Fome ainda atinge 8,6 milhões no Brasil. Patamar recua em 5 anos, mas é maior do que há uma década
Insegurança alimentar afeta 27,6% dos lares do país e, em 4,1%, a situação é grave
A insegurança alimentar era realidade em 27,6% dos lares no país em 2023, onde 64 milhões de brasileiros não tinham pleno acesso a alimentos para suprir suas necessidades. Em 4,1% desses domicílios, cerca de 8,6 milhões de pessoas (incluindo crianças), essa privação era grave - ou seja, são famílias que convivem com o fantasma da fome.
O percentual de lares sob insegurança alimentar é menor do que o observado em 2017 e 2018 (36,7%), quando o país sentiu os efeitos da recessão, mas é maior que há uma década (22,6%).
É o que mostram os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC) do IBGE, cujos dados sobre segurança alimentar no país foram divulgados nesta quinta-feira.
O percentual de lares sob algum grau de insegurança alimentar caiu para 27,6% em 2023 após alcançar 36,7%, maior patamar já registrado, em 2017 e 2018. Ainda assim, os números revelam que o país retrocedeu no horizonte de dez anos. Há mais lares sem quantidade e qualidade adequada de alimentos do que se via em 2013 (22,6%).
Cerca de 5,3% dos lares, onde residiam 11,9 milhões de brasileiros, enfrentava insegurança alimentar moderada em 2023 - um recuo frente 2017-2018 (8,1%), mas ainda acima de 2013 (4,6%).
O acesso à comida era ainda pior para os 8,6 milhões de brasileiros que moravam, no ano passado, em lares (4,1%) cuja a insegurança alimentar era grave - ou seja, que enfrentava redução de quantidade e qualidade dos alimentos entre todos os moradores, incluindo as crianças.
Significa dizer que estas famílias podem ter passado por episódios de fome, como ficar um dia inteiro sem comer, dentro de um período de três meses de pesquisa.
As regiões Norte e Nordeste registraram os maiores percentuais de lares com redução de quantidade e qualidade de alimentos ou risco de fome: 7,7% e 6,2%, respectivamente. No Centro-Oeste e Sudeste, percentuais foram de 3,6% 2,9%, em ordem. Na outra ponta, apenas 2% dos lares na região Sul estavam sob insegurança alimentar moderada ou grave no ano passado.
A pesquisa foi elaborada com base na metodologia adotada na Pnad de 2004, 2009 e 2013 e na Pesquisa de Orçamentos Familiares dos anos de 2017-2018. O levantamento classifica as unidades domiciliares segundo os graus atribuídos pela Escala de Insegurança Alimentar brasileira.
A expansão de programas sociais, incluindo Bolsa Família, é um dos fatores que pode ter ajudado a reduzir o nível de insegurança alimentar no país em 2023, frente os níveis de 2017 e 2018, explica André Martins, analista do IBGE.
Tivemos investimentos em programas sociais e programas de alimentação, e isso se reflete nos números. Estes instrumentos respondem bem a este tipo de intervenção. (...) A recuperação da renda e do trabalho também se refletem na segurança alimentar.
A queda nos preços dos alimentos em 2023 também pode ter concedido algum alívio às famílias naquele ano, já que o custo associado à renda disponível influencia diretamente no acesso a alimentos. Ainda assim, os produtos alimentícios continuam mais caros do que em 2018.
Já que o horizonte mais longo, é preciso ponderar todo o movimento da renda e dos preços de alimentos de 2018 até agora, diz Leonardo Santos, técnico do IBGE:
"O resultado é consequência de todos os movimentos da renda e dos preços que aconteceram entre estes dois períodos. É uma combinação de diferentes aspectos, até mesmo o acesso a escola (pelas crianças) acaba influenciando no resultado sobre segurança alimentar."
Historicamente, os programas de merenda escolar são importante fator para reduzir a insegurança alimentar nas famílias com crianças.
Insegurança alimentar no campo cai ao menor nível da série
Cerca de 8,9% dos lares nas áreas urbanas enfrentavam insegurança alimentar moderada ou grave em 2023 - percentual inferior à das áreas rurais (12,7%). Apesar da disparidade, este foi o menor percentual já registrado na área rural desde 2004, quando foi iniciada a pesquisa pela Pnad.
Naquele ano, que marca o início da série, cerca de 23,5% dos lares nas áreas rurais lidavam com a redução de quantidade e qualidade dos alimentos, afetando inclusive as crianças. Na área urbana, o percentual era de 15,7%.