ESTADOS UNIDOS

#MeToo: Juiz determina novo julgamento de Harvey Weinstein por estupro

Megaprodutor de Hollywood caiu em desgraça após múltiplas acusações de assédio sexual

Harvey Weinstein chega a Corte Criminal de Manhattan, em 2020 - Johannes Eisele/AFP

Um juiz da Suprema Corte de Nova York ordenou a realização de um novo julgamento do magnata do cinema Harvey Weinstein, depois que uma corte de apelações anulou na semana passada sua condenação anterior por estupro e agressão sexual devido a erros processuais.

A ex-atriz Jessica Mann, uma das acusadoras do magnata que levaram à sua condenação em 2020, estava na primeira fileira do tribunal, a poucos metros de Weinstein.

— Acreditamos neste caso [...] Com este fim, Jessica Mann está hoje no tribunal — disse a promotora Nicole Blumberg ao anunciar que a promotoria solicitava um novo julgamento. — Ela está comprometida para que se faça justiça mais uma vez.

Por sua vez, o advogado do ex-produtor, Arthur Iidala, insistiu em que seu cliente "foi absolvido das acusações mais graves" e acusou a promotora do julgamento original em Nova York de cometer perjúrio.

A equipe de Weinstein havia solicitado que se concedesse a seu cliente a liberdade condicional mediante pagamento de fiança, à espera de um novo julgamento, mas o juiz Curtis Farber rejeitou o pedido e impôs a prisão preventiva até que ele volte a se sentar no banco dos réus, o que não deve acontecer antes de 4 de setembro.

A próxima audiência do caso foi marcada para 29 de maio para analisar novas provas.

Fora do tribunal, Aidala disse que as autoridades deveriam dedicar mais tempo a perseguir os delinquentes do metrô e os estudantes que protestam na Universidade de Columbia e lamentou que seu cliente tenha "que comprar agora batatas fritas no armazém" quando antes "estava acostumado a beber champanhe e comer caviar".

O outrora intocável peso-pesado da indústria cinematográfica de Hollywood sofreu com uma série de problemas de saúde durante sua estada na prisão e passou um tempo em uma unidade hospitalar do sistema penitenciário. No fim de semana, esteve hospitalizado em Nova York.

 

Sentença anulada
O máximo tribunal do estado de Nova York anulou, na última quinta-feira (25), a condenação por crimes sexuais imposta em 2020 ao ex-produtor de Hollywood Harvey Weinstein, numa reviravolta no caso que deu origem ao movimento #MeToo nos Estados Unidos.

Weinstein, de 71 anos, que está detido em uma prisão no norte do estado de Nova York. Em 2022, ele foi condenado a 16 anos de prisão na Califórnia por estuprar uma mulher em um hotel de Beverly Hills.

Agora, caberá ao promotor distrital de Manhattan, Alvin L. Bragg – já no meio de um julgamento contra o ex-presidente Donald J. Trump – decidir se buscará um novo julgamento contra Weinstein.

Relembre momentos-chave do caso:

2017: Explode o escândalo
Em outubro de 2017, o jornal The New York Times publica uma enorme investigação que detalha várias acusações de assédio sexual e agressão contra Weinstein ao longo de três décadas. As atrizes Ashley Judd e Rose McGowan são as denunciantes mais conhecidas.

O jornal revelou que Weinstein chegou a acordos financeiros com pelo menos oito mulheres para que guardassem silêncio sobre os abusos.

A diretoria da produtora de cinema Weinstein Company, controlada pelo magnata com seu irmão Bob, se vê forçada a despedi-lo dias depois.

A atriz e diretora de cinema italiana Asia Argento conta, pouco depois, à revista The New Yorker que Weinstein a estuprou em 1997. Outras duas mulheres também o acusam de agressão sexual.

As atrizes Gwyneth Paltrow, Angelina Jolie e Rosanna Arquette se unem à lista de mulheres que denunciam Weinstein por assédio.

A direção da Motion Picture Academy of Arts and Sciences, a instituição que concede o Oscar, vota para expulsar Weinstein, cujos filmes ganharam mais de 80 estatuetas.

Na medida em que as semanas vão passando, mais e mais mulheres se animam a contar em público que foram abusadas por Weinstein, tanto nas redes sociais quanto diante das câmeras de televisão.

