrar o potencial terapêutico do CBN, bem como a oportunidade científica que temos de replicar e refinar suas propriedades semelhantes a medicamentos. Poderíamos um dia dar esse análogo do CBN a jogadores de futebol na véspera de um grande jogo ou a sobreviventes de acidentes de carro quando chegam ao hospital? Estamos animados para ver a eficácia desses compostos na proteção do cérebro contra danos adicionais", diz Maher.

Para o futuro, os cientistas pretendem dar continuidade à investigação das moléculas e compreender melhor as alterações neuronais que ocorrem principalmente com a idade, associadas a doenças como Alzheimer e Parkinson, para conseguir adaptar os compostos do CBN ao uso terapêutico em seres humanos.