Cresce a pressão internacional sobre Israel por cessar-fogo em Gaza
Decisão turca de suspender trocas comerciais com os israelenses e palavras mais duras até de aliados políticos destacam o impacto da guerra sobre a imagem do país no mundo
A decisão da Turquia de suspender os laços comerciais com Israel, anunciada na quinta-feira, ressaltou a pressão global para reduzir a intensidade da guerra em Gaza, mesmo com os líderes israelenses insistindo que não encerrarão a campanha até que o controle que o grupo terrorista Hamas exerce no território seja erradicado.
Na quarta-feira, a Colômbia se tornou o segundo país da América do Sul a cortar os laços com Israel, seguindo os passos da Bolívia. No dia em que La Paz fez seu anúncio, em novembro do ano passado, Colômbia e Chile convocaram seus embaixadores em Israel, algo que Honduras fez dias depois. Belize cortou os laços diplomáticos com o país também em novembro.
Estados árabes, como Jordânia e Bahrein, com quem Israel tem uma cooperação de segurança, convocaram seus embaixadores diante da pressão pública causada pelo elevado número de mortes em Gaza — hoje, são 34.622, segundo o Ministério da Saúde do enclave, controlado pelo Hamas.
A ofensiva israelense também minou os esforços para avançar em um acordo de normalização de relações entre Israel e Arábia Saudita, algo com que o premier Benjamin Netanyahu contava para ser um grande legado de governo.
A Casa Branca, comandada por Joe Biden e principal aliada de Israel, não deu sinais de que poderia reduzir seu apoio militar, mesmo em meio a alertas contra uma invasão israelense de Rafah, no Sul de Gaza, onde mais de um milhão de pessoas estão abrigadas. Israel também teve uma notícia positiva na terça-feira, quando a Corte Internacional de Justiça rejeitou um pedido da Nicarágua para forçar a Alemanha, segunda maior fornecedora de equipamento militar a Israel, a suspender as vendas de armas ao país.
Mesmo assim, as movimentações da Turquia e de outros governos deixam claro como a guerra em Gaza, que completa sete meses na semana que vem, está impactando a posição e a imagem global de Israel.
Israel e Turquia se aproximaram nos últimos anos. Em 2022, os dois anunciaram que iriam restaurar os laços diplomáticos. Antes disso, já eram parceiros comerciais próximos, com os turcos vendendo cerca de US$ 4,6 bilhões em bens ao país em 2024, segundo estatísticas oficiais israelenses.
Poucas semanas depois do ataque do Hamas contra Israel, no dia 7 de outubro, Netanyahu e o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, se encontraram pela primeira vez, em Nova York, durante a reunião de líderes na Assembleia-Geral das Nações Unidas. Ambos concordaram em visitas oficiais em breve, segundo o escritório do premier.
Agora, as esperanças de relações mais próximas parecem ter desaparecido. Depois do ataque do Hamas, Erdogan assumiu uma retórica favorável ao grupo palestino, chamado por ele de “organização de libertação”; ele chegou a se encontrar com líderes do Hamas em abril, algo condenado duramente por Israel.
Erdogan disse que a decisão de suspender os laços comerciais foi uma tentativa de pressionar Israel para firmar um cessar-fogo com o Hamas. Israel e outros mediadores, como Catar, Egito e os EUA ainda aguardam uma resposta do grupo palestino à uma proposta feita nos últimos dias. Integrantes do governo americano, incluindo o chefe da CIA, William Burns, que esteve no Cairo para conversas nesta sexta-feira, culpou o Hamas pelo fracasso nas rodadas anteriores de negociações.
— Temos apenas um objetivo: forçar o governo de Netanyahu, que saiu de controle por causa do apoio militar e diplomático incondicional do Ocidente, a [aceitar] um cessar-fogo — afirmou Erdogan na sexta-feira, em Ancara. — Uma vez que o cessar-fogo seja anunciado, e que uma quantidade adequada de ajuda humanitária entre em Gaza, esse objetivo terá sido atingido.
Nesta sexta-feira, o Hamas afirmou que uma delegação viajará ao Cairo neste sábado para continuar as conversas. O grupo tem dado sinais de que estaria disposto a discutir o mais recente plano, e na quinta-feira o líder da ala política, Ismail Haniyeh, conversou com o chefe dos serviços de inteligência do Egito, Abbas Kamel, e com o premier do Catar, Mohammed bin Abdulrahman al-Thani.
"Destacamos o espírito positivo com o qual os dirigentes do Hamas trataram a proposta de cessar-fogo recebida recentemente e vamos ao Cairo com o mesmo espírito para alcançar um acordo", declarou o movimento em comunicado nesta sexta-feira. No X (antigo Twitter), o secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu que Israel e o Hamas, “pelo povo de Gaza, pelos reféns e famílias, pela região e por todo o mundo” cheguem a um acordo — caso contrário, disse “temer que a guerra se agrave exponencialmente”.
Mudança de tom
A decisão de suspender as importações e exportações de e para Israel é pouco usual por parte de Erdogan, que normalmente permitiu a existência de laços comerciais próximos mesmo em ambientes de elevada tensão política, afirmou Gallia Lindenstrauss, especialista em política externa turca no Instituto para Estudos de Segurança Nacional, em Tel Aviv.
O presidente turco possivelmente esperava usar o tema para controlar o crescente descontentamento dentro do país com suas duas décadas no cargo, após uma série de vitórias da oposição em eleições municipais no começo do ano, afirmou Lindenstrauss. Mas havia também uma tentativa de “explorar as fraquezas de Israel, especialmente as de Netanyahu, para continuar a enfraquecer Israel e ganhar influência regional”, afirmou.
Muitos aliados mais próximos de Israel estão agora pedindo um cessar-fogo e a libertação dos reféns mantidos em Gaza pelo Hamas e grupos associados. Em março, o Conselho de Segurança da ONU aprovou uma resolução pedindo um cessar-fogo durante o mês sagrado do Ramadã — os EUA se abstiveram, e foram duramente atacados por Israel.
A guerra também levou a discursos em defesa do Estado palestino, um movimento que hoje é simbólico e é fortemente criticado por Netanyahu. A Espanha e a Irlanda, além de outras nações europeias, disseram já trabalhar para esse fim.
Os EUA dizem há anos que embora apoiem o eventual estabelecimento de um Estado palestino, qualquer reconhecimento deve vir após negociações entre lideranças palestinas e israelenses.