2018: Weinstein é indiciado
A Promotoria de Manhattan acusa Weinstein de estupro em primeiro e terceiro grau da ex-atriz Jessica Mann (ainda não identificada) em 2013.

Weinstein comparece perante um juiz e uma corte de Manhattan, depois de se entregar à polícia, seguido por um enxame de jornalistas e fotógrafos.

Seu advogado à época, Ben Brafman, negocia uma fiança de um milhão de dólares (pouco mais de R$ 5 milhões, na cotação atual).

A Promotoria acrescenta depois novas acusações por um ato sexual "forçado" em julho de 2006 contra outra mulher, a assistente de produção Mimi Haleyi.

2019: Novo depoimento
Os promotores apresentam uma nova acusação que permitirá à atriz de "Família Soprano", Annabella Sciorra, participar do julgamento como testemunha.

Sciorra afirma que Weinstein a estuprou no inverno boreal de 1993-94. O crime já havia prescrito, mas os promotores esperam que seu relato ajude a convencer os jurados de que Weinstein é um predador sexual.

Weinstein alcança um acordo de 25 milhões de dólares (cerca de R$ 130 milhões, na cotação atual) com mais de 30 atrizes que o acusam de assédio e abusos sexuais, em um processo coletivo na justiça civil não vinculado a seu julgamento penal.

Com esse acordo, Weinstein não tem que admitir nenhuma culpabilidade.

2020: Culpado
Um júri de Nova York declara Weinstein culpado de duas acusações que ainda não estavam prescritas: agressão sexual em primeiro grau contra Mimi Haleyi, em 2006, e estupro em terceiro grau contra Jessica Mann, em 2013.

O veredicto é alcançado depois de quase um mês de julgamento, no qual essas duas mulheres e outras quatro testemunhas contaram, com riqueza de detalhes, como foram humilhadas, atacadas e estupradas por Weinstein.

O movimento #TimesUp prevê o que seria "uma nova era de justiça" para as sobreviventes de agressão sexual, enquanto o promotor de Manhattan, Cyrus Vance, assegura que "um novo dia" alvorecia para o sistema judicial americano.

Em 11 de março, Weinstein foi sentenciado a 23 anos de prisão pelo juiz James Burke, quase o máximo previsto (29 anos).

2022: Julgamento em Los Angeles
O ganhador do Oscar é declarado culpado em dezembro de 2022 por um júri de Los Angeles de três acusações por atacar uma mulher em um quarto de hotel de Beverly Hills uma década antes, incluindo estupro.

Em um julgamento que durou semanas, os promotores pintam o retrato de um ogro predador, que durante anos exerceu um "reinado de terror", utilizando seu tamanho físico e sua habilidade profissional para estuprar e abusar das mulheres em Hollywood.

Segundo os promotores, suas vítimas estavam aterrorizadas e temiam por suas carreiras se denunciassem um homem que dominava a indústria.

Weinstein é absolvido de outra acusação e o julgamento de outras três é declarado nulo. O ex-produtor promete recorrer dos veredictos de culpabilidade. Sua vítima no caso diz que espera que Weinstein "nunca veja o lado de fora de uma cela de prisão em sua vida".

Dois meses depois, o magnate do cinema é condenado a 16 anos de prisão, que um juiz determina o cumprimento após sua condenação em Nova York.

2024: Anulação da condenação em Nova York
Em uma reviravolta surpreendente, o mais alto tribunal do estado de Nova York anula a condenação de Weinstein por crimes sexuais em 2020, em uma decisão de 4 votos contra 3 em 25 de abril.

O Tribunal de Apelações menciona erros na forma em que foi conduzido o julgamento, incluída a admissão do testemunho de mulheres que não faziam parte das acusações que lhe foram imputadas.

"Ordem revogada e novo julgamento", diz a decisão, que acrescenta que "as alegações de maus atos anteriores não podem ser admitidas contra [os acusados] com o único propósito de estabelecer sua propensão à criminalidade".

Um grupo de vítimas classificou a anulação da condenação do ex-produtor de cinema de "profundamente injusta" e anunciou que seguirá "lutando por justiça para as sobreviventes de todo o mundo".

Os próximos passos para Weinstein, atualmente recluso no centro penitenciário de Mohawk, em Rome (Nova York), ainda não estão claros.