Lira, Bolsonaro, corte de gastos e Petrobras: os sete recados de Lula em café com jornalistas
Presidente minimizou crise com o Congresso e disse que dará aumento a servidores federais em meio a greves
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu jornalistas para um café da manhã no Palácio do Planalto nesta terça-feira (23) e tentou colocar panos quentes na tensa relação do governo com o Congresso. O chefe do Executivo relatou que teve uma conversa com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), mas não revelou o teor, e também tratou sobre crise da Petrobras que quase derrubou o CEO da empresa, Jean Paul Prates. A possibilidade de derrubada do veto da saidinha dos presos, greves dos servidores da educação e um recado ao ex-presidente Jair Bolsonaro também foram temas do encontro.
Em meio à crise do governo com Congresso, Lula tentou baixar a fervura ao afirmar que não há “divergências que não possam ser superadas”. Como já fez em outros momentos, disse que é ele quem precisa dos parlamentares, e não o contrário:
— Todas as coisas vão ser aprovadas e todas as coisas serão acordadas, na medida do possível, com a presença do líder do governo na Câmara, do líder do governo no Senado, no Congresso, com os ministros que são os ministros responsáveis pela matéria — afirmou — Isso vai acontecer, portanto, não tem nenhuma divergência que não possa ser superada.
O presidente também fez questão de sinalizar que não quer falar do conteúdo de suas conversas reservadas com Arthur Lira. Lula e o parlamentar se encontraram no último domingo no Palácio da Alvorada
— Foi uma conversa entre dois seres humanos, eu peço para vocês que não sou obrigado a falar sobre a conversa que tive com Lira.
Enquanto universidades e Institutos Federais estão em greve por todo o país desde o início do mês, Lula afirmou que o governo dará aumento salarial a todas as categorias de servidores públicos, mas que o reajuste será aquilo que o governo ‘pode dar’. Pelo menos 52 universidades, 79 institutos federais (IFs) e 14 campus do Colégio Pedro II estão em greve. Parte pela mobilização dos docentes, parte pela dos técnicos e outra parte pelas duas categorias. O presidente afirmou que as categorias estavam “muito reprimidas” pois não faziam greve há muito tempo e nem tinham aumento de salário há muito tempo:
– O pessoal estava muito, muito, muito reprimido, eles não faziam greve há muito tempo, não tinha aumento de salário há muito tempo. Nós estamos preparando aumento de salário para todas as carreiras e vão ter aumento. Nem sempre é tudo que a pessoa pede. Muitas vezes é aquilo que a gente pode dar. E nós vamos negociar com todas as categorias. Eu quero até aproveitar para dizer que ninguém será punido nesse país por fazer uma greve – afirmou.
O presidente fez críticas à forma como economistas veem a necessidade de corte de gastos no país, incluindo redução de despesas com saúde e educação e defendeu tratar despesas na área como investimentos.
— Tem duas coisas que fazem um país crescer, investir em educação e a outra é ter crédito. O problema é que tudo no Brasil é tratado como gasto. Emprestar dinheiro para pobre é gasto, colocar dinheiro na saúde é gasto, colocar dinheiro na educação é gasto. A única coisa que não é gasto é superávit primário. A única coisa que se trata como investimento é isso.
O presidente ainda contestou nesta terça-feira a estimativa de crescimento de analistas econômicos e disse que o país crescerá mais que o esperado. O FMI divulgou que estima que a economia brasileira crescerá 2,2% neste ano e 2,1% em 2025. Os mesmos números são previstos pelo Ministério da Fazenda.
Embora tenha voltado a criticar o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, Lula afirmou que “tem toda paciência do mundo” para trocar o comando do BC. Lula voltou a alfinetar Campos Neto, ao afirmar que quem perde dinheiro om taxa de juros alta é o “povo brasileiro” e os “empresários brasileiros”, mas disse que quem já conviveu com Campos Neto um ano e quatro meses, não tem "nenhum problema" de conviver por mais seis meses". O mandato de Campos Neto vai até o final de 2024.
— Tenho toda a paciência do mundo porque eu tenho que esperar até dezembro para mudar o Banco Central. Então, veja como nós somos tranquilos — afirmou. — Tenho que decidir se eu vou antecipar ou se deixo para indicar o mais próximo possível do vencimento do mandato do presidente Roberto Campos. Então, quem já conviveu com Roberto Campos um ano e quatro meses não tem nenhum problema de viver mais seis meses.
Com previsão de ir à votação na quarta-feira em sessão do Congresso Nacional, o veto da saidinha dos presos feito por Lula, foi defendido pelo presidente. O chefe do Executivo disse que o preso tem direito ver a família, que é uma coisa “sagrada”:
— O que nós vetamos? A proibição de um cidadão ou cidadã que não tenha cometido crime hediondo, que não tenha cometido estupro, que não tenha cometido o crime de pedofilia e possa visitar os parentes. É uma coisa de família. A família é uma coisa sagrada. A família é a base principal de organização de uma sociedade — disse Lula.
A decisão de Lula de vetar o ponto principal do projeto de lei que restringe a “saidinha” de presos provocou insatisfação entre os líderes partidários do Poder Legislativo. O presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), já sinalizou que o Congresso não concordaria com um veto, assim como líderes partidários.
— A família quer ver o cara que tá preso. Então, eu segui a orientação do Ministério da Justiça e vetei. Vamos ver o que que vai acontecer se o Senado derrubar, ou melhor, se o Congresso derrubar. É um problema do Congresso. Eu posso lamentar, mas eu tenho que acatar, tá?
Após a crise entre o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, que quase derrubou o CEO do comando da empresa, Lula afirmou que desentendimentos e divergência fazem parte. O presidente disse que a Petrobras está “tranquila” e citou que, às vezes, as pessoas afirmam palavras mal colocadas em semanas de especulação, sem fazer referência aos auxiliares:
– Não vejo problema na Petrobras, não vejo o fato de você ter um desentendimento, uma divergência, uma colocação equivocada, faz parte da existência do ser humano. Quando Deus nos fez que deu boca, já estava previsto isso, nem sempre a boca fala somente as coisas que são boas, às vezes uma palavra mal colocada cria uma semana de especulação, mas depois diz que a Petrobras está tranquila, diz que ela está tranquila. O Brasil está tranquilo – afirmou.
O presidente foi questionado sobre a manifestação convocada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) na Praia de Copacabana, no último domingo, mas ele próprio fez questão de falar do tema. Lula que não assistiu o ato e afirmou que "não se preocupa com os atos dos fascistas".
– Eu não vi o ato porque eu estava fotografando a casa do Minha Vida do João de Barro. Eu descobri, no Palácio da Alvorada, quatro casas de João de Barro e descobri mais três em uma árvore e resolvi fazer um filme e publicar na internet. Por isso que eu não vi. Então não me preocupa os atos dos fascistas, o que me importa é o seguinte, eu vou fazer este país dar certo — afirmou.
O evento foi marcado por falas de cunho religioso, sobretudo a da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, e por ataques ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O pronunciamento mais duro coube ao pastor Silas Malafaia, principal realizador dos dois encontros, que abriu fogo contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), chamado por ele de "frouxo" e "omisso".